Como diz o Povo: "é fartar vilanagem".
Riam, mas com moderação...
António Barreto, no Público. Leiam..."Talvez tenham sido
adquiridos em 2006.
Foram seis e terão
começado a chegar a
Portugal em 2008. Um
deixou de trabalhar em
2012. Dois foram para a
manutenção em 2015 e nunca mais
de lá saíram. Três foram postos fora
de serviço em 2018! Entre este
último ano e 2024, data da doação
à Ucrânia, estiveram os seis
helicópteros Kamov encostados,
sem manutenção, nas instalações
do Aeródromo de Ponte de Sor.
Verdade? Quanto custou tudo?
Quanto falta pagar? Quem são os
responsáveis? A partir de certa altura, a
Protecção Civil recusou os Kamov e
não mais quis saber deles. O
Governo ordenou que fossem
entregues à Força Aérea, que exigiu
uma auditoria prévia. Passado um
tempo, a Força Aérea recusou os
Kamov. Depois, foi-lhes retirada
licença de voo. Algures, por volta
de 2020, os helicópteros não
tinham dono. Uma reparação
necessária foi avaliada em 40
milhões de euros. Quase tanto
quanto tinham custado! No total,
entre custo, manutenção,
contratos, reparações e tudo o
resto, os Kamov poderão ter
custado ao Estado português cerca
de 300 a 400 milhões e passaram
os seus últimos anos, em fase
terminal, sem licença e incapazes
de funcionar. Diz-se que, enquanto
estavam imobilizados, o Estado
alugava outros Kamov a outros
países por 5 milhões por ano.
Entretanto, Portugal comprou seis
helicópteros americanos Black
Hawk, em segunda mão, por 43
milhões de euros. Verdade? E
prepara-se ainda para, a preços
incertos e desconhecidos, alugar e
comprar aviões Canadair, não se
sabe se novos, se usados.
A história dos Kamov em
Portugal parece ter terminado.
Parece! Na verdade, ninguém sabe
se sobraram “rabos de palha”,
dívidas por liquidar, compromissos
não respeitados, processos
pendentes, despesas imprevistas
ou juros e comissões em falta.
Esperemos por tudo. De qualquer
maneira, o essencial é conhecido:
os Kamov vieram para combater os
incêndios. Estiveram mais tempo
parados por avaria, impossibilidade
de voar, falta de manutenção e
indisponibilidade de tripulações
habilitadas do que passaram a
trabalhar ou disponíveis.
Os Kamov são um tratado, de
comportamento comercial e
político, inesgotável de
informações sobre o que se não
deve fazer para respeitar os
interesses nacionais. E exaustivo
em lições sobre o que se deve fazer
para aldrabar o Estado, defraudar a
lei e recompensar os
intermediários.
Os Kamov são um manual de
aprendizagem para os doutorandos
em minas e armadilhas, para quem
prepara carreira na gestão de
negócios especiais, para quem se
candidata a assessor de gabinete e
para quem se quer especializar em
transacções nas zonas
crepusculares da democracia e dos
negócios.
Os Kamov são lições práticas
para quem, com boas ou más
intenções, estuda para ingressar
em carreiras da Polícia Judiciária,
dos fiscais de contribuições e
impostos, dos inspectores de
Finanças e das brigadas de
anticorrupção.
Os Kamov são lanterna que
alumia o caminho para perceber as
relações entre Portugal, a União
Soviética, a Rússia e a Ucrânia.
Os Kamov são uma pérola a
revelar alguns traços essenciais da
identidade nacional,
designadamente nas áreas
cinzentas da legalidade, da
transparência e da complacência.
Reconstruir ou estudar a
história dos Kamov em
Portugal é tarefa quase
impossível, digna do
que de melhor se
premeia nas áreas
especializadas do jornalismo, das
relações internacionais e do
comércio paralelo. Percorrem-se os
jornais e os arquivos da televisão e
encontram-se milhares de factos,
de denúncias, de estatísticas. Quase
sempre contraditórias. Por
intermédio dos órgãos de
referência da comunicação e da
informação, não é possível saber o
que se passou. O Estado não
verifica, não controla, não produz
números indiscutíveis. Acusados de
incompetência, interesse,
corrupção, ignorância e covardia,
vários governantes, responsáveis
por todos os actos de vida destes
Kamov em Portugal, escondem-se,
assobiam para o ar, calam,
disfarçam e coçam a cabeça.
Quase todas as fontes referem o
valor de 8 milhões para o preço de
cada Kamov. Isto é, cerca de 48
milhões para o pacote. Os
problemas vêm depois. Prestações,
serviço da dívida, abatimento de
dívidas soviéticas, contratos de
manutenção, aquisição de peças,
comissões de intermediação e
contratos de prestação de serviços
elevam os preços, após 12 anos, a
montantes próximos dos 300 ou
400 milhões de euros. Não se
percebe como. Não há matemática
que resista. Mas é assim. É
certamente um dos mais
escandalosos casos da história
portuguesa. A possibilidade de as
despesas, os prejuízos e as perdas
poderem oscilar entre tão altos
limites não suscita acções e
reacções de investigação e
contestação?
Quantos foram alugados e
comprados? A que preços? Quanto
custaram os serviços financeiros,
de manutenção, de reparação e de
serviço? Quanto falta ainda pagar?
Prestaram serviço proporcional aos
custos? Quanto tempo estiveram os
Kamov imobilizados no solo?
Quanto tempo prestaram
efectivamente serviço? Quantas
horas de voo realizaram? Quem
foram os intermediários,
comissários, auditores, advogados
e outros prestadores de serviços
em todo este negócio?
Os Kamov parecem estar numa
linha tradicional de negócios
particularmente chorudos,
incompetentes, viciados e de más consequências: é uma sequência
fatal de aquisições, alugueres,
trocas, compras e vendas de aviões
de passageiros, aeronaves de luta
contra os incêndios, submarinos,
comboios e catamarãs. De comum
entre eles? O comprador é o
Estado. E há sempre uma zona
escura e um capítulo de dúvida.
Se as autoridades não
esclarecerem este caso dos Kamov,
poderão ser acusadas de má gestão
política. De covardia
governamental que não assume as
suas responsabilidades. De
intervenção ilegítima de agentes e
intermediários. De pagamento de
luvas excessivas. De desatenção
com a manutenção. De desprezo
pela utilidade social dos
equipamentos comprados. De falta
de respeito pelo erário público. De
falta de controlo por entidades
competentes. De falta de
honestidade.
Não há responsáveis? Políticos?
Governantes? Dirigentes de
instituições públicas e de empresas
privadas? Advogados?
Intermediários? Peritos?
Empresários? De uma coisa
podemos estar certos: ninguém se
assume como responsável por
qualquer decisão relativa aos
Kamov durante os últimos 18 anos.
É pelo menos suspeito."