Foto Reinaldo Rodrigues/Global Imagens |
Numa interessante entrevista ao Diário de Notícias, que vale a pena ler na íntegra, este jornalista e profesor universitário, que trabalhou no gabinete de José Relvas, no governo de Passos Coelho, (o XIX Governo Constitucional) durante 11 meses e escreve livros sobre comunistas, considera que "as pessoas não fizeram nenhum esforço para entender a posição do PCP sobre a guerra da Ucrânia. As pessoas estão a dispensar os políticos, os jornalistas, os historiadores, para apurar o que se passa e o que se passou. Há muito tempo a esta parte há uma coisificação do espaço público. Assistimos a isso sobre a Ucrânia e também sobre a guerra de Israel em Gaza. As ideologias deixaram de ser suficientes para explicar o mundo. Como é que um partido político que tem uma visão e interpretação da história e é forjado nela pode explicar a sua narrativa nesse novo ambiente de perda de sentido coletivo. Esse fenómeno é uma das principais dificuldades do PCP, que tem uma ideologia e quer fazer o debate num mundo totalmente fragmentado e dividido em bolhas, numa sociedade de pessoas irritadas em que se perde esta dimensão coletiva.
Quando dizem que as redes sociais e a internet vieram democratizar, é absolutamente falso. Criaram bolhas que estabelecem uma interpretação da verdade e que criam um determinado contexto. Não há pluralismo, o que há é um fechamento do debate. O que eu quis foi contribuir para o aumento da pluralidade na discussão. Apenas quis introduzir contexto histórico. Dir-me-ão, isso acabou por dar uma perspetiva diferente das posições dominantes e dar alguma luz sobre as opiniões divergentes, como as do PCP? Admito que sim.
Não é minha a culpa de que as pessoas não leram, nem estudaram, nem fizeram nenhum esforço para entender a posição do PCP sobre a guerra da Ucrânia."
Mais adiante Adelino Cunha, sobre os fundamentos ideológicos do PCP, diz: "não cedeu ao eurocomunismo. Um partido com mais de 100 anos de história é um partido que existe num tempo longo, não pode ser interpretado sistematicamente neste tempo imediato das redes sociais. Nós temos que o analisar como algo que nasce em determinadas circunstâncias e mantém uma identidade. Mesmo quando o PCP tem de "divergir", digamos assim, fá-lo por razões da sua portugalidade. É o caso quando -- em tempos da teoria da coexistência pacífica na União Soviética -- o partido português defendia um levantamento popular armado em Portugal. Essa divergência existe para expressar as condições próprias da situação portuguesa e mostra a convicção de Álvaro Cunhal que é possível uma revolução em Portugal para derrubar o fascismo. Nessa altura, o PCP desafia Moscovo, ao negar a aplicação da coexistência pacífica a Portugal, não aceitando esvaziar a luta de classes. Álvaro Cunhal, embora esteja num partido pequeno e periférico, era altamente prestigiado e considerado no movimento comunista internacional. É por isso que consegue impor a sua visão sobre o derrube do fascismo em Portugal em tempos em que o Partido Comunista da União Soviética falava da necessidade de uma coexistência pacífica entre dois blocos. Isso rompe com a ideia de que o PCP esteve sempre alinhado com Moscovo. Esteve alinhado nas questões internacionais, mas, quando se tratou de derrubar o fascismo em Portugal, o PCP foi bastante claro e seguiu apenas as convicções dos comunistas portugueses".
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