Hoje, no Jornal Público:
Erosão costeira na Figueira da Foz: “O mar trabalha todos os dias e nunca se cansa”.
Erosão costeira na Figueira da Foz: “O mar trabalha todos os dias e nunca se cansa”.
A propósito, recorde-se uma postagem OUTRA MARGEM, de 11 DE ABRIL DE 2008, antes do acrescento dos 400 metros do molhe norte:
“O prolongamento em 400 metros do molhe norte do porto da Figueira da Foz foi hoje adjudicado, um ano depois do lançamento do concurso público que sofreu reclamações dos concorrentes e atrasos na análise das propostas.
A obra, considerada fundamental pela tutela e comunidade portuária, vai permitir a melhoria das condições de acessibilidade ao porto da Figueira da Foz e deverá estar concluída até Fevereiro de 2010.
Com um preço base de 12,5 milhões de euros, a intervenção compreende a extensão do molhe em 400 metros, bem como a ampliação do canal de navegação.”
Mas, será que alguém sabe, porque estudou, as REPERCUSSÕES QUE MAIS 400 METROS NO MOLHE NORTE terão na zona costeira na margem a sul do Mondego?A obra, considerada fundamental pela tutela e comunidade portuária, vai permitir a melhoria das condições de acessibilidade ao porto da Figueira da Foz e deverá estar concluída até Fevereiro de 2010.
Com um preço base de 12,5 milhões de euros, a intervenção compreende a extensão do molhe em 400 metros, bem como a ampliação do canal de navegação.”
Esta pergunta, colocada antes do início da obra, foi ignorada por quem tinha o poder de decisão. A obra foi, na altura, apoiada pela Câmara Municipal da Figueira da Foz e pela Junta e Assembleia de Freguesia de S. Pedro. Há 15 anos estava tudo de acordo.
O Kilas, o mau da fita, era o António Agostinho: foi caluniado, foi perseguido (até porrada lhe prometeram), foi isolado. Valeu-lhe, como ainda hoje, o grande ego e saber que a razão estava do seu lado. Como, infelizmente, se está a comprovar.
Contudo, esteve sempre bem acompanhado.
O seu Amigo Manuel Luís Pata, fartava-se de lhe dizer: "há muita gente que fala e escreve sobre o mar, sem nunca ter pisado o convés de um navio".
Passados 15 anos os desperdícios de recursos financeiros, os resultados estão à vista de todos no Quinto Molhe, Costa e Lavos, Leirosa e mais além...
Como afirma Miguel Figueira na edição de hoje do Público, «a última reposição de areias, trazidas do zona do porto, terminou “há um mês” (e aponta para um enorme buraco na zona mais próxima do local onde os banhistas solitários se instalaram). E acrescenta: “Já está a ser completamente comida. Este buraco não existia, já está aberto. A duna está fragilizada e acabamos de gastar aqui um milhão de euros.”»
Como muitos também me recordo que “quando éramos miúdos, descíamos as dunas a sul do Quinto Molhe com pranchas, pois isto era uma coisa colossal”. Agora, esse monstro de areia é só uma memória. Ali em frente, estão sacos enormes de sedimentos colocados na base do que resta da duna, que a APA instalou no local há alguns anos, na tentativa de reter parte da areia que tem sido reposta, pontualmente, no local. Sobre a duna há um tubo, que serve para transportar areia para ali, alimentando artificialmente a costa.
A APA continua a desvalorizar a avaliação de Miguel Figueira. Primeiro, garante em resposta escrita ao PÚBLICO, «a intervenção naquela zona não está concluída — foram depositados 45 mil metros cúbicos (m3) de areia e faltam ainda outros 55 mil m3, ou seja, só foi concluída 45% da operação prevista e a restante, se a agitação marítima deixar, deverá ser concluída até ao final do mês.
Quanto aos danos visíveis indica: “A APA e o empreiteiro estão a monitorizar a evolução da intervenção, estando a decorrer como esperado. Este tipo de intervenções de alimentação artificial tem normalmente associadas perdas iniciais de curto prazo associadas aos fenómenos de reajuste do perfil (até atingir o perfil de equilíbrio) e compactação da areia após deposição”, além de alguma “dispersão lateral por processos longitudinais para fora da zona de deposição.”
Segundo o Público, a palavra "monitorizar” anda a irritar sobremaneira Miguel Figueira e Eurico Gonçalves, antigo campeão de surf e o outro rosto do SOS Cabedelo.
O que está mais do que provado, é tal como previmos antes da execução da sua execução, as obras na linha costeira da Figueira da Foz — incluindo a extensão em 400 metros do Molhe Norte do porto marítimo, uma obra iniciada em 2008 — criaram um desequilíbrio brutal na costa. O areal da praia da Claridade, na cidade, a norte do porto e da foz do Mondego, cresceu tanto que fez com que esta se tornasse a maior praia urbana da Europa.
A sul de tudo isto o cenário é o oposto — a falta de sedimentos, impedidos de passar pelo extenso molhe, fez recuar a costa vários metros, fazendo desaparecer praticamente o areal em várias zonas da Cova-Gala e criando uma meia-lua bem pronunciada ainda mais para sul, onde antes não existia, porque a linha da costa estava muito mais à frente.
Como afirma Migueira: “não há falta de areia. Ela está é mal distribuída”.»
A norte do porto, o areal não pára de aumentar, mas a sul a linha de costa está cada vez mais recuada, porque os sedimentos não conseguem passar.
Dúvidas há?
Sem esquecer o perigo na barra do porto, onde já morreram 15 pessoas em acidentes, desde 2009...
«O Estudo de Viabilidade da Transposição Aluvionar das Barras de Aveiro e da Figueira da Foz, encomendado pela APA a um consórcio, que incluía a Universidade de Aveiro (UA), analisou diferentes soluções e concluiu que o bypass era a solução “economicamente mais viável”, para uma zona que, a sul da Cova-Gala, já apresentava taxas de recuo da costa de 3,5 metros ao ano.
Para os responsáveis do movimento cívico, parecia o início do fim de um longo processo, uma percepção reforçada pelo anúncio do então ministro do Ambiente, João Pedro Matos Fernandes, de que o bypass era mesmo para ser feito. O país já não queria voltar as costas ao mar — algo que nunca se faz, dizem, e que aprenderam muito cedo com os pescadores —, nem fazer dele o inimigo, mas aprender a adaptar-se às mudanças que ele próprio sofria, fruto, em grande parte, da intervenção humana.
Só que o balde de água fria veio logo a seguir: ao contrário do que o SOS Cabedelo esperava, a APA não tem qualquer intenção de avançar com a obra do bypass num futuro imediato e isso desespera os dois activistas. “Neste momento, a nossa maior preocupação é a urgência em avançar com a obra”, diz Eurico Gonçalves. “Queremos que se despachem”, reforça Miguel Figueira.»
Mais uma vez, as coisas estão a acontecer como o responsável do OUTRA MARGEM temia. Lembram-se das nossas conversas nos últimos dois anos sobre o assunto Miguel Figueira e Eurico Gonçalves?
Percebem agora as minhas inquietações perante o vosso optimismo?
Recordo Maio de 2021. De acordo com Carlos Monteiro, na altura presidente da câmara, que citou informação que lhe foi transmitida pela APA, o concurso para elaboração do projecto e estudo de impacte ambiental “ainda está para adjudicação”. Tendo um prazo de 12 meses para ser elaborado, só estará concluído em meados de 2022, a que acrescem os procedimentos de eventual aprovação, lançamento do concurso da obra propriamente dita e adjudicação dos trabalhos, que, se tudo correr bem, só deverão começar em 2023.
«Não será isso que vai acontecer. Em resposta escrita ao PÚBLICO, a APA explica que quando foi conhecido o resultado do estudo que apontou para o bypass como a melhor solução, já estavam em curso os procedimentos burocráticos para a operação de alimentação artificial do troço Cova-Gala/Costa de Lavos, a sul do porto marítimo, com 3,3 milhões de m3 de areia. “Só após a concretização dessa intervenção e a sua monitorização (fundamental para se avaliar a sua evolução, comportamento e eficácia) será possível avançar com a eventual solução de bypass fixo”, refere a APA.
E para que a “eventual” obra do bypass avance, terá ainda de ser precedida do seu próprio processo burocrático, acrescenta. Ou seja, concursos públicos, estudo de impacte ambiental, candidatura a financiamento...
A APA olha para o bypass — uma obra com validade mínima de 30 anos e custos de construção e operação para esse período estimados em 53 milhões de euros — como uma operação de “mitigação da erosão costeira” de “longo prazo”. Até lá, há a colocação de areia como a que está a decorrer a sul de Cova-Gala, com recurso a dragagem das areias do porto (solução de “curto prazo”) e a “alimentação artificial de elevada magnitude”, dos tais 3,3 milhões de m3, com um custo de 25 milhões de euros, e que é olhada como uma intervenção de “médio prazo”.
Miguel Figueira e Eurico Gonçalves não entendem por que não se avança já para o bypass. Nem porque querem monitorizar uma intervenção de colocação de areias que, acreditam, acabará por não ter sucesso, por não ser um processo contínuo. “Uma solução pontual não faz sentido. O mar trabalha todos os dias e nunca se cansa”, diz Miguel Figueira. “Então está tudo a arder e querem monitorizar a desgraça?”, questiona Eurico Gonçalves.»
Contudo, «Carlos Coelho, especialista em erosão costeira e coordenador dos investigadores da UA que participaram no estudo responsável pela identificação do bypass como a solução mais viável para a Figueira da Foz, defende a posição da APA. “Há alguns fenómenos e pressupostos admitidos durante este estudo que é possível que sejam discutíveis. Portanto, se pudermos aumentar o grau de confiança nos resultados, será o ideal”, diz.
E isso, defende, poderá ser conseguido monitorizando a operação que a APA tem prevista de colocação de 3,3 milhões de m3 de areia — um volume “muito mais alargado” do que o que tem sido colocado em operações mais pequenas e que, por isso, acredita, vale a pena acompanhar e avaliar. “Diria que a posição da APA faz sentido, sim. É um investimento muito alargado e tudo o que vier contribuir para aumentar o grau de certeza nos resultados deve ser feito”, defende.
E não se corre o risco de, daqui a alguns anos, quando se avançar de facto para o bypass, o estudo que o escolheu seja considerado desactualizado e se defenda a necessidade de um novo? Ouve-se Carlos Coelho rir ao telefone. “Podemos eventualmente correr o risco de ter de actualizar os resultados do estudo. Mas diria que este estudo do bypass acaba por ser válido num período mais longo”, diz o investigador.
Olhando o mar revolto da Figueira da Foz, de onde saíram há poucas horas, depois de mais uma manhã a surfar as suas ondas, os dois fundadores do SOS Cabedelo não se conformam com estes argumentos. Não se convencem que valha a pena avançar para uma operação intermédia, com um custo do m3 de areia que dizem ser dez vezes superior ao que é previsto para o bypass, e com o ónus ambiental “da queima dos combustíveis fósseis, com as dragagens”.
“Toda a gente já concordou com o bypass. É o que está inscrito na política do Governo, nos estudos da universidade, é o que defende a cidadania. Mas depois dizem-nos que isto é só para daqui a sete anos, para 2030. Isto é absolutamente insensato”, acusa Miguel Figueira.
O PÚBLICO questionou o MAAC, que remeteu quaisquer esclarecimentos para a APA. O presidente da Câmara da Figueira da Foz, Pedro Santana Lopes, em resposta escrita, refere: "Nunca foi admitido nem faz sentido dizer que uma acção, importante mas conjuntural, como a da transposição de 3 milhões de metros cúbicos possa pôr em causa a intervenção estrutural do bypass. E os calendários foram estipulados e ditos. A nosso ver, demasiado longos mas, de qualquer modo, assumidos."
O SOS Cabedelo vai continuar a insistir numa mudança de posição de quem decide as intervenções na costa. “A transição que falta fazer é desta atitude da APA, que continua numa lógica reactiva. De cada vez que há um acidente na costa, lá vêm eles gastar mais uns milhões. Têm de inverter esta lógica de “correr atrás do prejuízo”, para passar a correr atrás da solução. Hoje em dia é disso que se trata. Sabendo qual é a solução, têm de se pôr ao caminho”.»
Nota de rodapé.
Para ver o video com a entrevista de Miguel Figueira, clicar aqui.
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