Cito o eng. João Vaz, consultor de ambiente e sustentabilidade, na sua habitual crónica dos sábados no jornal AS BEIRAS.
“Existe um paralelo entre os orçamentos fictícios de S. Lopes e D. Silva (PSD) na câmara e o PIB grego até 2010. Ambos tinham por base o recurso ao crédito e uma incapacidade dos credores em “dizer não”, confiantes num “futuro melhor”. Na Figueira, a “festa” terminou em cortes e racionalização de custos, penalizando-nos a todos.
A política em democracia é a
arte do compromisso. Não há
varinhas mágicas. Talvez pela
sua “juventude” e inexperiência governativa, os dirigentes do Syriza, no Governo
grego de coligação com a
extrema-direita nacionalista
do Anel, prometeram o “fim
dos cortes”. Contra a vontade
das restantes 17 democracias
da zona Euro, decidem impor
as suas regras orçamentais.
Segundo o Syriza, os gregos
seriam vítimas de uma mega
conspiração internacional. Ou
seja, os líderes das democracias (da Itália à Estónia,
passando pela Bélgica) são
“fantoches manipulados”
nas mãos do grande capital,
desejosos de “humilhar” o
povo grego.
Uma converseta
sectária e fantasiosa. Os factos mostram que nunca um
país recebeu tanto dinheiro
em tão pouco tempo.
Na realidade, os gregos falharam na reforma do Estado,
e o Syriza cedeu em toda a
linha ao corporativismo (médicos, engenheiros, militares)
e à oligarquia grega. Amanhã,
na Grécia, a nova e a velha
Esquerda, aliadas à extrema direita (FN, 5 Estrelas, UKIP),
vão defender um “Não” ideológico ao Euro e um sim aos
nacionalismos populistas. Se
fosse grego, votaria nai (sim).”
O século XX e o princípio deste século XXI assistiu ao apogeu e declínio da esquerda por
onde navegou (não sei se ainda navega...) o eng. João Vaz.
O PS e os seus irmãos europeus conquistaram o poder e falharam na sua
execução, perdendo aí parte do referencial de humanismo progressista que lhe
estava na base.
Na Figueira, como o passado e a realidade do tempo que passa amplamente demonstra, aconteceu o mesmo.
Com o descrédito do “socialismo
democrático” e da variante “social democrata”, restou ao “homem bom” ser capaz
de se organizar em novas formações políticas em prol da comunidade.
Foi o que aconteceu na Grécia, está a acontecer na Espanha e noutros países e, talvez, venha a acontecer em Portugal.
Todos sabemos que o homem, mesmo esse tal “homem bom”, é individualista, interessado no
melhor para si, e para os seus.
Quanto a mim, foi aí que residiu o falhanço da esquerda: não previu a realidade humana…
Apesar desta realidade, custosa de aceitar para as almas
generosas - talvez a mais bela matriz da esquerda resida precisamente no sentido
humanista de protecção dos fracos e a tolerância à diferença - Portugal e a Figueira precisam da “esquerda”
como nunca.
Contudo, a “esquerda democrática” continua em choque e a ressacar dos erros enormes que
cometeu. Em Portugal, essa esquerda “parlamentarizou-se”, ficou-se pelos debates nas
televisões, adaptou-se ao “sistema” e
desistiu das lutas verdadeiras.
Num País tão socialmente assimétrico, onde o discurso
político dominante – a crónica demagógica e confusa do eng. Vaz é disso uma
prova - se dá ao luxo de afirmar que
“que vivemos acima das nossas possibilidades” (quem? os reformados? os “mal
pagos” do salário mínimo, a multidão de precários, os desempregados?..), a esquerda ocupa-se das lutas possíveis dos sindicatos da função pública e das empresas de transportes.
Sem colocar em causa a justeza dessas lutas, sabemos que não
é aí que reside a verdadeira dor e a
miséria mais gritante em Portugal.
Aliás, um dos aspectos mais visíveis da natureza desta
esquerda vive-se nas lutas sindicais.
Contudo, hoje em dia qual é o valor dos
sindicatos? Para que servem e a quem servem? Que respeito lhes dedica a
sociedade?
A resposta da chamada “esquerda modernaça”, é que não servem
para nada (ignoram o que é, ou deveria ser, a empresa moderna, feita de
compromissos partilhados entre accionistas e empregados) e têm implícita uma
ideia de “Estado” distribuidor de postos de trabalho e regalias “automáticas” à
margem de critérios de avaliação individual, responsabilidade e mérito.
O grande pecadilho da esquerda, em Portugal, foi ter-se tornado conservadora
em muitos dos seus mitos e não ter criado alternativas (credíveis) de
governação.
Perdeu-se o sentido da realidade à esquerda. Consequentemente,
a “injustiça” acentua-se e o domínio capitalista está cada vez mais agressivo.
Portugal, um Portugal que tenha por objectivo o
desenvolvimento humano precisa da esquerda.
Por essa Europa fora estão a definir-se desafios novos,
pensamentos, e acção para uma nova esquerda. Em Portugal – atrasados como
sempre – continuamos alheios a muitas dessas lutas e a confundir
propositadamente a realidade.
Num país com desemprego acima de 17% o que é que a esquerda
tem feito? Quem é a voz dos que não tem voz?
Não chega o aproveitamento eleitoral que já está a ser feito
pela máquina eleitoral do PS… Esse mesmo PS que, em Portugal, como todos os que tenham um mínimo de memória sabem, iniciou o caminho da precariedade e do desemprego no mundo laboral.
Em tempo.
Freitas do Amaral:
- União Europeia tornou-se “uma ditadura sobre democracias”.