Na edição de hoje do Diário as Beiras, Teotónio Cavaco, responde à pergunta «que pode a câmara fazer para “aproximar” a cidade do mar através do areal urbano?», desta forma. «O prolongamento, em cerca de 400 metros, do molhe norte, em 2011, acrescentou dimensão a um triplo problema, cujas variáveis, ligadas, parecem não possibilitar uma solução que a todas resolva completa e satisfatoriamente: a progressiva falta de areia a sul, a acumulação galopante de areia a norte e a navegabilidade na barra do rio.
Entendendo a necessidade da referida obra, muito cara mas imprescindível sobretudo para a sustentabilidade de um porto comercial tão estratégico quanto merecedor de atenção e investimento internacional, nacional e mesmo regional (é o único entre Aveiro e Lisboa), é inegável que aquela acentuou a erosão nas praias a sul, a destruição da duna de proteção costeira em vários locais (sobretudo na praia da Cova), e a retenção de areia na praia da Figueira em cerca de 230 mil metros cúbicos, como refere Nunes André “23 mil camiões que, se dispostos em fila contínua, ocupariam os mais de 300 quilómetros de ligação por autoestrada entre Lisboa e Porto” – a cada ano.
Ora, esta situação é insustentável para as populações a sul, em constante estado de alerta, e para o turismo, cada vez mais sazonal e dependente de uma praia cada vez mais afastada da cidade-mãe.
Assim, a pergunta desta semana, dramaticamente atrasada 40 anos (o Programa Base de Urbanização da Marginal Oceânica – areal da praia – teve início em junho de 1981) devia ser: o que é que a Câmara já devia ter feito para aproximar a cidade do mar através do areal urbano?
Primeiro, definir claramente se quer tirar areia (aproximar o mar da cidade) ou aproveitá-la (aproximar a cidade do mar); depois, envolver todas as Entidades, nacionais e internacionais, que possam estar relacionadas com a jurisdição e administração dos espaços; finalmente, cativar parceiros que sejam desafiados a interessar-se por uma Figueira do século XXI. Ou seja: durante mais uns meses, isto continuará a ser ficção científica!…»
Nota OUTRA MARGEM:
Só, para mais uma vez, avivar a memória, e por o seu conteúdo ser do maior interesse, vamos recuperar, com devida vénia, extratactos de uma carta do SENHOR MANUEL LUÍS PATA, publicada no dia 26 de Março de 2007, no “Diário de Coimbra”, pág. 8, na secção Fala o Leitor, com o título:
«“Erosão das Praias”
Permitam que me identifique: |
Foto Pedro Agostinho Cruz |
Manuel Luís Pata, nascido há 82 anos na povoação da Gala (à beira do mar), Figueira da Foz e filho, neto e bisneto de marítimos. Também eu como os meus ascendentes, segui a vida do mar, onde aprendi a ser homem. O mar foi para mim um grande Mestre… E a vida que escolhi levou-me a conhecer novos horizontes!...
Vivi 20 anos em Moçambique. Cinco na marinha mercante e quinze na província da Zambézia, catorze dos quais a governar um dos navios da Sena Sugar Estates, o “ Mezingo”.
Sou um simples cidadão que ama a sua Pátria. É esta a razão que me leva a lutar pelo bem do meu pobre País, que continua a ser destruído, não pela natureza, mas sim pelo ser humano!...
Qual a principal causa da catástrofe que se avizinha?
Os molhes da barra da Figueira da Foz
Foram estes “Molhes” que provocaram a erosão das praias a sul da Figueira, e foi o “ Molhe Norte” que originou a sepultura da saudosa “ Praia da Claridade”, a mais bela do país. Embora seja de conhecimento geral, quão nefasto foi a construção de tais molhes teimam em querer acrescentar o “Molhe Norte”, como obra milagrosa… Santo Deus! Tanta ingenuidade e tanta teimosia!... Quem defende tal obra, de certo sofre de oftalmia ou tem interesse no negócio das areias!..»
Apesar de algumas vozes discordantes – principalmente de homens ligados e conhecedores do mar e da barra da Figueira – foi concluído o prolongamento do molhe norte.
Os resultados, infelizmente, estão à vista: já morreram várias pessoas à entrada desta nossa barra.
As dragagens realizadas na enseada, na barra e no rio, na opinião de Manuel Luís Pata – velho e teimoso lutador contra as obras que têm sido feitas, nomeadamente o prolongamento do molhe norte, a que chama a obra “madastra”, fazendo alertas para o que iria acontecer – são a “principal causa da assustadora erosão da costa marítima, principalmente e S. Pedro de Moel para o norte”.
Ao contrário de Leixões, cujo molhe está curvado a sul, mas está construído em local fundo, onde por isso o mar não rebenta, na foz do Mondego, devido ao constante assoreamento provocado pelas areias que vêm do norte, o mar rebenta mesmo á saída da barra, tornando-a na opinião de muitos pescadores com quem convivemos todos os dias, neste momento, a pior barra do país para os pequenos barcos de pesca.
Como evitar isto?
Na opinião de Manuel Luís Pata, um exemplo de perseverança, só há uma alternativa: “fazer o molhe a partir do Cabo Mondego para sul, o que não só serviria de barragem às areias, como também abrigaria a zona do Cabo Mondego e Buarcos, evitando-se assim as investidas do mar na marginal e que ainda há pouco tempo causaram importantes estragos na zona da Tamargueira."
Como me disse ao longo dos anos o velho e experiente Homem da foto acima, nas inúmeras e enriquecedoras conversas que ao longo da minha vida com ele tenho tido, e que foram a base deste texto, “a Figueira nasceu numa paisagem ímpar. Porém, ao longo dos tempos, não soubemos tirar partido das belezas da Natureza, mas sim destruí-las com obras aberrantes. Na sua opinião, a única obra do homem de que deveríamos ter orgulho e preservá-la, foi a reflorestação da Serra da Boa Viagem por Manuel Rei. Fez o que parecia impossível, essa obra foi reconhecida por grandes técnicos de renome mundial. E, hoje, o que dela resta? – Cinzas!..”