Foi a primeira mulher a ganhá-lo!
segunda-feira, 14 de outubro de 2024
OE: quando Pedro Nuno Santos se atirou para uma armadilha
«Serão os mesmos que pediram “responsabilidade” a Pedro Nuno Santos a falar dos seus ziguezagues e falta de clareza. Acham que, em negociações, não se avança e recua. E que se pode ser claro quando se gere uma derrota anunciada. Esta nunca poderia ser uma verdadeira negociação, porque duas forças só negoceiam quando as duas têm alguma coisa a perder. E, a Montenegro, tanto dava ter um OE com cedências mínimas como ir a eleições. Só precisava de gerir a responsabilização do PS, no que, ainda por cima, sabia contar com a ajuda de boa parte do aparelho mediático e dos derrotados internos do partido.
Câmara da Figueira da Foz, em sessão da assembleia municipal extraordinária rejeita suspeições sobre unidade de biocombustíveis (II)
Isto só lá vai com um detector de mentiras!
Segundo o que Marques Mendes comentou, nesta novela de quem mente com mais dentes, se o Montenegro, se o Ventura, é palavra contra palavra, só se pode desempatar indo lá pela credibilidade.
Ficamos na mesma...
A meu ver, isto só lá vai com um detector de mentiras.
Iria ter um share de audiências nunca visto em televisão...
Irreversível estreia hoje às 21h00, na RTP1
Via Município da Figueira da Foz
Uma psicóloga atormentada, Júlia Mendes, e um inspetor determinado, Pedro Sousa, unem-se para resolver um homicídio brutal de uma jovem rapariga numa cidade costeira.
domingo, 13 de outubro de 2024
Isto, sim, é mesmo brincar com quem trabalha
Imagem via Correio da Manhã |
Vital Moreira é pessoa bem informada e cuidadosa. Não ia escrever uma coisa destas se não fosse verdade.
Transcrevo do CAUSA NOSSA:
"1. O problema da pensão da ex-PGR (e dos magistrados superiores do MP em geral, quando "jubilados") não é somente o seu elevado montante, superior a 7000 euros - o maior do setor público institucional -, mas sim o facto de as suas pensões serem equivalentes ao último vencimento bruto no ativo (sem dedução da contribuição para a segurança social!...), e de assim se manterem todo o tempo. Ou seja, é maior a pensão de aposentado do que a remuneração líquida no ativo!
Trata-se de um regime altamente vantajoso em relação ao regime geral das pensões, aplicável aos demais servidores do Estado, as quais (i) dependem da carreira contributiva, (ii) equivalem a uma percentagem do última remuneração (deduzida da contribuição para a segurança social) inferior a 90% e (iii) têm regras próprias de atualização, sem indexação à atualização das remunerações no ativo.
Ou seja, um escandaloso regime de privilégio.
2. Mesmo que o regime descrito se justificasse (e a meu ver, tal não se justifica) para os juízes, por serem titulares de órgãos de soberania (os tribunais), com especiais responsabilidades e incompatibilidades, não se vê nenhuma razão para a equiparação dos magistrados do Ministério Público, que não são titulares de um cargo público (como os juízes), tendo antes uma relação de emprego público com o Estado, e que não têm responsabilidades e incompatilidades comparáveis com as dos juízes (desde logo quanto à liberdade sindical e ao direito à greve).
Se o regime de pensão dos "jubilados" é um privilégio dificilmente justificável no caso dos juízes, torna-se num superprivilégio sem nenhuma justificação no caso dos magistrados do MP.
3. Um dos efeitos colaterais desde regime de privilégio é a tendência natural para a aposentação e o abandono de funções logo que atingida a idade necessária (atualmente 66 anos e 6 meses), tanto mais que os candidatos ao lugar vago pressionam nesse sentido, ao contrário do que sucede noutras atividades públicas, em que muitos preferem adiar a aposentação até ao limite legal (70 anos) - salvo quando podem continuar a atividade no setor privado -, justamente por ela implicar uma significativa redução de rendimento.
Um modo de atenuar ligeiramente este indevido privilégio seria permitir a dita jubilação somente na idade da aposentação obrigatória (70 anos), como sucede com os professores universitários, aliás sem nenhuma vantagem nas suas pensões. O mínimo que se pode exigir para obter aquele estatuto privilegiado deveria ser algum tempo de serviço extra e de contribuição adicional, assim moderando o peso dessas pensões sobre os contribuintes. Todavia, tendo em conta a experiência passada, seria estulto esperar que partidos políticos, Governo e parlamento tenham a coragem necessária para tal reforma mínima.
Em Portugal, os privilégios corporativos tendem a assumir-se como direitos adquiridos coletivos irrevogáveis.
Guterres e a virtude da insistência
«...o que se pede a um secretário-geral das Nações Unidas é que ele consiga ser uma voz lúcida, esclarecida, sensata e justa para o mundo. Uma voz que saiba aliar a prudência com a neutralidade inerente ao cargo, e exercida de forma profissionalmente diplomática. Nos tempos difíceis e tumultuosos em que vivemos, o secretário-geral das Nações Unidas tem de ser aquilo que Guterres demonstra: uma voz inspiradora e corajosa, comprometida com o respeito incondicional dos direitos humanos, em todas as vertentes e situações. E isto não é coisa pouca. Num mundo em que, a uma velocidade estonteante, os líderes políticos mudam depressa de opinião ou alteram os seus argumentos, de acordo com as regras da popularidade, António Guterres tem sabido ser sempre insistente nos mesmos temas e princípios. Na batalha pela atenção das audiências globais, Guterres não cede à ditadura dos algoritmos ou às sondagens de opinião. Mesmo correndo o risco de ser mal interpretado ou considerado cansativo, ele fez da insistência na determinação das suas convicções a principal arma. E, nos dias que correm, essa é uma excecional virtude. Até porque os seus temas de eleição não mudaram desde o dia que tomou posse: o desafio climático, a necessidade de cooperação, a luta pela paz, o combate à desigualdade, a defesa da democracia. Enquanto muitos desistem, Guterres tem sabido usar a sua voz como exemplo.»
sábado, 12 de outubro de 2024
A nossa degradação moral face à impunidade da guerra de Israel
«... é inadmissível a complacência que a União Europeia e o Governo português têm mostrado face a esta guerra. Lestos, e bem, em condenar e sancionar a Rússia pela invasão da Ucrânia, nem de perto nem de longe responderam às violências israelitas, nem às sistemáticas violações do direito internacional, nem sequer se mexeram muito para defender a ONU e António Guterres, ambos alvos de Israel, que ataca tudo à sua frente no terreno e na diplomacia, que não merece esse nome. Há que compreender que esta hesitação miserável da Europa (Portugal incluído), que nem sequer tem grande papel como realpolitik, a não ser nalguns países por medo eleitoral, significa uma abjecção moral e uma cumplicidade inaceitável. Degrada-nos como país e como pessoas pela imoralidade.»
Filhos de um deus menor?
As reuniões entre Montenegro e Ventura, o que se sabe, o que falta saber. Resta uma curiosidade: será que Ventura saíu mesmo pelas traseiras?
O primeiro-ministro negou o acordo e recusou-se a falar mais sobre o assunto.
Ontem à noite, à hora em que costumo estar no primeiro sono no sofá, tive uma insónia. Por isso, calhou ver a entrevista a André Ventura no NOW.
Na minha opinião a jornalista até nem esteve mal. Todavia, tudo aquilo foi muito mau, desagradável e degradante.
Julgo ter percebido o seguinte: "Ventura diz que Montenegro mentiu aos eleitores na entrevista. Que Montenegro andou a negociar com o Ventura, mas não quis que se soubesse. Que Montenegro, recentemente desqualificou e insultou o Chega em público, depois dos encontros negociais, pelos vistos da iniciativa do Montenegro, que não levaram a nada, porque o Ventura queria um acordo de governo para toda a legislatura e o Governo só queria que o orçamento passasse. Ao mesmo tempo, Montenegro fingia que negociava com o PS, enquanto o PSD e a sua entourage de comentadores apelavam à responsabilidade deste partido na aprovação do orçamento."
Câmara da Figueira da Foz rejeita suspeições sobre unidade de biocombustíveis
Texto: Diário as Beiras
Foto: Campeão das Províncias
«A Câmara da Figueira da Foz, repudiou ontem as suspeições lançadas sobre a instalação da unidade de combustíveis avançados da empresa portuguesa BioAdvance no terminal de granéis líquidos do porto marítimo.
O executivo liderado por Pedro Santana Lopes esclareceu, em assembleia municipal extraordinária, que a instalação resultou de um contrato de concessão assinado em agosto de 2022 com a administração do porto, que emitiu em dezembro do mesmo ano o alvará de licença.
Numa reunião bastante agitada, que foi convocada para discutir a situação da empresa, depois de na última assembleia a oposição ter manifestado dúvidas sobre a sua legalidade, os serviços técnicos da Câmara apresentaram todos os passos do projeto, que pretende produzir anualmente mais de 20 mil toneladas de biodiesel a partir de óleos alimentares usados.
A empresa, sediada no concelho de Pombal, onde possui uma unidade mais pequena, instalou-se junto ao terminal de granéis líquidos do porto da Figueira da Foz, depois de uma candidatura aprovada ao “Sistema de Incentivos à Inovação Empresarial – Verde” e do projeto ter sido reconhecido com o estatuto de Potencial Interesse Nacional (PIN).
O presidente da Junta de Freguesia de Vila Verde, Vítor Alemão (PS), insistiu hoje que a unidade está a laborar sem licença e a provocar poluição ambiental através de cheiros e odor incomodativo, que já motivou, segundo afirmou, queixas na PSP e da própria Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro (CCDRC).
Uma afirmação rejeitada pelo município, que garante não ter conhecimento de que a empresa esteja a funcionar.
A vice-presidente Anabela Tabaçó disse que a empresa ainda não possui licença de utilização para funcionar e que efetua apenas testes de equipamentos, enquanto decorre o processo de obtenção da licença industrial.
A autarca explicou que o município licenciou as obras de construção, mas que a licença de utilização só pode ser emitida quando estiver concluído o processo de licenciamento industrial na CCDRC, iniciado em 2023.
Anabela Tabaçó acusou o presidente da Junta de Vila Verde de acusações gravíssimas ao executivo por causa daquela unidade, lamentando que o autarca “só agora seja tão enérgico” sobre um processo iniciado em 2022.
Segundo os serviços técnicos municipais, encontra-se ainda em curso o processo de licenciamento ambiental daquela unidade da competência da Agência Portuguesa para o Ambiente (APA).
As suspeições lançadas sobre o executivo a propósito deste projeto motivaram hoje duras críticas do presidente da autarquia, que pediu a reunião extraordinária para esclarecer todo o processo de legalização da empresa, que resultou de um investimento privado de aproximadamente 27 milhões de euros.
Santana Lopes chegou mesmo a acusar o presidente da Assembleia Municipal, José Duarte Pereira, eleito pelo PS, de não ter atuado com a mesma atitude no tratamento do assunto e de não o ter defendido enquanto presidente da Câmara, quando estava em causa “a sua honra e dignidade”.
“Não tenho obrigação, nem que tivesse 21 anos, ser eleito e vir para uma reunião ser ofendido e o senhor presidente não por cobro às ofensas”, enfatizou Santana Lopes, bastante irritado, salientando que ao convocar esta assembleia cumpriu o seu dever de esclarecer.
O proprietário da BioAdvance, Paulo Gaspar, disse à agência Lusa que se encontra a decorrer na Agência Portuguesa do Ambiente (APA) o processo para a emissão do regime de Prevenção de Controlo Integrado de Poluição, que vai permitir a emissão da licença industrial.
No final da reunião, o presidente da Junta de Freguesia de Vila Verde referiu à Lusa que as explicações não inibem as consequências do funcionamento da empresa junto ao interface urbano, num processo “em que as pessoas não foram ouvidas e em que não há garantias que a população não seja afetada”.»
Inês, a mulher que mais prostitutas tirou da rua
Durante anos, entre 1978 e 1983, quando pouca gente a conhecia, li inúmeros textos de Inês Fontinha, antes de serem publicados pelo semanário Barca Nova.
O seu nome nunca saíu do meu radar.
A prostituição continua a ser um problema social do qual pouca gente quer falar.
A socióloga Maria Inês Gomes Rodrigues Fontinha, nasceu na Madeira no ano de 1943. Filha de Georgina de Jesus Gomes e de Júlio Roque Gomes, cresceu numa família numerosa de sete filhos. Segue os seus estudos na Ilha da Madeira e, em 1964, vem para Lisboa onde ingressa no Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas, licenciando-se em Ciências Sociais e Políticas no ano de 1969. Foi pela mão de um seu amigo jurista que, em 1975, conhece a Associação O Ninho, instituição particular de solidariedade social fundada em 1967 por impulso de Ana Maria Braga da Cruz, com o objectivo da promoção humana e social das mulheres vítimas de prostituição. Em 1976, torna-se monitora do lar de acolhimento das raparigas. Anos mais tarde será a coordenadora de lar e posteriormente directora de serviços. Trabalhou quase 40 anos na reinserção social das mulheres que se prostituem no sentido do desaparecimento da prostituição o que lhe dá uma indiscutível autoridade na matéria.
Inicia a sua actividade em O Ninho, em 1975, vivendo um período de mudanças profundas advindas da Revolução de Abril de 1974. Em plena euforia da liberdade conquistada, viu-se confrontada com uma realidade que desconhecia, a realidade das raparigas que residiam no Lar de Acolhimento, buscando caminhos de mudança, encontrando nele uma alternativa para a saída do sistema prostitucional que as acorrentava. Assinale-se que O Ninho, criado em Portugal à semelhança da instituição francesa Le Nid, com ela partilha objectivos e métodos, mas a sua singularidade apresenta um traço notável de persistência reconhecida quer dentro do País quer no estrangeiro. Em Portugal, O Ninho teve um papel fundamental na alteração da lei existente ao tempo do fascismo, quando a prostituição era proibida e as mulheres eram presas por se prostituírem (lei nº44 579 de 19 de Setembro de 1962) deixando a prostituição de ser crime a partir dos anos 80. Sempre atenta às mudanças operadas na sociedade – e no mundo – a instituição portuguesa foi membro fundador da Federação Europeia para o Desaparecimento da Prostituição, criada porque “a comunidade europeia está a ser pressionada pelo proxenetismo organizado no sentido da legalização”. Em 1992, Inês Fontinha é eleita Presidente dessa instituição europeia.
É membro do Conselho Nacional do MDM, tendo recebido a Distinção de Honra do MDM em 1992. Recebeu o Prémio da Revista Mulheres e muitas outras Revistas a consagraram nas suas páginas. Condecorada por Jorge Sampaio, recebe a Medalha de Mérito em 6 de Março de 1998. O Ninho, de que é Directora, é homenageado pela Assembleia da República com o Prémio de Direitos Humanos em 2003, sendo galardoado por várias organizações, entre as quais a Ordem dos Advogados.
Em 2005, em reconhecimento do seu mérito e prestígio pessoal, Inês Fontinha integra uma lista de mil mulheres proposta ao Prémio Nobel da Paz, lista apoiada pela organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO), para se contrapor ao facto de que desde 1901 apenas 12 mulheres terem sido galardoadas com o Prémio Nobel. Ainda que tal não tenha sido aprovado, Inês Fontinha sentiu-se muito honrada com essa proposta, tendo considerado na altura que, em geral, “só as mulheres que têm sucesso na política ou a nível empresarial são reconhecidas, e que as que desenvolvem um trabalho social têm pouca visibilidade”, e nessa medida, considerou essa distinção muito importante para “dar visibilidade às mulheres” que desenvolvem “trabalhos ocultos” e apoiam pessoas marginalizadas.
Inês Fontinha é uma figura surpreendente e muitas vezes polémica que se entregou de corpo e alma a uma causa sem nunca perder a verticalidade para poder denunciar quem produz o mal que, entretanto, diz querer erradicar. Sem nunca deixar de reivindicar e propor, mesmo nos tempos do fascismo, uma solução mais digna para as mulheres caídas na prostituição por razões económicas e vítimas de uma sociedade em que os homens pretendem ser donos e dominadores das mulheres e dos seus corpos. Nesse sentido, pronunciou-se ativamente contra a criação na Mouraria, em Lisboa, de uma casa-refúgio, um anunciado prostíbulo camarário para prostitutas, onde estas também poderiam praticar sexo pago. Admitindo que esta proposta possa representar uma “forma camuflada de tentar legalizar a prostituição”, considera que é um projeto perigoso e aberto a novas formas de exploração. A pretexto de proteger as mulheres contra a Sida (quem sobretudo protege são os clientes!), pode ao contrário estimular o proxenetismo e o negócio. Os direitos das mulheres à igualdade e os direitos humanos estão sempre no seu horizonte quando equaciona a problemática da prostituição. “A legalização é um atentado aos direitos das mulheres, aos direitos humanos, é completamente perverso legalizar a prostituição”[2] . Conhece todo o argumentário a favor da legalização da prostituição e facilmente o desmonta, baseada na sua experiência acumulada junto das cerca de 8 000 mulheres que acompanhou na Instituição ao longo dos 40 anos em que nela trabalhou e das histórias de vida contadas num ambiente de psicoterapia institucional. Inconformada com a peregrina ideia de que a mulher é livre e tem legitimidade para “vender” o seu corpo, responde “Defendemos uma sociedade onde as mulheres tenham igualdade e agora vamos criar uma situação de subalternização ao homem, conceder ao homem o poder legítimo de comprar uma mulher?” O que existe, nesta situação, isso sim, “É o poder legítimo de o homem querer e poder comprar”. E adianta, “Não conheço nenhuma mulher que goste de ou queira ser prostituta. Não conheço nenhuma família, por muito desorganizada que esteja, que tenha como projecto de vida para os seus filhos serem prostitutas ou prostitutos” [3].
Vivemos numa sociedade em que, apesar dos avanços no campo dos direitos das mulheres, muita gente ainda concorda com uma situação em que a mulher está completamente subalternizada ao homem, é um objecto, um instrumento de prazer. Não há vazio legal. Temos um sistema abolicionista que imperou na Europa durante muitos anos. Porquê este frenesim de alguns países europeus em legalizar a prostituição, afirmando que vão combater o tráfico? É falso, está provado!
Legalizando a prostituição, fomenta-se o tráfico. Há governos que defendem a legalização escudando-se na saúde pública: “Alguns governos pensam que a regularização das casas de passe seria um passo no sentido de maior segurança para a saúde pública”, porém, para Inês Fontinha existe neste argumento um sentido discriminatório, visto apenas as mulheres ficarem sujeitas ao rastreio, para não contaminarem os homens. E ironiza: “A igualdade de género caiu por terra quando a mulher é considerada um objecto”.
Sobre a questão de que quem se prostituir ficará mais protegido se for encarado como trabalhador, Inês Fontinha recusa taxativamente a concepção de que a prostituição é um trabalho e insiste que “vender o corpo” não é um trabalho. Fala-se muito em trabalho digno, mas pergunta-se: Será que isto é um trabalho digno? Defende que se deveria dar um verdadeiro estatuto de vítima a uma prostituta, tal como se deu às mulheres vítimas de violência doméstica, não para as menorizar mas antes para poderem decidir da sua própria vida. A sua desvalorização nas ruas é profunda. Por isso, a ajuda externa é de extrema importância para poder abrir portas, e dizer: há esta possibilidade. O que falta são os apoios necessários para proporcionar reais oportunidades às pessoas.
A luta contra a prostituição como flagelo social, a dedicação total à protecção das mulheres prostituídas e sua reinserção social foi o grande motivo da sua vida. Por esta causa se notabilizou e foi pioneira. Porque esta problematização se impõe nos nossos dias com diversos matizes, replicamos alguns dos seus pensamentos sobre uma realidade que afinal é de muitos milhares de mulheres, e que traduzem seguramente o essencial desta mulher que na primeira pessoa nos conta a sua lancinante experiência.
“Fui aos locais onde as mulheres procuravam os clientes, ruas, bares, casas de passe. Ouvi histórias inabitadas de afectos, de abusos sexuais persistentes pelo pai, pelo padrasto, pelo irmão, por um amigo da família. Escutei a fome, o trabalho infantil, a pobreza que habitou a infância de todas elas. Escutei o sofrimento de corpos desvalorizados pela violência a que foram sujeitos, vi a dissociação/clivagem entre o psicológico e o físico, quando afirmavam “o meu corpo vai para o quarto, mas a minha alma fica de fora”.
Também no 9º Congresso do MDM realizado em Outubro de 2015, confirma perante centenas de mulheres, a sua experiência pessoal: “Acompanhei durante estes longos anos cerca de 8000 mulheres e afirmo com segurança que a prostituição viola severamente a dignidade humana e os Direitos Humanos. É contra a igualdade de género e quem defende a igualdade não pode afirmar que a prostituição é uma forma de a mulher utilizar o seu corpo conforme entender. Não! É uma forma de o homem usar o corpo da mulher como entender (…) Aprendi que a mulher se sente uma “coisa”, um objecto, um utensílio para uso do homem, para satisfazer as suas fantasias ” eu sou reciclável, sou usada e posta de parte (…) Aprendi que o homem cliente é proveniente de todas as classes sociais. O local onde procura a mulher é diferenciado consoante o seu poder de compra. Num hotel ou bar de luxo o cliente tem poder económico e exige que a mulher corresponda ao seu estatuto social, na forma de se vestir, de se comportar. Exige que se confunda com o seu próprio estatuto social. Por isso, quando entrei num bar de luxo vi mulheres que pareciam pertencer a classes sociais com poder económico, mas quando me contaram a sua vida, tinham tido percursos muito semelhantes a de outras mulheres que se prostituíam em outros locais, frequentados por homens/clientes com fracos recursos económicos. Vi, assim, a oferta a adaptar-se à procura.”
“Compreendi que o negócio da prostituição rende ao proxenetismo milhões de euros, porque a prostituição não se reduz a um acto individual de uma pessoa que aluga o seu sexo por dinheiro, é uma organização comercial com dimensões locais, nacionais, internacionais onde existem três parceiros; pessoas prostituídas, proxenetas e clientes.
Aprendi que a prostituição diz sempre respeito à sexualidade… está perante o sexo separado de todo o significado humano, sexo/objecto. Compete-me pôr as minhas dúvidas em relação a esta banalização do sexo (…) Na prostituição todos estes actos íntimos são rebaixados a um nível único – ao de um valor mercantil (…) A sexualidade é vivida como uma procura de prazer á custa do outro. É uma forma de violência”.
Inês Fontinha é uma Mulher de Abril, porque Abril deixou rasto na sua vida e contaminou a sua forma de encarar o mundo.
Ao ouvir na Antena 1 o Postal do Dia que Luís Osório lhe dedicou, tive um sobressalto ao recordar a história de vida de Inês Fontinha, a mulher que mais prostitutas tirou da rua. Hoje, com mais de 80 anos, a sua cabeça é a de uma jovem que continua todos os dias a mudar o mundo um bocadinho que seja.
Fica, para ouvir, o Postal do Dia.
sexta-feira, 11 de outubro de 2024
O núcleo duro do PS
"É quase certo": o governo não gosta é do "preço certo"...
Lido na edição de ontem do Jornal de Notícias.