domingo, 5 de maio de 2024

Óscar do pior argumento

Leiam, mas com cuidado, ele é idoso! Ele é o Óscar "Tortura" Cardoso. "A ditadura só caiu porque as pessoas estavam fartas de comichão: no 25 de abril costuma circular imenso pólen e havia dificuldades em importar anti-histamínicos"...

Imagem: daqui

Texto: Cátia Domingues/Humorista

«No 25 deAbril, por ocasião dos 50 anos da coisa mais bonita, o “Correio da Manhã" deu-nos a entrevista que se pedia. Não, não foi a Aurora Rodrigues, não foi a Isabel do Carmo, não. 

O entrevistado foi Óscar Cardoso, inspector da PIDE, que teve a oportunidade de dar uma perspetiva diferente à História de Portugal. Parece que a policia política do Estado Novo, responsável por neutralizar toda e qualquer oposição ao regime, afinal era cá da malta e tem de beber este copo até ao fim, até ao fim. Segundo o próprio, as pessoas não foram torturadas pela PIDE. Foram, e cito, “chateadas” pela PIDE. E é verdade, há vários relatos de presos que sobreviveram ao encarceramento que dizem isso mesmo. O que os forçava muitas vezes a confessar não eram pauladas no lombo, despir e tocar nas mulheres interrogadas, simulação de afogamento, não. Porque isso configura tortura e a PIDE só aborrecia, como aquelas pessoas que falam alto no cinema. Um dos métodos mais comuns era o de ligar à hora de jantar para casa do suspeito para lhe falar da Endesa. Outro era a famosa tortura do sono que, como sabemos, consistia em estarem ossuspeitos a dormir e vir um pide e começar “estás a dormir? estás a dormir?”, ou quantas vezes o policia que estava a fazer o interrogatório não utilizava aquele método tão cruel como: “Vê lá este mergulho! Olha não estavas a olhar. Vê lá este”. Ou pensam que a escolha de prisões em Peniche ou em Caxias, ali à beirinha da praia, foi por acaso? 

Óscar também revelou que os choques no corpo, que estão bem documentados, não eram tortura. Nas suas palavras, "faziam comichão". Sim, na medida em que podemos dizer que decepar um braço aleija. O Óscar quer fazer crer que as sessões de interrogatório da PIDE eram um daqueles momentos divertidotes no confessionário do “Big brother” em que entregam umas pulseiras que dão choques ao concorrente Flávio C., enquanto o fazem jogarJenga. Na mesma entrevista, Óscar revelou o seu voto, porque realmente nunca foi fã do voto secreto. Óscar votou no PAN. Estou a gozar. Foi no Chega. 

Óscar também foi organizador de uma tropa secreta, criada pela PIDE nas ex-colónias, chamada Os Flechas, que parece o nome querido de um grupo de escuteiros-mirins que se dedicam a fazer fogueiras com duas pedrinhas, com a diferença de não serem marshmellows a grelhar: “metia-se a pólvora de uma bala em cima da cabeça do arguido em papel de tabaco, lançava-se fogo ao tabaco em cima do papel; não queimava a cabeça mas aquecia um bocadinho, dizíamos que era feitiço, eles ficavamhorrorizados, eles viam num espelho o fumo a sair da cabeça”. É pena que o Youtube tenha sido inventado anos depois, porque o Óscar tinha tudo para ser uma estrela das pegadinhas. 

Mas esta não foi a primeira entrevista que o “Correio da Manhã” lhe fez. Já em 2016, o inspector da PIDE Óscar Cardoso foi alvo de perguntas bem pesadas por parte do jornal. “Incomoda-o que definam a sua vida pelos dez anos na PIDE-DGS?” Respondeu Óscar: “Foram os anos mais felizes da minha vida. Pelo contrário, tenho muito orgulho nisso”. Eu não sei se o “Correio da Manhã” já tem entrevistas pensadas para outros dias comemorativos, mas eu sugiro convidarem a Cruella de Vil para o Dia Mundial do Animal.»

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