A apresentar mensagens correspondentes à consulta a coisa ordenadas por relevância. Ordenar por data Mostrar todas as mensagens
A apresentar mensagens correspondentes à consulta a coisa ordenadas por relevância. Ordenar por data Mostrar todas as mensagens

segunda-feira, 23 de dezembro de 2019

Aeroporto na região Centro: em 2020 vamos continuar a "ver passar os aviões"...

Recordemos a anedota distrital de 2018:
NOTA -  O jornal é de 30 de Junho de 2018. De há ano e meio, portanto...
Em Novembro de 2019, via RTP/NOTÍCIAS
"O presidente da Câmara da Figueira da Foz, Carlos Monteiro (PS), defendeu ontem um aeroporto na região Centro e disse querer uma decisão sobre a abertura, ou não, da base aérea de Monte Real à aviação civil.

"Defendo Monte Real até ao momento em que alguém me disser que não é solução. Porque falamos de Monte Real e depois vêm dizer que não serve, por causa dos [caças] F-16 e dos `bunkers` dos F-16. Não sendo possível, não podemos andar mais dez anos a falar de Monte Real", argumentou Carlos Monteiro.

Intervindo na reunião do executivo municipal em resposta a uma questão de Ricardo Silva (PSD), que lhe perguntou se defende um aeroporto em Coimbra ou Monte Real, Carlos Monteiro afirmou que é "importante ter um aeroporto na região Centro", posição que partilha com a comunidade intermunicipal da Região de Coimbra.

"Temos tido reuniões intermunicipais e contactos com o novo Governo para pugnarmos sobre um aeroporto para a região Centro. O que está em cima da mesa é acabar ou não com a conversa da abertura de Monte Real [que dura] há 30, 40 ou 50 anos", argumentou.

"Para a Figueira, se [o aeroporto] for em Monte Real é um bom sítio, se for em Coimbra é um bom sítio, se for entre Coimbra e Leiria é um bom sítio", acrescentou o autarca."


Ponto da situação, via Daniel Santos:
"Quem, da minha geração, não assistiu desde tempos remotos, ao argumento de que a região carece de um aeroporto? Começou por ser a Base Aérea de Monte Real, teve um interregno na fase da guerra colonial, foi retomado com veemência depois do 25 de abril (já lá vão 45 anos!) por sucessivos candidatos a autarcas da região. Mudou de lugar, em nome da defesa dos interesses cá do burgo, onde os militares lhe desbravaram os terrenos a sul da actual Zona Industrial da Gala (ainda hoje as terraplanagens se encontram marcadas).
Na falta afinal de aeroporto, o argumento de tal necessidade, voou para Coimbra onde o candidato (depois presidente) garantiu a construção de tal infraestrutura dentro dos limites do seu concelho. E não era qualquer coisa, era internacional, olaré, pois então!
Vejam só! Era em Coimbra, mas os concelhos da região não foram chamados a pronunciar-se! E era internacional e o país nada comentou!
De tempos a tempos, lá volta o assunto à baila. Já anda por aí outra vez, pois então! Provavelmente, na falta de outras promessas mais plausíveis que atraiam economia e gente a esta terra e que se não verifique a prometida perda de população (ver estudos do actual PDM, onde se projeta que a população cá do burgo regresse a números dos anos cinquenta do século passado!) O que aliás se comprova: a população da Figueira regrediu cerca de 3% entre 2011 e 2015.
O modo de prometer o futuro da Figueira é afinal, nesta como noutras questões, o regresso ao passado!
O Sr. Presidente de Coimbra já se safou da promessa: Encomendou um estudo a um universitário que concluiu que o melhor local era afinal.,,, em Soure! Ufa, que já me safei!
Então e nós por cá, na falta de melhor solução, limitamo-nos a reivindicar o aeroporto de Monte Real.
Onde estão afinal os estudos, os números, a justificação, para a necessidade de um aeroporto por aqui perto? É que uma coisa daquelas custa dinheiro! Nosso! E os estudos também! Quem propõe deve justificar para não passar pela vergonha de ter que encomendar um estudo ao Professor Manuel Queiró (ou outro) para que se chegue à conclusão que, afinal, não se justifica.
A montante de qualquer decisão estarão sempre os tais números, as justificações, para que o comum dos mortais perceba se é ou não necessário construir um aeroporto na Região Centro. Mas antes, é necessário criá-la, conforme promete a Constituição da República.
E cuidado, caros autarcas, porque a descentralização em curso não é a mesma coisa. E pode até ser perigosa se o Estado Central alijar a carga toda para os municípios não lhes correspondendo em meios.
E atenção que a CIM não é a mesma coisa. Longe disso. É apenas o local onde os autarcas tratam dos interesses dos seus municípios. Quem defende afinal os interesses da região? É que esta é afinal a única com litoral que definha como o Alentejo. As Áreas Metropolitanas e o Algarve engordam a olhos vistos.
Um conjunto de autarcas a defender a Região em lugar de olhar apenas para o seu umbigo na CIM, é a única solução para, então sim, defender o aeroporto, se for defensável, claro!
Até lá, proponham-se soluções que aumentem o sector secundário para suportar o terciário que cresce como cogumelos!"

sexta-feira, 28 de abril de 2017

Assembleia Municipal de 28 de Abril de 2017

Hoje, a cidadania fez ouvir a sua voz no decorrer da Assembleia Municipal da Figueira da foz.
Oito cidadãos usaram da palavra. Sete para falarem sobre o  PDM e um para abordar o tema do Orçamento Participativo.
O responsável por este blogue foi um deles. Fica a minha intervenção.


Boa tarde a todos.

Não tenho partido, nem religião, nem pertenço a nenhuma sociedade secreta, também não tenho terrenos para urbanizar, nem nunca fui trabalhador, nem tive qualquer familiar a trabalhar na antiga fábrica Alberto Gaspar e, muito menos, tenho interesses no Cabedelo. Dou-me ao incómodo de estar aqui hoje porque acredito que só em Liberdade e com o exercício da cidadania, Portugal e a Figueira poderiam evoluir no sentido do progresso, da democracia e duma sociedade com oportunidades para os cidadãos.

Mas vamos ao concreto que o tempo é escasso.
Em novembro de 2006, em plena reunião de câmara realizada no dia 6, o então vereador PSD Paulo Pereira Coelho, manifestou-se contra a urbanização dos terrenos da Alberto Gaspar. 
Mas, sublinhou na altura, se tiver de ser feita, “que seja a autarquia a ganhar dinheiro a favor dos munícipes”.
Nessa reunião de câmara, o vereador da então maioria Paulo Pereira Coelho mostrou-se contra a alteração do Plano de Urbanização (PU) nos terrenos da Alberto Gaspar, em S. Pedro. 

No essencial, o PS, à época na oposição,  defendeu a mesma posição. 
Em 6 de novembro de 2006, já há dois anos, que os cerca de 70 trabalhadores tinham rescindido os contratos de trabalho com a empresa, alegando salários em atraso.
Passado todo esse tempo a administração da empresa pressionava os políticos com o argumento de que o dinheiro (perto de seis milhões de euros) da alienação dos terrenos a um grupo espanhol, que pretendia construir cerca de mil fogos em altura, era para pagar aos credores, incluindo os antigos trabalhadores. Mas Paulo Pereira Coelho defendia que “a câmara não teve culpa” que a Alberto Gaspar tivesse chegado à situação em que se encontrava.
Se os terrenos (de 12 mil metros quadrados) estão na massa falida, a câmara que vá lá e que os valorize, que os venda e que ganhe dinheiro com eles a favor dos munícipes”, sugeriu Pereira Coelho. 
Isto, no contexto de o antigo presidente  Duarte Silva manter a decisão de avançar com a alteração ao PU, porque Pereira Coelho deixou claro estar contra a transformação de terrenos industriais numa área de “especulação imobiliária”.
Como era óbvio,  a situação dos trabalhadores estava a ser usada como modo de pressionar a câmara de então a tomar decisões.

Agora, em finais de Abril de 2017:
Dado que os terrenos foram cedidos pelo Estado para a implantação de uma indústria, acabada que está a função para a qual os terrenos foram cedidos à Alberto Gaspar, não estará na escritura de venda então feita, salvaguarda uma  cláusula de reversão dos terrenos?

Em 2005, como membro da Direcção de uma instituição de solidariedade desta cidade, assinei uma escritura com o Estado, que vendeu os terrenos à Instituição, onde ficou salvaguardado que aqueles terrenos eram para ser utilizados pelo Centro Social da Cova e Gala para fins sociais. Se a instituição, por qualquer motivo acabar, os terrenos voltam  à posse do estado e não podem ser vendidos pelo actual proprietário, por exemplo, para a especulação imobiliária.

Será justo, depois da forma vergonhosa como foi resolvido em desfavor dos trabalhadores o caso da falência da firma Alberto Gaspar,  que venham a ser os herdeiros do Alberto Gaspar a beneficiar com as mais valias que a transformação de terrenos, que foram cedidos em condições especiais para uso industrial, em terrenos para a especulação imoblilária, vão proporcionar?

Neste executivo camarário, está um membro há quase 8 anos, que antes de estar no poder, tinha uma posição claríssima sobre isto e passo a citar:

Os terrenos foram vendidos a preço muito baixo para a actividade industrial; uma vez abandonada esta, era natural que os terrenos pudessem reverter para os seus proprietários, o Estado e a autarquia” (in Figueira da Foz- Erros do passado, Soluções para o Futuro, pág. 49, obra publicada em Setembro de 2009)

Pergunto: em 8 anos teve alguma iniciativa para ver se a reversão a favor do Estado dos terrenos da firma Alberto Gaspar era possível?
O que vai ser permitido construir nos terrenos da Alberto Gaspar?
Para além da permeabilização dos solos, que é preciso preservar, a falta de inserção do que esteve previsto construir naquela zona (por exemplo, um hotel com 18 pisos...) na malha urbana era evidente, o que tornaria aquele local numa "ilha" na estrutura sociocultural da Aldeia, vai ser impedida?
Isto é importante, porque para alguns o desenvolvimento ainda continua a ser a construção e avanço do betão...

Dado que tenho de terminar a intervenção, peço só mais um minuto de atenção.

Sobre o Cabedelo quero saber tudo. Num dia da outra semana, com o arquitecto Miguel Figueira e o Eurico Gonçalves, fui à junta de freguesia de S. Pedro para tentar ver o Projecto do Cabedelo e não pudemos, pois o presidente não estava e o projecto estava no seu gabinete. Eu pensava que um projecto daqueles, deveria estar acessível, por exemplo exposto no hall de entrada do edifício para análise.
Como não é assim um vulgar cidadão, como eu, só encontra dificuldades... Mas, isso nunca me irá desanimar: a minha vida tem tido sempre muitas dificuldades...  
Tenho dito. 
António Agostinho

_________________________________________________________________________


O discurso que o dr. Delmar Damas não teve a hipótese de concluir na Assembleia Municipal fica aqui na íntegra.
Uma intervenção magnífica hoje na Assembleia Municipal da Figueira da Foz, digna de ser publicada em toda a sua extensão e lida com atenção:

A Urbe Figueirense e o seu desenvolvimento sustentável - Assembleia Municipal de 28 Abril 2017

Senhor Presidente da Assembleia Municipal; Senhoras Deputadas e Senhores Deputados Municipais; Senhor Presidente da Câmara Municipal; Senhoras Vereadoras e Senhores Vereadores, e demais presentes, os meus respeitosos cumprimentos.

A Carta de Aalborg, teve a sua génese na 1ª Conferência Europeia das Cidades e Vilas Sustentáveis, evento ocorrido naquela localidade dinamarquesa em Maio de 1994, e traduz-se numa Campanha para a real vinculação política das autoridades locais na adopção de políticas de desenvolvimento sustentável das cidades, vilas e comunidades rurais, a fim de se comprometerem com as melhores práticas para a sustentabilidade do ambiente da urbe, reflectindo e fazendo intercâmbio de experiências para que sirvam para a elaboração de recomendações que possam influir nas políticas europeias de desenvolvimento sustentável local. Como objectivos, pretendia-se uma reflexão séria e responsável das autoridades locais sobre, por exemplo:

- economia urbana com a conservação do seu capital natural;

- correcto ordenamento do território;
- mobilidade urbana;
- a equidade;
 - participação das comunidades locais nas tomadas de decisão e alcance de consensos;
- conservação da natureza, etc.

Por capital natural, entende-se, mais do que o conjunto dos recursos naturais, o valor que a natureza tem para as comunidades.

A ela aderiu o Município da Figueira da Foz em Agosto de 1996.

A 8 de Outubro de 1996, no âmbito da 2ª Conferência Europeia das Cidades e Vilas Sustentáveis, que teve lugar na nossa capital, surge o “Plano de Acção de Lisboa: da Carta à Acção”, visando a aplicação efectiva da referida Carta de Aalborg, passando-se da fase da reflexão para a fase da concretização, lançando-se a Agenda Local 21.

Isto para dizer que as autoridades do município da Figueira da Foz estão comprometidas com as boas práticas da gestão urbana no que concerne à observância dos objectivos da Carta de Aalborg.

Ora bem, as autoridades dos municípios que aderiram, em especial as nossas, não podem fazer letra morta destes objectivos e seus compromissos numa rede de comunidades europeias. Razão pela qual, entre nós, as autoridades locais criaram o Plano Estratégico de Desenvolvimento da Figueira da Foz, que incorpora aqueles objectivos.
Hoje, que discutimos as alterações ao PDM, instrumento magno da gestão do ordenamento do território municipal, não podemos ficar insensíveis a decisões de gestão local que causam polémica e fricção com as comunidades locais e sobre as quais, pela sua dimensão e consequências, não há possibilidade de consensos e põem em causa a economia da cidade e seu capital natural; o correcto ordenamento do território e a conservação da natureza. Numa frase: o seu desenvolvimento sustentável.
Considerando que no fulcro do desenvolvimento sustentável estão as comunidades locais e sua relação harmoniosa com o seu espaço local, constatamos que se nas comunidades rurais, por hoje existir saneamento básico nas mesmas, resulta polémica e de nenhuma compreensão a quase impossibilidade de os filhos construírem as suas casas nas localidades onde nasceram e onde viveram com seus pais, e onde têm terrenos, empurrando-os para as freguesias urbanas, repletas de construção vazia, e contribuindo para a desertificação das rurais, já de si envelhecidas e desmotivadas nos projectos agrícolas; por outro lado, temos que considerar, na civitas, stricto sensu, atento os graves erros urbanísticos do passado com a edificação urbana, a necessidade de preservação de espaços verdes para fruição pública, de relevante importância, como é o caso do tão falado e vetusto “Corredor Verde”, que vai desde o Jardim, junto à foz do Mondego, seguindo pelas Abadias até ao Parque de Campismo e deste à Serra da Boa Viagem.
Lembro que aquando do terrível incêndio ocorrido no Verão do longínquo ano de 1993, em que ardeu a Serra da Boa Viagem, deixando uma mancha cinzenta no chão, onde subsistiam em pé medonhos espectros negros do que foram árvores, surgiu em defesa da sua reflorestação o Movimento Serra Verde, de que tenho o grato prazer de ter sido um dos seus fundadores. Tivemos, conjuntamente com toda a comunidade local, uma actuação relevante até em pedagogia, com milhares de crianças, das diversas escolas do nosso concelho, a deslocarem-se à Serra e a participar, durante vários dias, na sua reflorestação; e o mais gratificante foi ver depois esses alunos (hoje mulheres e homens feitos e com memória!) a voltar lá aos fins-de-semana com os pais, levando água e regando, num compromisso tocante com a Natureza. Hoje está lá uma enorme mancha de pinheiros e uma pedra comemorativa do evento.
Em 1997 voltámos para defender o espaço do Parque de Campismo e Horto Municipal que o Executivo de então pretendia alienar para construção, o que foi evitado pela oposição enérgica de milhares de munícipes numa petição então apresentada e que teve também por grande impulsionador o meu amigo e Colega Dr. Luís Pena, entre outros, Colegas e amigos que também a assinaram. Lembro-me que na altura surgiu a candidatura de Santana Lopes que, colando-se a esse movimento de oposição, defendeu publicamente a manutenção daquela área; porém, depois das eleições ganhas, veio defender, através da sua Vereadora Rosário Águas, que não fazia sentido um parque de campismo no meio da cidade, demonstrando interesse em o alienar… adivinhámos que para construção! Na altura era o vibrante “Linha do Oeste” o nosso “combóio” que nos levava na pulsante viagem contestatária, e onde publiquei, em resposta, um extenso artigo de opinião dirigido ao Chefe do Executivo lembrando-o que o que estava em causa não era a existência ou não de um parque de campismo no meio da cidade (o qual poderia estar noutro lado qualquer), mas a preservação daquele espaço arbóreo intacto para fruição pública, como Parque da Cidade ou outra valência ecológica. A “coisa” ficou por ali, mas a tentativa ficou registada.
Em 2007, face à possibilidade de aptidão construtiva, nova petição, também com milhares de assinaturas, desta feita a requerer, na revisão do PDM, a preservação de todo o espaço envolvente do parque de campismo: o próprio parque, o prédio confinante a Norte/Nascente, e o Horto Municipal.
Hoje, 2017, tudo se repete. Conclui-se que os anos terminados em 7, e num ciclo de 10 em 10 anos, são funestos para o espaço do parque de campismo e áreas contíguas.
Hoje temos a singular, insólita e paradoxal particularidade de termos signatários dessas petições no actual Executivo que, entretanto, entendem que as circunstâncias se alteraram e se justifica o sacrifício de “uma dentada” no Horto, pois que é essencial que assim seja em prol do desenvolvimento económico do nosso concelho. E explicam: O Jumbo tem necessidade de se alargar, não tem para onde, e quer trazer aquilo que hoje muito avançadamente chamam de “lojas âncora”. Ou seja, lojas de marcas mundialmente famosas que, na óptica do Executivo e de quem o convenceu da ideia, atraem à nossa cidade clientes de outras bandas e fixam (daí o nome âncora) os de cá, que, deste modo, não vão fazer compras a outros lugares fora do concelho. Isto cria riqueza na economia local e estima-se que se crie, por consequência directa, cerca de 2.000 postos de trabalho.
São estes os argumentos, grosso modo, para o sacrifício do perseguido Horto Municipal. Perseguido e sacrificado, pois aquando da construção do Jumbo já havia levada uma “dentadinha”. Pelo que, com mais esta dentada que pretendem dar, estamos bem em crer que o pobre Horto de perseguido e sacrificado passará, definitivamente, a finado. Daí a dar-se uma dentadinha no parque de campismo é coisa de tempo, não importando que Executivo, e bem se vê onde tudo irá parar.
Eu compreendo o argumento do Executivo, e todos nós o percebemos e, secretamente e num primeiro impulso, até somos levados a concordar. É que isto de 2.000 empregos, numa terra onde há míngua de trabalho e nesta crise que atravessamos, a uma dentadinha, ou mesmo uma dentada mais saciante, nós, olhando cumplicemente para o lado, nem sentíamos… e apenas lhe desejávamos ao Horto uma morte serena, indolor.
O problema é que o argumento não é sério!
Ninguém acredita que se criem 2.000 postos de trabalho. Isso é uma falácia, uma impossibilidade lógica. Se fosse a Mega Tesla a instalar-se no Horto ainda vá que não vá, mas não o Jumbo, pois se com aquela superfície toda já em funcionamento nem de perto nem de longe os emprega, como se daria esse milagre no Horto? Onde estão os estudos que o comprovam?
Se calhar nem 200, nem 100, muito provavelmente.
Quando eu digo que o argumento não é sério vale dizer que o argumento não é válido. Mas isto não implica, de modo nenhum, que o Executivo que o apresenta não seja sério. É sério, com certeza. Mas o Executivo não tem experiência empresarial; não domina as rebuscadas técnicas do mercado da construção civil, do interesse imobiliário das grandes superfícies. O Executivo está, e bem, mais preocupado em gerir, da melhor forma possível, a coisa pública. O Executivo, naturalmente, quer o bem do seu concelho. O Executivo, qualquer Executivo, quereria um investimento para o seu concelho que gerasse 2.000 empregos. Isso é o sonho de qualquer Executivo camarário. Pelo que compreendo que, numa abordagem, ao incutirem no Executivo a possibilidade de, com um investimento desses, se criarem 2.000 empregos, este, de boa-fé, se entusiasmasse a tal ponto que até antigos e férreos defensores do Horto, ora Vereadores aqui presentes, agora entendam que uma “dentada” a mais ou a menos pouca diferença fará, que diacho. Venham os empregos! E, já no reino da semântica, das palavras que permitem defender com toda a elegância e convicção uma coisa e o seu contrário, numa aperaltada argumentária desculpante, já dirão que, afinal, não passa de um horto, meio enfezado até, e nem há já jardineiros municipais para dele cuidar, e tem lá uns armazéns feios e um canil degradado, uma coisa pavorosa. Um bem de Deus que desaparecesse, que assim não definhava tanto e ia num sopro. Leve-o Deus.
Todos nós compreendemos o legítimo entusiasmo do Executivo e, portanto, também compreendemos que, levado por aquele equívoco, lhe queira dar capacidade construtiva nesta revisão do PDM. Mas, não se deixe o Executivo arrastar nesta ilusão dos 2.000 empregos que mais se tornou numa questão de fé, de ingénua crença, do que propriamente algo objectivo e que lhe toldou o espírito. Que faça uma pausa para reflexão, uma fria pausa, para que arrefeça no entusiasmo, e peça (nem era preciso tanto!) a um economista da câmara que faça as contas dos empregos, sob pena de continuarmos a olhar para o Executivo com a mesma postura com que se olhou para o célebre e embaraçante momento em que o Eng. António Guterres, atrapalhadinho com os cálculos que o teimavam em afligir recusando-se a vir à luz do dia, pois por vezes os números são mais matreiros que as palavras, soltou a aliviante e gaguejante expressão que ficou para a história: “Bem... é…é… é só fazer as contas.”
Melhor fora que subisse o Jumbo em altura, sendo que mais um piso em nada destoava e muito menos comparando com o que destoaria o acimentar do Horto. E se o argumento for o do PDM o não permitir, então melhor fora que se propusesse a sua alteração nesse particular. Assim tudo se resolvia a contento de todos.

Os poucos espaços verdes existentes na urbe são de preservar! Ainda ontem o nosso caríssimo amigo Engº Daniel Santos, na sua intervenção no debate sobre o PDM, promovido pela Associação FigueiraViva, dizia que, por princípio, era a favor da preservação dos poucos espaços verdes ainda existentes na cidade, até como forma de compensação pelos graves erros urbanísticos cometidos no passado. E quanto ao Horto, não abdicando desse mesmo princípio de preservação, referiu que só se sabendo previamente o que para lá se pretendia fazer e que área ocupava é que se poderia avaliar da justificação ou não do seu sacrifício. E este é um dos erros do actual Executivo: previamente não nos diz nem que área nem o que concretamente ali se pretende ao certo fazer, de modo a se avaliar, com clareza, da justificação do seu sacrifício. Pelo que, ao se inserir o Horto, na actual revisão do PDM, em área com capacidade construtiva, é passar-se um cheque em branco para se usar quando e como bem se entender. E isso, com todo o respeito e com toda a frontalidade, não pode ser! E não pode ser porque se assim fosse se desvirtuava a relação de confiança com a comunidade. Ninguém deve passar cheques em branco a ninguém. É uma questão de mero bom senso e prudência. E ninguém de bem pode querer aceitar cheques em branco de quem quer que seja, pois a honradez lho impede.

Resultou ainda, desse debate de discussão do PDM, o apontamento de uma exagerada malha de grandes superfícies comercias na periferia da urbe, justificando-se mais a aposta do comércio, mesmo o das grandes superfícies como é o caso do Jumbo, no coração da cidade, o qual anda deserto, esquecido, degradado, e já não bate.

O Horto, esse invulgar espaço verde, campo de cíclicas contendas e que vive em permanente sobressalto, para o qual alguns olham, quais “lagartas” cheias de larica, com irresistível vontade de o dentar, deve ser considerado para futuro, e de modo definitivo, como parte integrante da área do Parque de Campismo, e este da grande área do “Corredor Verde”. Mantendo-se um grande espaço verde necessário ao bem-estar da comunidade que, após a destruição do Pinhal Sotto Mayor e agora a extinção da emblemática Quinta de Santa Catarina e sua extensão a Nascente, vê nesse “Corredor” o símbolo de uma natureza mínima presente numa cidade de betão, cada vez mais descaracterizada e de tantos prédios vazios que, pelo menos, manteria assim o resquício dos objectivos assumidos na Carta de Aalborg que se voltam aqui a lembrar, por nunca ser demais fazê-lo:

- economia urbana com a conservação do seu capital natural;

- correcto ordenamento do território;

- equidade;

- participação das comunidades locais nas tomadas de decisão e alcance de consensos;
- conservação da natureza.
Senhor Presidente da Assembleia Municipal; Senhoras Deputadas e Senhores Deputados Municipais; Senhor Presidente da Câmara Municipal; Senhoras Vereadoras e Senhores Vereadores, e demais presentes,
termino dizendo que, na reunião de Câmara de 17 de Abril de 2017, o meu amigo e Colega Dr. Luís Pena, na sua intervenção chamava a esta casa a “Casa da Democracia”. Eu não tenho esse seu agudo espírito político/filosófico, sou mais do género contemplativo, pelo que a chamaria, no objecto desta minha intervenção, de “Casa do Silêncio”. Do Silêncio porque tantas vezes aqui se decide o destino de tanta coisa que não tem, nem ninguém lhe dá voz, mas que a deveria ter. E só percebemos que há coisas que não têm voz mas a deveriam ter, quando, superando a azáfama anestesiante do nosso dia-a-dia, tivermos a capacidade, por exemplo, de parar e olhar em nosso redor. Veríamos a natureza fascinante que, já em tão poucos redutos, ainda subsiste na nossa cidade de betão e cada vez mais abandonada de gente que parte por, lamentavelmente, não haver o que cá a fixe. Reparem nas árvores verdejantes, nas flores que despontam na força maternal da Primavera; nos pássaros que agora nidificam e enchem os nossos céus de chilreios e movimentos de vida graciosos; reparem no pequeno corgo que passa pelas Abadias como um fino espelho onde o céu se reflecte e as aves saciam a sua sede e as libelinhas pairam com asas de finas rendas e as rãs coaxam.
Quando acordamos das nossas vidas agitadas deparamo-nos com um mundo mágico que sempre esteve ao nosso lado… mas que já não temos a capacidade de o ver.
Sabem que tudo isto vive e não tem aqui voz?!
A voz que tem é apenas a dos milhares que ao longo de décadas o têm defendido.
Quantas petições entraram nesta casa com 4.000 assinaturas? Quantas?!
Percebem, então, a importância “espiritual”, chamemos-lhe assim, que este mundo mágico representa para tanta gente?!
Hoje, eu trouxe-vos a esta “Casa do Silêncio” a voz desse mundo mágico e das vozes dos ausentes que sempre o defenderam. Hoje, vocês ficam com a responsabilidade de cuidar ou destruir esse mundo.
Lembrem-se que é de mundos mágicos que nascem os sonhos das nossas crianças. De crianças que também os ajudaram a criar (recordo aquelas milhares da Serra da Boa Viagem!) e hoje, já adultos, talvez pais, esperam de vós que tenham a coragem de permitir que as nossas crianças continuem a sonhar. A sonhar na nossa cidade!
Cabe-vos a vós decidir enviar para o Horto Municipal ou um jardineiro, que dele cuide, ou uma máquina que a ele o arrase.
Despeço-me, pedindo a cada um de vós que hoje, se possível, no you tube, vejam o pequeno filme sobre um livro infantil de José Saramago chamado “A Maior Flor do Mundo”. Compreenderão o espírito desta minha intervenção e o quanto é necessário salvaguardar todos estes preciosos e já poucos espaços verdes que referi, de um mundo de apetência desenfreada pelo estéril betão que nos esmaga e acinzenta… porque nos rouba os sonhos!
Encheu-me de esperança a recente deliberação da Assembleia de Freguesia de Buarcos e S. Julião, a uma proposta apresentada, sem nenhum voto contra, no sentido de que “toda a área que compõe o Horto Municipal e terrenos adjacentes a norte/poente do Parque de Campismo seja afecta e integrada no terreno do Parque de Campismo”.
Ou seja, aquilo que, afinal tanta gente vem defendendo há mais de 20 anos; gente que mostra assim coerência. Coerência que, para outros já moldados pelo implacável Tempo, e que eu, apesar disso, muito estimo, não passará, erradamente, de mera obstinação.
Dizia então, em extracto da acta de Reunião de Câmara Municipal de 06/06/2008, um nosso muito querido e estimado Vereador, aqui presente, relativamente ao Horto: “A educação das crianças e jovens faz-se cada vez mais em espaços fechados, fora dos ambientes naturais e na ausência duma sã conjugação com a natureza; Por esta razão, a natureza está cada vez mais distante dos espaços de aprendizagem e convívio, dando lugar a outros, mais artificiais e mais desumanos; proximidade da natureza e a educação ambiental são assim um imperativo da formação das crianças e dos jovens, sobretudo daqueles que crescem e vivem dentro dos espaços urbanos. Percepcionar os ciclos de vida e a dependência e ligação do homem a estes, contribui para a construção de seres mais sensibilizados para a real posição do ser humano no planeta.
Assim, com os objectivos e nos termos abaixo indicados, os Vereadores do Partido Socialista propõem a esta Câmara a criação de uma horta/quinta pedagógica a funcionar no local do actual Horto Municipal. Com esta proposta, o Horto passa a ter uma nova valência, permitindo retirar do seu funcionamento uma mais-valia acrescentada que, de outra forma, se perderia. A sua situação privilegiada e o know-how que já detém, fazem dele o local por excelência dos objectivos que se pretendem atingir.
Ao mesmo tempo, os professores e a comunidade educativa em geral têm necessidade de um laboratório desta índole, pois está-se perante uma valência educativa e uma infra-estrutura com uma funcionalidade que hoje inexistem;
O Horto Municipal e a Horta/Quinta Pedagógica prestarão também um serviço até agora inexistente, estando abertos e disponíveis para as horas de lazer das famílias”.

Senhor Vereador, Senhor Vereador… isso que disse e defendeu é Belo, é isso mesmo que sempre e agora defendemos. O Belo é imutável, é eterno, é intemporal… e carente de defesa constante! Quem lhe abandona a defesa?!

Saibam, que contra o Belo não se vence; perde-se mesmo vencendo!
Bem-haja.
Delmar Damas

segunda-feira, 28 de setembro de 2020

Como se degrada a democracia...

O que se passou na Junta de Quiaios, foi um caso de polícia que seguiu para julgamento em tribunal.

Em 6 de Dezembro de 2019, a presidente da Junta de Freguesia de Quiaios,  Maria Fernanda Lorigo, e o secretário, Carlos Alberto Patrão, foram condenados pela prática de um crime de prevaricação de titular de cargo público a penas de prisão, suspensas, e à perda de mandato. À ex-tesoureira, Ana Raquel Correia, também foi decretada uma pena de prisão suspensa.

Os três arguidos foram julgados por terem favorecido o pai da autarca, Manuel Lorigo, para que este fizesse os serviços de manutenção das Piscinas da Praia de Quiaios. O tribunal considerou que Fernanda Lorigo foi quem teve “o papel mais activo” e aplicou-lhe uma pena de três anos e nove meses de prisão. Já Carlos Patrão foi condenado a dois anos e 10 meses e Ana Correia a dois anos e seis meses de prisão. Todas as penas foram suspensas por igual período.

Os três arguidos terão ainda de pagar ao Estado 8.700 euros em partes iguais.

Fernanda Lorigo recorreu para o Tribunal da Relação de Coimbra que confirmou a decisão da primeira instância e obrigou a presidente da Junta de Quiaios, Fernanda Lorigo, a perder o mandato, com efeitos a partir do passado 25 de Setembro, dia em que foi notificada sobre a decisão do acórdão.


A Juventude Socialista e Concelhia tiveram a reação que a imagem mostra. A banalidade destas solidariedades partidárias, impressiona. O exemplo deveria, em princípio, vir de cima. Perante uma sentença judicial, cai pela base qualquer argumentação a propósito de legitimidade democrática que permite aos partidos e aos políticos, comportarem-se deste modo vergonhoso. Isto não é populista, nem contra os partidos. Muito menos sou apologista de regimes sem partidos. Só gostava era de ver concretizado, na prática, que os partidos, neste caso concreto o PS, respeitam as regras democráticas da separação dos poderes. A primeira característica da ética é a lealdade. Não confundir com fidelidade porque essa é uma característica dos cães. 


Este, foi mais dos casos de polícia envolvendo personalidades que se tornaram conhecidas por via da política.

Isto tem acontecido, sobretudo nos dois partidos do chamado arco da governação, PS e PSD, e no agora quase moribundo  CDS.

Na guerrilha política, os partidos usam esses casos. É o que está acontecer na Figueira.

Neste caso da presidente de Quiaios foi destituída pelo Tribunal. Nem sequer está em causa se as acusações e suspeitas são ou não são verdadeiras, estão ou não  provadas, nem esquecer a presunção da inocência. 

O Tribunal julgou e aplicou a pena.

O  que interessa, neste momento, é que o Tribunal condenou comportamentos eticamente inaceitáveis. Neste caso houve condenação. Logo, a meu ver, o PS foi atingido, pois tem responsabilidades. Os partidos políticos individual e colectivamente têm responsabilidade naquilo que de ilegal fazem alguns dos seus altos dirigentes, em particular nos crimes que envolvem o exercício do poder, ou a influência adquirida pelo poder, porque não criaram no seu seio uma cultura de intransigência face a estes crimes, principalmente com todas as formas de tráfico de influência e corrupção, e convivem sem dificuldades com práticas que dão origem a verdadeiras carreiras, com algumas a desembocar no crime.


No actual estado de degradação das estruturas partidárias, em que a militância desinteressada e a adesão político-ideológica é quase irrelevante em relação à carreira no aparelho partidário, os partidos no seu interior são verdadeiras escolas de tráfico de influência, de práticas pouco democráticas como os sindicatos de voto, de caciquismo, de fraudes eleitorais, de corrupção. 

Um jovem que chegue hoje a um partido político por via das "jotas" entra numa secção e encontra imediatamente um mundo de conflitos internos em que as partes o vão tentar arregimentar. Quando entra, ele pode esperar vir para fazer política, mas vai imediatamente para um contínuo e duro confronto entre uma ou outra lista para delegados a um congresso, para a presidência de uma secção, para uma assembleia distrital, em que os que já lá estão coleccionaram uma soma de ódios. Ele entra para um mundo de confrontação pelos lugares, que se torna imediatamente obsessivo. Não se fala doutra coisa, não se faz outra coisa do que procurar "protagonismo" e "espaço político".

Se  tem apetência para este tipo de vida, passa a ter uma sucessão de reuniões e começa a pertencer a uma qualquer tribo, herdando os conflitos dos dirigentes dessa tribo e participando do tráfico de lugares e promessas e expectativas de carreira. Não lhe custa muito perceber que neste meio circulam várias possibilidades de ter funções cujo estatuto, salário e poder são muito maiores e com menos dificuldades do que se tiver que competir no mercado do trabalho, e tiver que melhorar as suas qualificações com estudos e cursos mais árduos. Por via partidária, ele acede à possibilidade de ser muita coisa: por exemplo,  presidente de junta, assessor, entrar para uma empresa municipalizada, ir para os lugares do Estado que as estruturas partidárias consideram "seus" como sejam as administrações regionais de saúde, hospitais, escolares, da segurança social. Etc...

Tudo isto ainda na faixa dos vinte, trinta anos. O grosso da sua actividade tem a ver com um contínuo entre o poder no partido e o poder na câmara municipal, ou no governo, um alimentando o outro. Com a ascensão na carreira, tornou-se ele próprio um chefe de tribo. Pode empregar, fazer favores, patrocinar negócios, e inicia-se quase sempre aqui no financiamento partidário e no perigoso jogo de influências que ele move. Como dirigente partidário ele é o chefe de um grupo que dele depende e que o apoia ou ataca em função dos resultados que tiver, em apoios, prebendas, lugares, empregos, oportunidades de negócios. 


Depois é sempre a somar. Entretanto, já se habituou a ter carro, telemóvel, almoços pagos... Paga do seu bolso muito pouca coisa e conhece todas as formas de viver com o dispêndio do menor esforço. O seu prestígio social é nulo. Contudo, o seu poder partidário cresceu. Entra nos combates partidários a favor dos seus e aliando-se com outros que considera de confiança, ou seja gente com o mesmo perfil. Como sabe que o seu "protagonismo" vem do seu poder interno, é a esse poder que dá a máxima atenção. Distribui favores. E quem quiser um favor tem que falar com ele no seu território. 

O seu sentimento de arrogância e de impunidade cresce... 

Até um dia. E é nessa altura que alguns, muito, muito poucos, caem de um dia para o outro, embora ainda menos sejam condenados. E alguns deles, os mais populistas, ainda conseguem voltar a eleger-se, mantendo os mecanismos do seu poder. A justiça conta pouco, mas, de vez em quando, há um acidente de percurso.

E é assim, como se viu a propósito do caso de Quiaios, e as reações corporativistas e de tribo, que se degrada a democracia.

sexta-feira, 25 de outubro de 2013

Porquê tanta preocupação com a “coisa” - manter alguns dossiês fora do conhecimento público?..

Tal como exprimi,  logo que de tal tomei conhecimento, “assim, a frio, a coisa pareceu-me desagradável...”
E a “coisa” é a seguinte: o presidente da Câmara da Figueira da Foz, Dr. João Ataíde, um independente eleito numa lista do PS anunciou, ontem, que os jornalistas e o público só podem estar presentes na segunda reunião de câmara do mês.
Para justificar tal tomada de posição, o dr. João Ataíde recorreu à lei e à necessidade de reserva que alguns assuntos merecem para interromper uma prática que vigorava nesta autarquia desde Abril de 1974.
Acresce ainda que as reuniões sem público e sem jornalistas,  também não podem ser transmitidas pela internet, como acontecia até aqui -  e desde 2013.
Aliás, ontem, embora pelo menos estivessem jornalistas presentes, a reunião não foi transmitida pela internet.
O presidente da câmara frisou que a medida é aplicada, por enquanto, a título provisório e  garantiu que serão enviadas notas de imprensa sobre os assuntos deliberados nas reuniões sem a presença de jornalistas.
Miguel Almeida, líder da oposição (PSD), manifestou discordância: “vai exigir da parte dos vereadores algum cuidado, para não transformarmos o que se passou na reunião, através de fugas de informação, no que não se passou. Parece-me que vamos ter muitas reuniões de câmara nos jornais…”.
A proposta foi aprovada com os votos do PS.
No PSD houve duas abstenções (Azenha Gomes e João Armando Gonçalves. Anabela Tabaçó não participou nesta sessão) e um voto contra, o de Miguel Almeida.
Esta é a “coisa”.  Sobram as minhas inquietações.
Ao tomar esta atitude, a maioria absoluta que passou a gerir os destinos da Figueira desde 29 de setembro último, a meu ver, prepara-se para  não trazer para as reuniões públicas de câmara os assuntos mais importantes para os figueirenses.
Só pode ser por isso. Como diz o povo, “o segredo passa a ser a alma do negócio”, pois a regra geral, passará a ser que  as matérias importantes passem a ser aprovadas nas reuniões de câmara à porta fechada.
Se não fosse para manter alguns dossiês longe dos holofotes e do conhecimento público porquê tanta preocupação com o  secretismo por parte do Presidente João Ataíde?

segunda-feira, 21 de dezembro de 2015

Balanço final de 4 páginas de jornal, baseado nas declarações do presidente da junta de freguesia de S. Pedro

Depois de nos últimos dias termos vindo a tentar focar, por temas, as declarações do senhor António Salgueiro, presidente da Junta de Freguesia de S. Pedro, concedidas ao jornal AS Beiras na passada quarta-feira, o saldo final resume-se assim: o senhor Presidente da Junta de S. Pedro perdeu uma excelente oportunidade de permanecer calado.
Resumindo: de novo, nada foi dito.
A única "vantagem" foi esta: para quem não o conhecia, ficou a conhecê-lo um pouco melhor. Isto é: constatou o vazio de conteúdo que patenteou, e não pelo que, em substância, foi dito efectivamente.
Dá vontade de deixar escrito. 
Ganda presidente! 
Não só pelo conteúdo das declarações, mas ainda mais pelo ar cândido e forma displicente, como se gastou em 4 páginas de jornal, sem dizer coisa nenhuma!...
Para quem mostrou ambição política (o que não é negativo), com menos de 2 anos anos já para cumprir deste mandato e, depois de uma já longa carreira política, algo maior e de relevância, haveria a esperar
Ficou por  conhecer o essencial: a visão e a estratégia do desenvolvimento global, sustentado e planeado que, presumo, deverá ter para a freguesia de S. Pedro
As suas respostas, porém, conseguiram o desiderato: deixaram a nu e ilustram, sem sofismas, a atenção (ou melhor: a falta dela...) que os executivos municipais presididos por João Ataíde têm dispensado à nossa freguesia - nenhuma!
As pequenas freguesias, para quem não tem qualquer visão de desenvolvimento global, são apenas uma chatice que é necessário contornar, de quatro em quatro anos.

Pena, foi ter-se perdido uma excelente oportunidade de esclarecer a população da freguesia da margem sul do Mondego e ter optado por divagações e linguagem truncada de conotação aparentemente jocosa, mas, efectivamente bélica, referindo-se a inimigos imaginários, coisa  pouco inteligente para um político que ambiciona ainda construir uma carreira – apesar de estar na política activa há 30 anos

Devo confessar a surpresa com que verifiquei os remoques deixados nas declarações do presidente da junta, a quem, apenas, com lealdade, de alma aberta e transparente e sentido de servir a sua Terra, a sua solicitação, se prontificou colaborar com ele.
Apesar do reconhecimento da boa razão do “alerta costeiro”, entendeu que a forma era mais importante do que o conteúdo, e acabou por espalhar-se ao comprido, deixando pelo caminho, em diversos sectores da vida local, concelhia, distrital e até nacional, um suave perfume a ridículo, que o vai perseguir pela vida política que ainda lhe resta.

Na questão da erosão costeira, não fora a acção de alguma gente, e S. Pedro estaria numa situação ainda mais complicada. V. Exa. está há cerca de 30 ano ligado a uma lista de poder e a sua acção, neste caso, como em outros, tem sido tão só de colaboracionismo com o poder político figueirense.
foto sacada daqui
Nunca ouvi uma só palavra da sua parte a confrontar, quem de direito, com o problema que acabou de se agravar e consumar com o prolongamento dos tais 400 metros no molhe norte: a erosão costeira a sul e o perigo nas entradas e saídas da barra de muitos filhos da nossa Terra que têm de arriscar a vida para conseguir o pão para a família. 
Penso que ainda todos temos presente a sua intervenção no recente drama do naufrágio do Olívia Ribau: limitou-se a acompanhar, mudo, quedo e calado, o presidente da câmara no papel de "emplastro".
Assim como nunca ouvi da sua parte -  a Assembleia Municipal, realizada na passada segunda-feira, constituiu uma excelente oportunidade que foi desperdiçada, naquele órgão autárquico: num assunto que tem a ver directamente com a freguesia de que é presidente, o seu silêncio foi ensurdecedor... uma palavra sobre o caso do estacionamento do parque do hospital e as graves questões de operacionlidade para os veículos prioritários e de emergência no acesso a este estabelecimento hospitalar, que foram levadas à discussão pública.

Tal, como acontece desde 1990, ao arrepio da necessidade e dos princípios que estiveram na origem da sua constituição, em 1985,  o grupo de que emana o poder que tem definido a linha de rumo de S. Pedro, limita-se a tentar ter as melhores relações com quem está conjunturalmente e exerce o poder na Figueira. Dessa subserviência, ditada por favores, pessoais ou familiares, obtidos ao longo dos anos por certos membros da lista de que faz parte, os resultados estão à vista. 
Para simplificar, basta verificar as condições em que a juventude da nossa freguesia pratica desporto. Neste momento, o Grupo Desportivo Cova -Gala é a única equipa distrital que participa na divisão de honra com um campo peladoAlém de uma vergonha, é uma ameaça à integridade física dos atletas que são obrigados a participar num jogo de futebol, a contar para a prova rainha da AFC nas condições vergonhosas em que o Clube que representa a nossa Terra, por falta de apoios ao longo dos últimos 15 anos, tem para o fazer.

Quanto ao problema de fundo que me move, é  apenas este: gostaria que muitos outros cidadãos desta nossa pequena Aldeia, aspirassem e exigissem a viver numa terra mais digna, desenvolvida, capaz de garantir habitabilidade e emprego aos seus filhos - coisa que, até ao presente, não foi conseguida. 
Salvaram-se algumas, poucas, excepções. Daí, termos ainda por cá, 41 anos depois de Abril de 1974, reminiscências de um caciquismo místico, seráfico e serôdio.

De resto, a constatação há muito feita, de que esta presidência da autarquia figueirense despreza as pequenas freguesias, não chega para justificar a situação a que se deixou chegar esta Aldeia – ver, por exemplo, o abandono a que deixaram chegar as nossas “excelentes” praias
Em certas zonas, mais parece que estamos no terceiro mundo...
Já sei que a responsabilidade será de todos, logo, de ninguém. Mas, seguramente que será necessário gente nova, outra gente, que saiba traçar metas de desenvolvimento, que determinem planos e prazos de execução.
No fundo, que se disponha a governar no interesse do colectivo - e não governar-se a si e aos seus - para que algo mude.

quinta-feira, 12 de março de 2020

Vale a pena ler

POSTAL DO DIA, via Luís Osório

Sobre o Coronavírus e sobre nós

1.
"Manuel Luís Goucha e o marido partilharam alguns vídeos da sua viagem à Áustria e (creio) a Londres. Em dois curtos registos brincaram com o Coronavírus – num caso “gozando” com os chineses e no outro com um homem que adormecera no avião.
A cobertura noticiosa sobre esta pandemia tem sido desigual. Nuns casos muito boa, noutros superficial e noutros sensacionalista. Para vários meios, sobretudo televisivos, o que conta é a voragem. Quantos casos, se já há mortes, quais os erros, qual a pergunta mais implacável que podemos fazer, etc.
Ontem, na praia de Carcavelos estiveram centenas de pessoas. Umas em cima das outras aproveitavam o maravilhoso tempo e relaxavam.
Já hoje, Joaquim Miranda Sarmento, homem das finanças de Rui Rio, numa entrevista ao Público afirmou qualquer coisa como isto: agora é que vamos ver se Mário Centeno é ou não o Ronaldo das Finanças.
2.
Os quatro “acontecimentos” estão mais ligados do que parecem.
Manuel Luís Goucha é uma estrela de televisão. Há mais de trinta anos que apresenta diariamente programas em que as pessoas e os seus dramas e alegrias estão no centro. Fez largos milhares de entrevistas. A pessoas felizes e infelizes. A pessoas interessantes e não interessantes. A mulheres que foram batidas por maridos. A mães que perderam os filhos. A campeões, assassinos, corruptos, skinheads e santos. Os vídeos que publicou das suas férias mostram duas coisas: que é bem-disposto (o que é excelente) e que perdeu toda a ligação à realidade. Para Manuel Luís Goucha a realidade é uma abstração. As pessoas são abstrações. O seu sofrimento é apenas parte do seu décor televisivo. Ao fim de tantos anos a ouvir dramas ele já não sente nada porque se transformou na própria máscara que inventou para se proteger. Não é fácil ser uma estrela.
O jornalismo hoje é diferente do tempo em que comecei. Passaram mais de 25 anos, é normal que tenha mudado. Tem sido uma evolução que não é apenas negativa, mas a rapidez motivada pela revolução tecnológica (em múltiplas dimensões) levou a que se chegasse à paranoia angustiante de um jornalismo transformado numa série de entretenimento. Uma série que oferece à audiência o que ela quer, não o que ela precisa para estar realmente informada. Como para Goucha e o namorado, o sofrimento é uma abstração e um instrumento poderoso de conquista de audiências.
Nas praias do Sul largas centenas de jovens, filhos deste tempo, banharam-se encavalitados uns nos outros. Qual vírus, qual preocupação, qual medo? E quem os pode levar a mal? A televisão, as notícias, os vídeos nas redes sociais são parte de uma encenação, parte de alguma coisa que não é bem real, é (lá está) uma abstração. São uma geração que vive num mundo virtual em que o vírus (e toda a realidade) é a única coisa que detetam ser fake.
O homem que Rui Rio escolheu para ser seu porta voz para as Finanças poderia ter dito na entrevista ao Público. “Este é o tempo em que devemos confiar e colaborar. Estarmos vigilantes, mas disponíveis para ajudar no que for preciso, é uma emergência mundial e também nacional. No final veremos, se for caso disso, o que falhou, no final perceberemos se este governo esteve à altura e se o ministro Centeno é mesmo o Mourinho das Finanças”. Mas não, o que o senhor disse foi: “Agora é que vamos ver se Mário Centeno é ou não o Ronaldo das Finanças”. Lamenta-se, mas não me admira. O drama do Coronavírus é instrumental do seu próprio desejo de que tudo corra mal. Não que ele deseje a morte de pessoas, certamente que não. Mas porque a morte e o sofrimento são, como acontece em todos os exemplos que dei, uma abstração.
3.
O Coronavírus está para durar. Nos próximos dias, com alta probabilidade, os números dispararão. Todos estamos em risco. Não é virtual. Há milhares de pessoas que morreram e muitas mais irão morrer. Provavelmente gente das nossas famílias, amigos, conhecidos, ídolos. Não é uma coisa virtual, está a acontecer. Temos de nos preparar. Mas temos também, muitos de nós, de tirar as nossas máscaras de atores. Ser capazes de viver a vida real e não folhetins televisivos onde, em troca da nossa presença/audiência, oferecemos a nossa alma.
PS
Excelente o papel de Rodrigo Guedes de Carvalho, na SIC. E incrível o protagonismo de Jorge Torgal, do Conselho Nacional de Saúde Pública. A mesma pessoa que há três semanas defendeu que o Coronavírus era igual a qualquer gripe, o que tornava ridícula a excitação das pessoas, foi o mesmo que anunciou que não há qualquer razão para o governo fechar as escolas. Haja paciência."

segunda-feira, 1 de maio de 2023

As obras na linha costeira da Figueira da Foz criaram um desequilíbrio brutal na costa

Hoje, no Jornal Público
Erosão costeira na Figueira da Foz: “O mar trabalha todos os dias e nunca se cansa”.

A propósito, recorde-se uma postagem OUTRA MARGEM, de 11 DE ABRIL DE 2008, antes do acrescento dos 400 metros do molhe norte:
Mas, será que alguém sabe, porque estudou, as REPERCUSSÕES QUE MAIS 400 METROS NO MOLHE NORTE terão na zona costeira na margem a sul do Mondego?

Esta pergunta, colocada antes do início da obra, foi ignorada por quem tinha o poder de decisão. A obra foi, na altura, apoiada pela Câmara Municipal da Figueira da Foz e pela Junta e Assembleia de Freguesia de S. Pedro. Há 15 anos estava tudo de acordo. 
O Kilas, o mau da fita, era o António Agostinho: foi caluniado, foi perseguido (até porrada lhe prometeram), foi isolado. Valeu-lhe, como ainda hoje, o grande ego e saber que a razão estava do seu lado. Como, infelizmente, se está a comprovar.
Contudo, esteve sempre bem acompanhado. 
O seu Amigo Manuel Luís Pata, fartava-se de lhe dizer: "há muita gente que fala e escreve sobre o mar, sem nunca ter pisado o convés de um navio".
Passados 15 anos os desperdícios de recursos financeiros, os resultados estão à vista de todos no Quinto Molhe, Costa e Lavos, Leirosa e mais além...
Como afirma Miguel Figueira na edição de hoje do Público, «a última reposição de areias, trazidas do zona do porto, terminou “há um mês” (e aponta para um enorme buraco na zona mais próxima do local onde os banhistas solitários se instalaram). E acrescenta: “Já está a ser completamente comida. Este buraco não existia, já está aberto. A duna está fragilizada e acabamos de gastar aqui um milhão de euros.”»
Como muitos também me recordo que  “quando éramos miúdos, descíamos as dunas a sul do Quinto Molhe com pranchas, pois isto era uma coisa colossal”. Agora, esse monstro de areia é só uma memória. Ali em frente, estão sacos enormes de sedimentos colocados na base do que resta da duna, que a APA instalou no local há alguns anos, na tentativa de reter parte da areia que tem sido reposta, pontualmente, no local. Sobre a duna há um tubo, que serve para transportar areia para ali, alimentando artificialmente a costa.

A APA continua a desvalorizar a avaliação de Miguel Figueira. Primeiro, garante em resposta escrita ao PÚBLICO, «a intervenção naquela zona não está concluída — foram depositados 45 mil metros cúbicos (m3) de areia e faltam ainda outros 55 mil m3, ou seja, só foi concluída 45% da operação prevista e a restante, se a agitação marítima deixar, deverá ser concluída até ao final do mês.
Quanto aos danos visíveis indica: “A APA e o empreiteiro estão a monitorizar a evolução da intervenção, estando a decorrer como esperado. Este tipo de intervenções de alimentação artificial tem normalmente associadas perdas iniciais de curto prazo associadas aos fenómenos de reajuste do perfil (até atingir o perfil de equilíbrio) e compactação da areia após deposição”, além de alguma “dispersão lateral por processos longitudinais para fora da zona de deposição.”
Segundo o Público, a palavra "monitorizar” anda a irritar sobremaneira Miguel Figueira e Eurico Gonçalves, antigo campeão de surf e o outro rosto do SOS Cabedelo. 
O que está mais do que provado, é tal como previmos antes da execução da sua execução, as obras na linha costeira da Figueira da Foz — incluindo a extensão em 400 metros do Molhe Norte do porto marítimo, uma obra iniciada em 2008 — criaram um desequilíbrio brutal na costa. O areal da praia da Claridade, na cidade, a norte do porto e da foz do Mondego, cresceu tanto que fez com que esta se tornasse a maior praia urbana da Europa.
A sul de tudo isto o cenário é o oposto — a falta de sedimentos, impedidos de passar pelo extenso molhe, fez recuar a costa vários metros, fazendo desaparecer praticamente o areal em várias zonas da Cova-Gala e criando uma meia-lua bem pronunciada ainda mais para sul, onde antes não existia, porque a linha da costa estava muito mais à frente. 
Como afirma Migueira: “não há falta de areia. Ela está é mal distribuída”

A norte do porto, o areal não pára de aumentar, mas a sul a linha de costa está cada vez mais recuada, porque os sedimentos não conseguem passar.
Dúvidas há?
Sem esquecer o perigo na barra do porto,  onde já morreram 15 pessoas em acidentes, desde 2009...
«O Estudo de Viabilidade da Transposição Aluvionar das Barras de Aveiro e da Figueira da Foz, encomendado pela APA a um consórcio, que incluía a Universidade de Aveiro (UA), analisou diferentes soluções e concluiu que o bypass era a solução “economicamente mais viável”, para uma zona que, a sul da Cova-Gala, já apresentava taxas de recuo da costa de 3,5 metros ao ano.
Para os responsáveis do movimento cívico, parecia o início do fim de um longo processo, uma percepção reforçada pelo anúncio do então ministro do Ambiente, João Pedro Matos Fernandes, de que o bypass era mesmo para ser feito. O país já não queria voltar as costas ao mar — algo que nunca se faz, dizem, e que aprenderam muito cedo com os pescadores —, nem fazer dele o inimigo, mas aprender a adaptar-se às mudanças que ele próprio sofria, fruto, em grande parte, da intervenção humana.
Só que o balde de água fria veio logo a seguir: ao contrário do que o SOS Cabedelo esperava, a APA não tem qualquer intenção de avançar com a obra do bypass num futuro imediato e isso desespera os dois activistas. “Neste momento, a nossa maior preocupação é a urgência em avançar com a obra”, diz Eurico Gonçalves. “Queremos que se despachem”, reforça Miguel Figueira.»

Mais uma vez, as coisas estão a acontecer como o responsável do OUTRA MARGEM temia. Lembram-se das nossas conversas nos últimos dois anos sobre o assunto Miguel Figueira e Eurico Gonçalves? 
Percebem agora as minhas inquietações perante o vosso optimismo? 
Recordo Maio de 2021. De acordo com Carlos Monteiro, na altura presidente da câmara, que citou informação que lhe foi transmitida pela APA, o concurso para elaboração do projecto e estudo de impacte ambiental “ainda está para adjudicação”. Tendo um prazo de 12 meses para ser elaborado, só estará concluído em meados de 2022, a que acrescem os procedimentos de eventual aprovação, lançamento do concurso da obra propriamente dita e adjudicação dos trabalhos, que, se tudo correr bem, só deverão começar em 2023.
«Não será isso que vai acontecer. Em resposta escrita ao PÚBLICO, a APA explica que quando foi conhecido o resultado do estudo que apontou para o bypass como a melhor solução, já estavam em curso os procedimentos burocráticos para a operação de alimentação artificial do troço Cova-Gala/Costa de Lavos, a sul do porto marítimo, com 3,3 milhões de m3 de areia. “Só após a concretização dessa intervenção e a sua monitorização (fundamental para se avaliar a sua evolução, comportamento e eficácia) será possível avançar com a eventual solução de bypass fixo”, refere a APA.
E para que a “eventual” obra do bypass avance, terá ainda de ser precedida do seu próprio processo burocrático, acrescenta. Ou seja, concursos públicos, estudo de impacte ambiental, candidatura a financiamento...

A APA olha para o bypass — uma obra com validade mínima de 30 anos e custos de construção e operação para esse período estimados em 53 milhões de euros — como uma operação de “mitigação da erosão costeira” de “longo prazo”. Até lá, há a colocação de areia como a que está a decorrer a sul de Cova-Gala, com recurso a dragagem das areias do porto (solução de “curto prazo”) e a “alimentação artificial de elevada magnitude”, dos tais 3,3 milhões de m3, com um custo de 25 milhões de euros, e que é olhada como uma intervenção de “médio prazo”.
Miguel Figueira e Eurico Gonçalves não entendem por que não se avança já para o bypass. Nem porque querem monitorizar uma intervenção de colocação de areias que, acreditam, acabará por não ter sucesso, por não ser um processo contínuo. “Uma solução pontual não faz sentido. O mar trabalha todos os dias e nunca se cansa”, diz Miguel Figueira. “Então está tudo a arder e querem monitorizar a desgraça?”, questiona Eurico Gonçalves.»
Contudo, «Carlos Coelho, especialista em erosão costeira e coordenador dos investigadores da UA que participaram no estudo responsável pela identificação do bypass como a solução mais viável para a Figueira da Foz, defende a posição da APA. “Há alguns fenómenos e pressupostos admitidos durante este estudo que é possível que sejam discutíveis. Portanto, se pudermos aumentar o grau de confiança nos resultados, será o ideal”, diz.
E isso, defende, poderá ser conseguido monitorizando a operação que a APA tem prevista de colocação de 3,3 milhões de m3 de areia — um volume “muito mais alargado” do que o que tem sido colocado em operações mais pequenas e que, por isso, acredita, vale a pena acompanhar e avaliar. “Diria que a posição da APA faz sentido, sim. É um investimento muito alargado e tudo o que vier contribuir para aumentar o grau de certeza nos resultados deve ser feito”, defende.
E não se corre o risco de, daqui a alguns anos, quando se avançar de facto para o bypass, o estudo que o escolheu seja considerado desactualizado e se defenda a necessidade de um novo? Ouve-se Carlos Coelho rir ao telefone. “Podemos eventualmente correr o risco de ter de actualizar os resultados do estudo. Mas diria que este estudo do bypass acaba por ser válido num período mais longo”, diz o investigador.

Olhando o mar revolto da Figueira da Foz, de onde saíram há poucas horas, depois de mais uma manhã a surfar as suas ondas, os dois fundadores do SOS Cabedelo não se conformam com estes argumentos. Não se convencem que valha a pena avançar para uma operação intermédia, com um custo do m3 de areia que dizem ser dez vezes superior ao que é previsto para o bypass, e com o ónus ambiental “da queima dos combustíveis fósseis, com as dragagens”.
“Toda a gente já concordou com o bypass. É o que está inscrito na política do Governo, nos estudos da universidade, é o que defende a cidadania. Mas depois dizem-nos que isto é só para daqui a sete anos, para 2030. Isto é absolutamente insensato”, acusa Miguel Figueira.
O PÚBLICO questionou o MAAC, que remeteu quaisquer esclarecimentos para a APA. O presidente da Câmara da Figueira da Foz, Pedro Santana Lopes, em resposta escrita, refere: "Nunca foi admitido nem faz sentido dizer que uma acção, importante mas conjuntural, como a da transposição de 3 milhões de metros cúbicos possa pôr em causa a intervenção estrutural do bypass. E os calendários foram estipulados e ditos. A nosso ver, demasiado longos mas, de qualquer modo, assumidos."
O SOS Cabedelo vai continuar a insistir numa mudança de posição de quem decide as intervenções na costa. “A transição que falta fazer é desta atitude da APA, que continua numa lógica reactiva. De cada vez que há um acidente na costa, lá vêm eles gastar mais uns milhões. Têm de inverter esta lógica de “correr atrás do prejuízo”, para passar a correr atrás da solução. Hoje em dia é disso que se trata. Sabendo qual é a solução, têm de se pôr ao caminho”

Nota de rodapé.
Para ver o video com a entrevista de Miguel Figueira, clicar aqui.

domingo, 17 de abril de 2022

Desviem as areias...

A crónica de António Agostinho publicada na Revista Óbvia, edição de Março de 2022

Se há coisa com que lido mal é com acidentes no mar. Sou filho, neto e bisneto de pescadores. Estas tragédias tocam-me profundamente. Tenho antepassados que tiveram o mar como sepultura eterna.


Naufrágios na barra da Figueira aconteceram muitos nos últimos 12 anos. Entre eles, o mais presente na memória das pessoas, foi o ocorrido no dia 6 do mês de Outubro de 2015. A Figueira da Foz ficou de luto. Ao final desse dia negro para a nossa comunidade piscatória, o arrastão Olívia Ribau afundou-se à entrada da barra e levou consigo cinco vidas. 


Porém, entre os inúmeros acidentes que ocorreram `na barra da Figueira, depois do acrescento dos 400 metros do molhe norte, destaco o que aconteceu em 25 de Outubro de 2013. O barco naufragado foi o "Jesus dos Navegantes". Registaram-se 4 mortos numa tripulação de 7 homens.

Passados pouco mais de 2 anos, em 21 de Dezembro de 2015, o Estado português, via Tribunal de Coimbra, condenou o Mestre Francisco Fortunato a uma pena suspensa de dois anos e seis meses de prisão.  O Homem do Mar foi acusado pelo Ministério Público do Estado Português de quatro crimes de "homicídio por negligência", por não ter cumprido a "Carta Náutica"… Não ter tido conhecimento de um "edital"… E não ter mandado vestir coletes e descalçar botas.

Mas será que "a forma como a barra do porto da Figueira da Foz foi construída não poderá ter ajudado ao naufrágio da Jesus dos Navegantes"? Essa foi, pelo menos, a tese do falecido mestre José Festas, presidente da Associação Pró-Maior Segurança dos Homens do Mar.

A obra do acrescento dos 400 metros no molhe norte, iniciou-se em 2008 e ficou pronta em 2010. A partir desse ano começou a alterar as condições da deriva sedimentar. Com o tempo acumulou as areias (até começarem mesmo a contornar a cabeça do molhe norte…), e esse acrescido assoreamento levou ao consequente alteamento das vagas nessa zona. Dada a pouca profundidade existente na ponta do molhe norte, o mar parte o mar nesse local, o que torna difícil as entradas e saídas aos pequenos de pesca e iates.

Exactamente no mesmo local - barra do porto da Figueira da Foz - depois da obra, em 26.10.2010, 20.01.2012, 10.04.2013 e 25.06.2013, aconteceram outros quatro  naufrágios, com três mortos. Depois  do acidente  com o "Jesus dos Navegantes" em 25.10.2013 com quatro  mortos, aconteceu o naufrágio do Olívia Ribau (e outros estiveram iminentes) com mais cinco mortos. Em Novembro passado, os graves problemas de segurança da barra da Figueira da Foz, com o assoreamento que torna o mar violento e traiçoeiro,  provocaram mais uma tragédia naquele local. Quatro amigos, pescadores amadores, morreram após a embarcação onde seguiam, a ‘Seberino II’, ter virado e naufragado entre as praias do Hospital e da Cova, a sul da barra.

Para quando a realização de um inquérito - a sério - à operacionalidade da barra depois das obras do prolongamento dos 400 metros do molhe norte?

No passado dia 10, perto da embocadura da barra da Figueira, o mar virou a lancha dos pilotos, que iam dar entrada a um navio que vinha com destino ao porto comercial para carregar argila. No acidente houve a registar 2 feridos e danos na embarcação utilizada pelos pilotos da barra da Figueira. Segundo o que li no Diário de Coimbra, "à situação não foi alheio o assoreamento". 

O velho problema de conseguir assegurar a manutenção desassoreada de uma instalação portuária  destinada também a barcos pequenos, de pesca e de recreio e não apenas a cargueiros continua. O acidente com os pilotos da barra confirma isso mesmo. Se há alguém que conhece a barra como as próprias mãos, são os profissionais que todos os dias operam na barra da Figueira e estão sujeitos a cumprir todas as regras e procedimentos instituídos na "carta Náutica".

Como certamente estão lembrados, 2021 foi ano de eleições autárquicas. Aconteceram a 26 de Setembro. O Governo, quiçá por mera coincidência, antecipou a divulgação pública do estudo sobre a transposição de areias na barra da Figueira da Foz, prevista para Setembro de 2021.  O documento foi apresentado no dia 12 de Agosto de 2021: esse foi o tempo considerado certo para anunciar o estudo de viabilidade do bypass. 

Continuamos a aguardar pelo tempo certo para o transformar em projecto... E, depois, em realidade. Recorde-se que o estudo do bypass, que custou 264 mil euros, foi adiado durante anos. Contudo, mais vale tarde do que nunca. Em 12 de Agosto, a  pouco mais de um mês da realização das eleições de 26 de Setembro de 2021, o ministro do Ambiente assumiu que a transferência de areias para combater a erosão costeira a sul da Figueira da Foz com recurso a um sistema fixo (bypass) é a mais indicada. 

“Avaliada esta solução (da transferência de areias) não há qualquer dúvida de que o bypass é a mais indicada e, por isso, vamos fazê-la”, disse à agência Lusa João Pedro Matos Fernandes.

O “Estudo de Viabilidade de Transposição Aluvionar das Barras de Aveiro e da Figueira da Foz”, apresentado na manhã de 12 de Agosto de 2021 pela Agência Portuguesa do Ambiente (APA), avaliou quatro soluções distintas de transposição de areias e concluiu, para a Figueira da Foz, que embora todas as soluções sejam “técnica e economicamente viáveis”, o sistema fixo é aquele “que apresenta melhores resultados num horizonte temporal a 30 anos”.

O estudo situa o investimento inicial com a construção do by pass em cerca de 18 milhões de euros e um custo total, a 30 anos, onde se inclui o funcionamento e manutenção, de cerca de 59 milhões de euros. “Obviamente que o que temos, para já, é um estudo de viabilidade, económica e ambiental. Temos de o transformar num projecto, para que, depressa, a tempo do que vai ser o próximo Quadro Comunitário de Apoio, (a operação) possa ser financiada”, disse o ministro.

O sistema fixo de transposição mecânica de sedimentos, conhecido por bypass, cuja instalação o movimento cívico SOS Cabedelo defende, há mais de uma década, que seja instalado junto ao molhe norte da praia da Figueira da Foz, será o primeiro em Portugal e idêntico a um outro instalado na Costa de Ouro (Gold Coast) australiana. É constituído por um pontão, com vários pontos de bombagem fixa que sugam areia e água a norte e as fazem passar para a margem sul por uma tubagem instalada por debaixo do leito do rio Mondego. A tubagem estende-se, depois, para sul, com vários pontos de saída dos sedimentos recolhidos, que serão depositados directamente nas praias afectadas pela erosão.

A opção de avançar para a construção de um bypass era em Agosto de 2021, para o então presidente da Câmara da Figueira da Foz, Dr. Carlos Monteiro, uma solução que permitia “tranquilidade e esperança a quem usa o porto comercial, a quem usa o porto de pesca e à população da margem sul da Figueira da Foz”. Carlos Monteiro, na altura, disse que uma proposta a longo prazo “não é frequente” em Portugal e agradeceu ao ministro do Ambiente, Matos Fernandes, por aquilo que considerou ser um gesto com “visão”.

Carlos Monteiro solicitou que o estudo  apresentado fosse “avaliado o mais depressa possível” e que o projecto “fosse desenvolvido”. Mas disse esperar, “fundamentalmente, que tenha a maturidade necessária para ser inscrito no Quadro Comunitário [Portugal] 2030. Atendendo aos valores, acredito que possa e deva ser”. 

Também na altura, o arquitecto Miguel Figueira, do movimento cívico SOS Cabedelo, se manifestou agradado com a decisão de se optar pelo bypass. “Agora temos uma responsabilidade de contribuir para que seja bem feito. Há uma série de dúvidas, estamos a trabalhar em coisas que já deram provas de funcionamento, o sistema australiano funciona há mais de duas décadas, mas há sempre dúvidas sobre os impactes”, notou.

O ministro do Ambiente recordou a primeira vez que ouviu falar “ao vivo” da hipótese do bypass na Figueira da Foz e lembrou o “ar zangado” do arquicteto “cheio de certezas absolutas”, quando o movimento protestava, em 2019, pela construção do sistema fixo. “Agradeço ao SOS Cabedelo, a forma, muito para além de reivindicativa, mas técnica, com que nos entusiasmou a chegar aqui”, frisou Matos Fernandes.

Passaram sete meses. Espero, sinceramente, que tudo tenha sido mais do que uma mera tentativa de jogada de propaganda eleitoral. 

"Há muitos anos que, para mim, a protecção da Orla Costeira Portuguesa é uma necessidade de primeira ordem e que o processo de erosão costeira assume aspectos preocupantes numa percentagem significativa do litoral continental.

Atente-se, no estado em que se encontra a duna logo a seguir ao chamado “Quinto Molhe”, a sul da Praia da Cova. Por vezes, ao centrar-se a atenção sobre o acessório, perde-se a oportunidade de resolver o essencial..."

Escrevemos o que está entre comas, no blogue OUTRA MARGEM em 11 de Dezembro de 2006. Passados quase 16 anos, infelizmente, continua actual. Depois da construção do acrescento dos malfadados 400 metros do molhe norte, a erosão costeira a sul  da foz do Mondego tem avançado. A barra da Figueira, por causa do assoreamento e da mudança do trajecto para os barcos nas entradas e saídas, tornou-se na mais perigosa do nosso País para os pescadores. A Praia da Claridade transformou-se na Praia da Calamidade. A pesca está a definhar. Espero que, ao menos, perante a realidade possam compreender o porquê das coisas...

O Dr. Santana Lopes é agora o novo presidente de câmara. É ele que tem que perceber e saber  lidar  com as as consequências das diferentes dinâmicas que construíram  e desconstruíram a orla costeira no concelho da Figueira da Foz. "Um sistema complexo com uma instabilidade natural (decorrente de marés, das correntes, dos fenómenos meteorológicos, das derivas de sedimentos) mas também decorrente da acção humana, salientando-se aqui a interferência da barra do porto marítimo da Figueira da Foz e do seu prolongamento". 

O impacto ambiental causado pelo crescimento dos molhes  - uma infraestrutura que inibe a deriva de sedimentos acumulados na praia da Figueira da Foz (seguramente a maior praia da Europa) acelerou a erosão da costa a sul, colocou ao território do nosso concelho desafios que têm de ser defrontados com responsabilidade e ousadia. 

As soluções, ao que parece existem. A proposta do bypass - um sistema mecânico de bombagem permanente de areias que permitam restabelecer em grande parte a dinâmica dos sedimentos que alimentam a costa, já foi assumida pelo ainda ministro do Ambiente como a mais indicada. 

Se a situação foi estudada e a solução encontrada, continuamos à espera de quê? "O mar é a nossa terra". Temos de saber entende-lo e saber lidar com ele. E, sobretudo, nunca tentar contrariar a sua força, pois isso é impossível...