Morreu Óscar Lopes. Não sei se na secretaria de Estado da
Cultura o conhecem. É provável que nas próximas horas lhe dediquem as
costumeiras linhas apesar de Lopes não ser um "evento" ou um sapato
gigante enfiado numa sala. Há uns anos, numa feira do livro em Cascais,
arranjei o "par" que me faltava dos seus livros de ensaios editados
pela Inova, do Porto, Ler e Depois. O outro intitula-se Modo de Ler". Ler
e Depois foi publicado em 1969. Ou seja, em pleno "fascismo". Lopes
nunca escondeu a sua "formação" ideológica (marxista) mas nunca fica
diminuída a escrita. Pelo contrário, lêem-se referências a autores que só nas
décadas seguintes surgiram sob o signo de "grandes referências". Ou
de outros, como Heidegger, cujo "modo de ler" de Óscar Lopes ajuda a
compreender mesmo através de demoradas e perspicazes notas "de pé de
página". Lopes era irmão de Mécia, a mulher de Jorge de Sena, que, para
felicidade dela, ainda reside nos Estados Unidos. Com António José Saraiva
escreveu a mais reeditada História da Literatura Portuguesa. Dividiram bem o
trabalho e, dos dois, há uma recolha relativamente recente da correspondência.
O seu desparecimento é mais um no lastro de perda em que mergulhámos enquanto
"cultura" e sociedade. As coisas são o que são.
António Agostinho, o autor deste blogue, em Abril de 1974 tinha 20 anos. Em Portugal havia guerra nas colónias, fome, bairros de lata, analfabetismo, pessoas descalças nas ruas, censura prévia na imprensa, nos livros, no teatro, no cinema, na música, presos políticos, tribunais plenários, direito de voto limitado. Havia medo. O ambiente na Cova e a Gala era bisonho, cinzento, deprimido e triste. Quase todas as mulheres vestiam de preto. O preto era a cor das suas vidas. Ilustração: Pedro Cruz
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