Via Jornal Público
"Ο regresso de Passos Coelho era para acontecer
antes: uma eventual
derrota de Luís
Montenegro nas
europeias abriria o caminho a que
o ex-primeiro-ministro se voltasse a
candidatar à liderança. Só que,
entretanto, António Costa
demitiu-se, houve novas
legislativas antes das europeias,
Montenegro ganhou e o retorno de
Passos ficou em banho-maria.
Foi há precisamente 10 anos que
Passos Coelho (em aliança como
CDS de Portas) foi o "candidato a
primeiro-ministro" mais votado.
Nessa época, o PS não era
especialmente forte, mas a
esquerda era-o e, com a maioria de
esquerda no Parlamento, António
Costa conseguiu formar governo
com o apoio do PCP e do Bloco de
Esquerda e remeteu Passos à
oposição.
Os dias de Passos na oposição foram duros. São sempre, mas
ainda mais quando já se foi
primeiro-ministro, com o novo
governo em estado de graça. A
frase "vem aí o diabo" - a sua
previsão sobre a gestão das contas
públicas pelo governo PS - marcou
esse tempo. O diabo não veio.
Agora, Passos avisa para novo
diabo, desta vez com um Governo
PSD.
Passos podia ter ido trabalhar
para um sítio qualquer e, neste
momento, estar a ganhar muito
dinheiro. Oportunidades destas
nunca faltam a antigos
primeiros-ministros. Não o fez:
manteve-se professor universitário,
com um salário que qualquer
antigo primeiro-ministro haveria
de considerar baixo: pouco mais de
2000 euros.
As suas intervenções públicas
têm confirmado uma aproximação
ao discurso do Chega - desde o
combate às aulas de cidadania ao
mais recente apontar do risco de
"os portugueses se sentirem
estrangeiros na sua terra".
É um facto que o Governo
também se tem aproximado do
discurso do Chega, mas há uma diferença - Passos é contra o "“não
é não". A sua relação com André
Ventura é conhecida. Foi Passos
que indicou Ventura para
candidato do PSD à Câmara de Loures e que não lhe retirou a
confiança depois do discurso
anti-ciganos, ao contrário do que
fez Assunção Cristas, na altura líder
do CDS.
Com Pedro Passos Coelho na
liderança do PSD será fácil um
acordo de governação com André
Ventura. Ventura é fã de Passos:
seria o único candidato
presidencial que admitia apoiar,
depois da desilusão com Gouveia e
Melo. Passos não quis ser
candidato a Belém, mas agradeceu
o apoio de Ventura (ao contrário do
que fez Gouveia e Melo). Quando
lhe perguntaram se sentia
incomodado com este anunciado apoio, respondeu, a 20 de
Setembro: "Porque é que eu havia
de ficar incomodado com alguém
que diz que votava em mim e me
apoiava sempre que me
candidatasse? Não estou a ver por
que é que havia de ficar
incomodado".
Na sexta-feira, Passos Coelho fez
uma crítica violenta e uma
verdadeira demarcação ao
Governo de Montenegro e ao
Orçamento, crítica com a qual até o
secretário-geral do PS se
identificou. "Chegámos ao fim das
margens de manobra que nos
permitem adiar decisões
importantes. Agora, não vale a
pena haver mais cálculos eleitorais
nem perder tempo com
preocupações distributivas", disse
Passos, criticando as "habilidades
orçamentais para salvar o ano" e
defendendo um crescimento que
não seja apenas por via do
consumo.
Tem havido um crescendo nas
críticas de Passos a Montenegro. As
eleições foram em Maio e o avanço
de Passos para o poder (em
coligação com Ventura) pode parecer a muitos uma coisa fora de
tempo.
Mas uma sombra paira sobre o
primeiro-ministro. Até agora, que
seja público, Luís Montenegro
ainda não deu os esclarecimentos ao Ministério Público no âmbito da
averiguação preventiva do caso
Spinumviva. A 19 de Setembro o
primeiro-ministro disse que "iria
aproveitar a tarde para tentar
reunir os documentos que foram
solicitados e enviá-los o mais
rápido possível". É verdade que
Montenegro disse, aa 8 de Outubro,
que enviou elementos, mas devem
ter-se perdido pelo caminho e não
terão chegado ao destinatário.
É muito difícil conceber que não
venha a ser aberto um
inquérito-crime tendo em conta o
que está em causa. È certo que os portugueses não são um povo
muito exigente com a
transparência dos seus políticos e a
vitória de Montenegro em Março
funcionou como uma espécie de
absolvição em tribunal popular.
Mas ficou muito por esclarecer.
A dúvida é se Montenegro terá condições de continuar primeiro-ministro se o Ministério Público abrir o inquérito. Num cenário em que as condições não estejam reunidas, é óbvio que Pedro Passos Coelho é o primeiro da fila para a sucessão (Carlos Moedas nunca se candidatará contra o ex-primeiro-ministro). E já sabemos que Passos faz o acordo com o Chega."
A dúvida é se Montenegro terá condições de continuar primeiro-ministro se o Ministério Público abrir o inquérito. Num cenário em que as condições não estejam reunidas, é óbvio que Pedro Passos Coelho é o primeiro da fila para a sucessão (Carlos Moedas nunca se candidatará contra o ex-primeiro-ministro). E já sabemos que Passos faz o acordo com o Chega."

2 comentários:
Num partido de cunho "culto do líder único", achas que o Ventura alguma vez partilharia palco com o Passos?
Lê o livro.
A extrema direita, tal com a direita (temos o histórico do PSD +CDS/PP), ao contrário da esquerda, une-se no essencial. Passos Coelho, foi um político que conseguiu unir a esquerda e estabelecer pontes entre socialistas, bloquistas e comunistas. Mas os portugueses mudaram...
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