A Gala, dos meus tempos de menino e moço, tinha uma ampla e invejável frente de rio.
Era uma zona linda, vibrante, que fazia a ligação natural do povoado ao rio e, ao mesmo tempo, ao mundo do trabalho (a pesca) e ao mundo do lazer (na altura, era o nosso parque infantil, o nosso parque desportivo, era até a zona com algo de marginal, como, por exemplo, o jogo das cartas que se ia praticando pelos recantos discretos dos armazéns...).
Há anos, porém, tudo isso - e também a paisagem magnifica - nos foi roubado com a construção da variante, que não é mais que um muro que nos separou do nosso rio.
Na altura, ninguém conseguiu contrariar a força das circunstâncias...
Passaram os anos e veio o Portinho da Gala e, pensei eu, estava encontrada a nova janela de oportunidade para os covagalenses se reconciliarem com o rio.
Pensei que poderia estar ali, no enorme aterro da estrutura portuária, a área para a mudança, com a abertura de espaços para o lazer, a cultura, o entretenimento, o turismo, etc.
“Voltar ao rio”, seria a oportunidade de rentabilizar um espaço que orçou mais de 500 mil contos.
Entretanto, e já lá vão uns anos, nada disso aconteceu. Recorde-se, que o Portinho da Gala foi inaugurado, com pompa e circunstância, pelo então Ministro de Estado, da Defesa e dos Assuntos do Mar, Dr. Paulo Portas, no dia 5 de Outubro de 2004.
Até agora, o espaço, o enorme espaço, lá está, árido e quase desaproveitado.
Até agora, constitui uma oportunidade perdida.
Que o mesmo é dizer: na nossa Terra, continua latente a necessidade de potenciar, ao máximo, a relação com o rio.
António Agostinho, o autor deste blogue, em Abril de 1974 tinha 20 anos. Em Portugal havia guerra nas colónias, fome, bairros de lata, analfabetismo, pessoas descalças nas ruas, censura prévia na imprensa, nos livros, no teatro, no cinema, na música, presos políticos, tribunais plenários, direito de voto limitado. Havia medo. O ambiente na Cova e a Gala era bisonho, cinzento, deprimido e triste. Quase todas as mulheres vestiam de preto. O preto era a cor das suas vidas. Ilustração: Pedro Cruz
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