A verdade é que Rui Duarte pode não ser nenhum anjo e pode nem sequer ter caído, excepto em tentação. Isto é, ele pode ser simplesmente um típico português, um homem comum, um figueirense de lineu: alguém que, muito prosaicamente, sem ingenuidade nem inocência, prefere um penacho na mão do que outro a voar. Fiz-lhe o retrato, quase-robot porque é um caso-tipo, para o meu Album Figueirense, embora os anjinhos caídos desta estória sejam outros.
Mas a estória foi assim: cansado de se ver sempre relegado para segundo plano por um ex-pescador reformado e semi-analfabeto, o arquitecto Rui Duarte terá decidido avançar - tornando pública a vontade de se candidatar à Junta - contra o preferido pelo aparelho do seu partido. Este, receando perder uma eleição onde os votos se dispersariam por duas candidaturas irmãs, resolveu a coisa de uma penachada: oferecendo-lhe uma sinecura numa empresa camarária em troca da desistência da candidatura (uma saída de sendeiro, mas para cima). Perante isto, Duarte fechou a boca e agarrou o penacho com as mãos ambas - o homem comum, como dizia Sir Herbert Read, "não assalta a bastilha onde a beleza está em clausura. Tem senso prático, como se costuma dizer".
É aqui que entram as altas expectactivas. A ascenção de Duarte (nada ilusória, muito real, meu caro Agostinho) foi, certamente, a sua queda – apenas em tentação - mas foi sobretudo a queda dos “muitos” que queriam ver nele mais do que um figueirinhas comum a fazer pla vidinha. Cairam abrupta, brutal, aparatosamente, desamparados na real - os anjinhos.
A moral desta estória é que existem mesmo anjinhos caídos. E são socialistas; e figueirinhas, claro. Mas nenhum deles é o nóvel administrador da Figueira-Domus.
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1 comentário:
Excelente análise, brilhante crónica. Realmente, os anjinhos foram os que acreditaram que o desfecho desta encenação de Rui Duarte era outro. Desde a vinda de Hugo Pires (secretário nacional para a coordenação do PS) à Figueira (meados de Fevereiro) que o negócio estava feito. Uns dizem que é uma vergonha, mas o pragmatismo focado no imediato e no volátil levaram Rui Duarte a fechar a boca, enfiar o idealismo na gaveta, e a trocar a incerteza do futuro, por um lugar ao sol, aqui e agora. E amanhã? Os jornais de hoje amanhã estão no lixo. E a memória dos figueirenses e dos socialistas em particular? Memória na politica Figueirense é coisa que não existe. Entretanto, o pragmatismo e objectividade fazem render ao Rui Duarte um penacho, como foi dito, e três mil euros por mê, durante quatro anos, fora o resto...e o resto...pois.
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