"A crise da Comunicação Social deve-se a vários fatores. Uns surgem-lhe como elementos externos à sua vontade, outros resultam de responsabilidade próprias.
Uns são estruturais e obedecem a objetivos estratégicos do poder dos mercados e das suas instituições, outros resultam da substituição da informação por notícias, verdadeiras ou falsas, que servem poderes subversivos e atacam a democracia e outros, ainda, podem residir na subversão da profissão de jornalista. Sobre esse caldo de pressões e de irresponsabilidades é evidente, também, a incapacidade do poder político criar barreiras à penetração de poderosas multinacionais que roubam, sem contemplações, as receitas de uma atividade que precisa de uma dimensão nacional.
Entre as causas externas encontra-se a expansão, radical e rápida, das transformações no mercado de comunicação, tanto no que se refere a formas de a fazer, como quanto à apreensão da informação: as plataformas que dão vida a redes sociais, a desmultiplicação de suportes de informação, a concorrência de múltiplas formas de suporte de informação.
Os detentores de meios de Comunicação Social não souberam nem antever nem acompanhar o que estava a acontecer e muito menos fazer-lhe frente. Aderiram em massa à inovação em marcha (ofereceram a sua produção na Internet ao mesmo tempo que a queriam vender em papel), ignorando, por interesses imediatos, que ela viria a cavar a sua sepultura. Os jornalistas - trabalhadores qualificados e relevantes nas nossas sociedades - não são os grandes responsáveis dos problemas existentes, contudo têm todo o interesse em proceder a uma análise crítica do percurso feito e em encontrar saídas. E podem ajudar a construí-las.
Os jornalistas acabaram por sofrer em grande medida às suas próprias mãos. Inicialmente agiram como se estivessem protegidos pelos poderes emergentes, que por vezes catalogaram facilmente de modernidade.
Segundo, não resistiram às ideias dominantes de desarticulação das instituições representativas e de libertação de poderosas forças da sociedade sem contrapoderes. Por vezes têm feito parte de processos que atacam as instituições de mediação indispensáveis ao funcionamento da democracia.
Terceiro, ao vestir individualmente a camisola de uma concorrência que não era a sua, não conseguiram contrapor-se à opção recessiva adotada pelos grupos de Comunicação Social - cortes de pessoal, degradação do produto, menos audiências, menos receitas, mais cortes de pessoal. Reproduziu-se neste setor a desigualdade social que se vive em amplos setores por todo o país: chefes muito bem pagos a coordenar jornalistas recém-criados mal pagos e explorados.
Deste cenário todo e com a publicidade a ser canibalizada pelas multinacionais, como o Google e o Facebook, em prejuízo dos grupos nacionais, resultou que não só os produtos não mudaram como, pior ainda, a informação tradicional e credibilizada mimetizou aquilo que as novas formas de produção de notícias fornecem: a notícia do momento (verdadeira ou falsa) sem preocupação informativa, o superficial, o risível.
A crise que se vive é a expressão, neste sector, dos objetivos e práticas do sistema capitalista, nesta sua fase de neoliberalismo, de financeirização da economia e mercantilização do trabalho, com um pensamento dominante e uma forma de estar na vida social. A classe profissional jornalistas, como outras, tem tolerado em demasia este rumo, tendo apenas reações típicas de agentes assustados.
Como se reverte isto?
Os órgãos de poder não podem ficar indiferentes. O espaço da Comunicação Social é público e é concessionado e, como tal, o Estado deve ter uma palavra. Intervir mas com princípios e regras inerentes ao Estado Social de Direito Democrático e não com remendos dando dinheiro ou proteções a entidades ou empresas que continuarão a reger-se pela lógica de um Estado ao serviço dos mercados.
O Estado é imprescindível na regulação, por outro lado, poderá agir quer na criação de limites a plataformas de contrainformação, quer no fomento de experiências alternativas com apoios a grupos nacionais, escrutinados, que ajudem a modificar positivamente o panorama que temos. Mas o Estado está longe de poder fazer tudo."
Este texto tem mais de 2 anos. Foi escrito por Manuel Carvalho da Silva no início de Dezembro de 2018 e foi publicado no Jornal de Notícias.
A crise da comunicação social já vem de longe, mas esta crise do COVID19 agravou-a: a quebra abrupta da actividade económica, tinha de ter efeitos na publicidade. Se não se vende não se promove.
A comunicação social tem nas receitas publicitárias uma boa parte do seu equilíbrio financeiro. Contudo, também depende do número de leitores ou espectadores.
Seria de todo o interesse ser pluralista. Por isso, é que os canais de televisão, estações de rádio e a maioria dos jornais, se afirmam “independentes”. Todavia, essa independência, na prática, consiste quase sempre numa atitude reverencial perante o poder.
A fragilização dos colectivos redactoriais teve consequências: «A assessoria de imprensa trabalha em cima das brechas do jornalismo», nomeadamente a falta de meios humanos e de tempo para pensar. «A tendência vai no sentido da diminuição da cobertura jornalística por iniciativa dos jornalistas e do aumento do aproveitamento do que vem das agências».
Há quem considere que "não é a crise dos media que faz perigar a democracia; é a democracia que está em perigo com media destes"...
Há quem "não precise para nada de media que se alvoroçam contra «fake news» e «redes sociais» onde, porém, se encontra todos os dias informação, dados, perguntas, dúvidas, debate, críticas que escapam aos media, miseravelmente."
Há até quem se "agonie com a reverência dos media perante primeiro-ministro e governo, a passividade e falta de contraditório com que acolhem todos os ditames."
Um dia li que "o especialista é o único que sabe que nem os especialistas percebem nada do assunto."
Como leitor de jornais há 50 e tal anos (com 10 de idade, não todos os dias (só quando o meu estava em casa no intervalo das viagens ao Cabo Branco...), mas tinha acesso a jornais como A Bola, O Mundo Desportivo, O Primeio de Janeiro, o Diário de Notícias, o Século), penso que a crise (que não é recente) tem vários culpados.
Os meios de comunicação social já vivem num mar encapelado e cheio de dificuldades, pelo menos, há cerca de 30 anos, mas na última dezena de anos o problema agravou-se. A crise provocada pela pandemia foi um tiro em cheio. O Presidente Marcelo, que sabe para que serve a comunicação social, melhor do que ninguém, em Dezembro de 2019 (antes da pandemia...) já andava a alertar: "os poderes públicos têm de colocar a comunicação social no centro das prioridades e das medidas orçamentais."
Uns são estruturais e obedecem a objetivos estratégicos do poder dos mercados e das suas instituições, outros resultam da substituição da informação por notícias, verdadeiras ou falsas, que servem poderes subversivos e atacam a democracia e outros, ainda, podem residir na subversão da profissão de jornalista. Sobre esse caldo de pressões e de irresponsabilidades é evidente, também, a incapacidade do poder político criar barreiras à penetração de poderosas multinacionais que roubam, sem contemplações, as receitas de uma atividade que precisa de uma dimensão nacional.
Entre as causas externas encontra-se a expansão, radical e rápida, das transformações no mercado de comunicação, tanto no que se refere a formas de a fazer, como quanto à apreensão da informação: as plataformas que dão vida a redes sociais, a desmultiplicação de suportes de informação, a concorrência de múltiplas formas de suporte de informação.
Os detentores de meios de Comunicação Social não souberam nem antever nem acompanhar o que estava a acontecer e muito menos fazer-lhe frente. Aderiram em massa à inovação em marcha (ofereceram a sua produção na Internet ao mesmo tempo que a queriam vender em papel), ignorando, por interesses imediatos, que ela viria a cavar a sua sepultura. Os jornalistas - trabalhadores qualificados e relevantes nas nossas sociedades - não são os grandes responsáveis dos problemas existentes, contudo têm todo o interesse em proceder a uma análise crítica do percurso feito e em encontrar saídas. E podem ajudar a construí-las.
Os jornalistas acabaram por sofrer em grande medida às suas próprias mãos. Inicialmente agiram como se estivessem protegidos pelos poderes emergentes, que por vezes catalogaram facilmente de modernidade.
Segundo, não resistiram às ideias dominantes de desarticulação das instituições representativas e de libertação de poderosas forças da sociedade sem contrapoderes. Por vezes têm feito parte de processos que atacam as instituições de mediação indispensáveis ao funcionamento da democracia.
Terceiro, ao vestir individualmente a camisola de uma concorrência que não era a sua, não conseguiram contrapor-se à opção recessiva adotada pelos grupos de Comunicação Social - cortes de pessoal, degradação do produto, menos audiências, menos receitas, mais cortes de pessoal. Reproduziu-se neste setor a desigualdade social que se vive em amplos setores por todo o país: chefes muito bem pagos a coordenar jornalistas recém-criados mal pagos e explorados.
Deste cenário todo e com a publicidade a ser canibalizada pelas multinacionais, como o Google e o Facebook, em prejuízo dos grupos nacionais, resultou que não só os produtos não mudaram como, pior ainda, a informação tradicional e credibilizada mimetizou aquilo que as novas formas de produção de notícias fornecem: a notícia do momento (verdadeira ou falsa) sem preocupação informativa, o superficial, o risível.
A crise que se vive é a expressão, neste sector, dos objetivos e práticas do sistema capitalista, nesta sua fase de neoliberalismo, de financeirização da economia e mercantilização do trabalho, com um pensamento dominante e uma forma de estar na vida social. A classe profissional jornalistas, como outras, tem tolerado em demasia este rumo, tendo apenas reações típicas de agentes assustados.
Como se reverte isto?
Os órgãos de poder não podem ficar indiferentes. O espaço da Comunicação Social é público e é concessionado e, como tal, o Estado deve ter uma palavra. Intervir mas com princípios e regras inerentes ao Estado Social de Direito Democrático e não com remendos dando dinheiro ou proteções a entidades ou empresas que continuarão a reger-se pela lógica de um Estado ao serviço dos mercados.
O Estado é imprescindível na regulação, por outro lado, poderá agir quer na criação de limites a plataformas de contrainformação, quer no fomento de experiências alternativas com apoios a grupos nacionais, escrutinados, que ajudem a modificar positivamente o panorama que temos. Mas o Estado está longe de poder fazer tudo."
Este texto tem mais de 2 anos. Foi escrito por Manuel Carvalho da Silva no início de Dezembro de 2018 e foi publicado no Jornal de Notícias.
A crise da comunicação social já vem de longe, mas esta crise do COVID19 agravou-a: a quebra abrupta da actividade económica, tinha de ter efeitos na publicidade. Se não se vende não se promove.
A comunicação social tem nas receitas publicitárias uma boa parte do seu equilíbrio financeiro. Contudo, também depende do número de leitores ou espectadores.
Seria de todo o interesse ser pluralista. Por isso, é que os canais de televisão, estações de rádio e a maioria dos jornais, se afirmam “independentes”. Todavia, essa independência, na prática, consiste quase sempre numa atitude reverencial perante o poder.
A fragilização dos colectivos redactoriais teve consequências: «A assessoria de imprensa trabalha em cima das brechas do jornalismo», nomeadamente a falta de meios humanos e de tempo para pensar. «A tendência vai no sentido da diminuição da cobertura jornalística por iniciativa dos jornalistas e do aumento do aproveitamento do que vem das agências».
Há quem considere que "não é a crise dos media que faz perigar a democracia; é a democracia que está em perigo com media destes"...
Há quem "não precise para nada de media que se alvoroçam contra «fake news» e «redes sociais» onde, porém, se encontra todos os dias informação, dados, perguntas, dúvidas, debate, críticas que escapam aos media, miseravelmente."
Há até quem se "agonie com a reverência dos media perante primeiro-ministro e governo, a passividade e falta de contraditório com que acolhem todos os ditames."
Um dia li que "o especialista é o único que sabe que nem os especialistas percebem nada do assunto."
Como leitor de jornais há 50 e tal anos (com 10 de idade, não todos os dias (só quando o meu estava em casa no intervalo das viagens ao Cabo Branco...), mas tinha acesso a jornais como A Bola, O Mundo Desportivo, O Primeio de Janeiro, o Diário de Notícias, o Século), penso que a crise (que não é recente) tem vários culpados.
Os meios de comunicação social já vivem num mar encapelado e cheio de dificuldades, pelo menos, há cerca de 30 anos, mas na última dezena de anos o problema agravou-se. A crise provocada pela pandemia foi um tiro em cheio. O Presidente Marcelo, que sabe para que serve a comunicação social, melhor do que ninguém, em Dezembro de 2019 (antes da pandemia...) já andava a alertar: "os poderes públicos têm de colocar a comunicação social no centro das prioridades e das medidas orçamentais."
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