O presente político na Figueira, protagonizado por esta maioria absoluta presidida por João Albino Ataíde, vai ter um fim inesquecível.
A vantagem das profissões de fé, é esta: pode ignorar-se o óbvio, pelo menos, enquanto o peso da evidência não nos esmaga a ignorância.
Foi com estes pensamentos que, hoje à tarde, abandonei os paços do concelho da Figueira da Foz, depois de ter presenciado uma acesa, mas civilizada, discussão política, entre um cidadão informado chamado Luís Pena, que anda há décadas a exercer o seu legítimo direito de cidadania em defesa da nossa cidade e do nosso concelho, e o executivo de maioria socialista, presidido por um cidadão chamado João Ataíde que, em 2009, caiu de pára-quedas na Figueira.
Amanhã, haverá certamente mais pormenores do debate desta tarde.
Para já, por um lado, quero relevar a intervenção da vereadora da oposição Teresa Machado, de que destaco esta frase: «se se vender o Horto, vai-se cometer um erro tremendo, como aconteceu com o edifício "O Trabalho"».
Recorde-se que o único vereador que, na altura, votou contra a implantação daquele edifício que constitui um "pesadelo" para esta câmara e para os figueirenses, foi o eng. Abel Machado.
Por outro lado, dado o interesse da intervenção de Luís Pena na reunião de Câmara realizada na tarde de 17 de Abril de 2017, para memória futura, aqui fica na íntegra.
Passo a citar.
Exmo Senhor Presidente da Câmara Municipal e demais vereadores presentes nesta casa da Democracia:
Em jeito de introito, gostaria de esclarecer que a minha intervenção nesta reunião de câmara, aberta ao público, radica em duas ordens de razões:
- A primeira, no facto de estar a decorrer o período legal de discussão pública do PDM e de ter apresentado dois requerimentos no passado dia 30 de Março, relativamente aos assuntos do espaço correspondente ao Horto Municipal e da zona correspondente ao terreno municipal com a área de 18.144m2, situado a Norte/Nascente do Parque de Campismo. Relativamente a estes requerimentos, até à data, não me chegou qualquer resposta.
- A segunda razão, por ter figurado como primeiro subscritor de duas petições dirigidas a esta Câmara: a primeira em 21 de Março de 1997 e a segunda, em 5 de Junho de 2007, subscrita por 3500 cidadãos.
A primeira petição foi motivada pelo anúncio público do presidente da Câmara de então, Aguiar de Carvalho, entender que o Parque de Campismo “tinha esgotado o seu período de vida útil”…
À época, esta opinião foi rejeitada pela larga maioria dos figueirenses.
Apesar disso, o executivo camarário de então, insensível à cidadania demonstrada por milhares de cidadãos, decidiu, em 5 de Junho de 1997 vender o Horto Municipal. Sucede que, por força da opinião pública, a Assembleia Municipal, em 30 de Junho desse mesmo ano, chumbou a decisão de venda do Horto.
Na altura, o PS na Assembleia Municipal, foi muito claro e assertivo tendo sido afirmado pelo então líder de bancada António Alves o seguinte:
“O PS entendia que o Horto Municipal devia ser mantido como mancha verde a preservar e a incluir em futura revisão do PDM”.
No ano seguinte, em 1998, iniciou-se um processo de auscultação dos munícipes para a revisão do Plano Director Municipal. Participei na reunião relativa à freguesia de S.Julião, realizada em 25 de Setembro de 1998, no auditório do Museu Municipal. Requeri, nessa reunião, que a classificação da zona correspondente ao actual Parque de Campismo e Horto Municipal fosse alterada, pois tal espaço estava classificado no primitivo PDM como zona de expansão urbanística. Pedi, na qualidade de 1º subscritor de uma petição (que um ano antes tinha reunido cerca de 4.300 assinaturas), que tal espaço fosse classificado como zona verde, livre da ânsia construtiva…Sei que os responsáveis da edilidade, à data, tomaram nota desta pretensão de carácter colectivo.
Aquando da discussão da proposta de Revisão do PU, ocorrida nos anos de 2007 e 2008, o PS, então na oposição, por diversas ocasiões, defendeu a necessidade de preservação do conjunto formado pelo Horto Municipal, Parque de Campismo e terreno anexo ao mesmo, sito a Norte e Nascente. Em relação a este terreno, com o número de Inventário 30.109, há decisão camarária de 19/11/2007 que aprovou a sua inclusão na área e perímetro do Parque de Campismo. Na proposta de PDM, este terreno aparece classificado como “Espaços Habitacionais de Tipo 1”, sendo pois possível a sua alienação para construção urbana, a exemplo do que já foi anunciado publicamente, por duas vezes, em relação ao terreno do Horto Municipal.
Ocorre perguntar se a bondade da decisão camarária de 19 de Novembro de 2007 não ficará prejudicada face à actual classificação no PDM para o espaço em causa?
Não existirá uma contradição insanável entre o espírito dessa decisão que pretendeu – de uma vez por todas – a protecção daquele espaço e evitar mais construção urbana naquela área da cidade, que constitui o prolongamento do corredor verde, que se inicia no Jardim Municipal, atravessa as Abadias e se prolonga em direcção ao Parque de Campismo e à Serra da Boa Viagem?
Decorridos 20 anos, desgosta-me o facto de ver, no decurso do prazo de uma discussão pública, declarações nos jornais a anunciar a “promessa de venda” do terreno do Horto Municipal com o único fim imediatista de ampliação de um centro comercial…
Ocorre perguntar porque é que essa ampliação não é feita com a construção de mais um piso em altura quando o actual Plano parece consentir?
Será necessário hipotecar mais um espaço público, de grande beleza e harmonia e comprometer o enquadramento paisagístico do Parque de Campismo, já de si, bastante asfixiado pela pressão urbanística que o rodeia?
Não estarão a tomar uma decisão demasiado apressada, pouco amadurecida e contraditória às posições públicas do partido pelo qual foram eleitos, tomadas num passado recente?
Não estarão a ignorar a vontade e sensibilidade de 3500 cidadãos, que em 5 de Junho de 2007, pediram, em sede de revisão do PU e do PDM, que o Horto e o Parque de Campismo fossem preservados de mais construção? Não será preferível anexar ao Parque este terreno, em forma de enclave?
Têm presente os princípios da Carta de Aalborg subscrita pelo Município em Agosto de 1996 e os princípios do Plano Estratégico de Desenvolvimento da Figueira da Foz? E a adesão à Agenda 21 Local serve para quê?
O interesse colectivo da "sustentabilidade ambiental", considerando que se trata de um terreno municipal, terá de estar acima da lógica comercial e imediatista de uma qualquer empresa!
Vender o Horto é sinónimo de "dar uma facada" no Parque de Campismo" e condená-lo, a médio prazo, como já foi tentado num passado recente.
O Horto Municipal poderá, no futuro, ter outra afectação, nomeadamente com a ampliação natural do Parque de Campismo, que o contorna pelo Poente e Nascente, mas jamais servir de terreno para “plantio” de umas quantas lojas comerciais…
A manutenção de um certo capital natural para as gerações vindouras exige a preservação do conjunto paisagístico e arbóreo formado pelo Parque de Campismo, terreno municipal situado a Norte e Nascente bem como pelo Horto.
Não será pedir muito, senhor Presidente, em nome do desenvolvimento sustentável da cidade que se constrói, não apenas com decisões tomadas pelos eleitos que, temporariamente, ocupam os cargos autárquicos mas, sobretudo, pela participação dos cidadãos que são a essência da civitas.
Creia, senhor Presidente, que estas preocupações são perfilhadas por muitos munícipes e cidadãos que amam esta cidade que tem o nome de uma árvore: Figueira.
Repensar uma decisão e corrigir erros na proposta de PDM não será sinónimo de fraqueza, antes sinal de elevação democrática e de respeito pela cidade.
Sem qualquer menosprezo para vários milhares de figueirenses que, por duas vezes, assinaram uma petição, a título meramente simbólico, citarei o nome de alguns deles que partilham o entendimento supra exposto:
Maria Teresa Coimbra, Isabel Maranha Cardoso, Vítor Coelho, Delmar Damas, Diogo Serôdio, Paulo Gonçalves, Pedro Jorge, Rui Curado, Carlos Moço, António Cândido Alves, Pereira da Costa, Luís Ribeiro, João Vaz, Eurico Gonçalves, Rui Brites, Manuel Coelho, Vítor Pereira, Rui Duque, António Agostinho, Daniel Santos, Rui Torres, Silvina Queirós, António Jorge Pedrosa, Gonçalo Cadilhe.
Apesar de não residirem na Figueira, também a Arquitecta Helena Roseta e Gonçalo Ribeiro Teles defendem idêntica posição.
Não obstante o disposto no nº 7 do art. 12º do Regimento da Câmara em vigor, solicito que esta intervenção seja anexa à acta da reunião de Câmara, em sede do período de intervenção do público.
Luís Ramos Pena
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