foto António Agostinho |
Hoje, ao fim da tarde, ao arrumar uns
garrafões de tinto e branco, fiquei com a asa de um na mão.
Estão a ver a cena: 5 litros de bom tinto (tantos copos!..) foram à vida e fiquei com a cozinha numa lástima.
Primeiro, fiquei danado. Depois, parei para pensar e lembrei-me
dos Gaibéus (que são os jornaleiros da província portuguesa do
Ribatejo ou da Beira Baixa que vão trabalhar nas lezírias durante
as mondas) o primeiro romance de Alves Redol, que inaugura em 1939 o
neo-realismo em Portugal.
Este livro, que aconselho a leitura, retrata "um povo resignado que
luta afincadamente durante o tempo quente, antes da chegada do
Inverno, em condições extremas para fazer render os poucos cobres
que lhes pagam por tamanha dureza. Por um lado o trabalho árduo de
sol a sol, as doenças (malária), a fadiga e a teimosia em cada vez
se fazer o trabalho mais rápido para mais rendimento obter, a sede,
a fome, a pobreza extrema. Por outro lado, o modo como preenchiam as
escassas horas de lazer, os sonhos de uma vida melhor, os projectos
sem logro, o vinho para alegrar os espíritos."
A obra, lembro-me bem - e já a li há mais de 30 anos - marca o estilo de
Redol, autor que através das palavras denunciou as desigualdades
sociais e a exploração do homem pelo homem.
Perdi 5 litros de boa pinga e tive uma
trabalheira dos diabos para limpar a cozinha, mas nem tudo foi mau: recordei Alves Redol.