- O jornal é de 30 de Junho de 2018. Há meio ano, portanto.
Via Mário Martins
Nota de rodapé.
Via DIÁRIO AS BEIRAS |
António Agostinho, o autor deste blogue, em Abril de 1974 tinha 20 anos. Em Portugal havia guerra nas colónias, fome, bairros de lata, analfabetismo, pessoas descalças nas ruas, censura prévia na imprensa, nos livros, no teatro, no cinema, na música, presos políticos, tribunais plenários, direito de voto limitado. Havia medo. O ambiente na Cova e a Gala era bisonho, cinzento, deprimido e triste. Quase todas as mulheres vestiam de preto. O preto era a cor das suas vidas. Ilustração: Pedro Cruz
Via DIÁRIO AS BEIRAS |
«Na manhã do dia 30 de maio de 1919 “a população da Figueira da Foz acorreu à praia prestes e ávida de curiosidade. Flutuava no Mondego, perto da sua foz, o histórico hidroavião americano N. C. 4, que, pilotado sob a direção do valoroso comandante Read, conseguiu levar a bom termo o arrojado empreendimento da travessia aérea do Atlântico”.
"UMA REFLEXÃO SOBRE O TEMPO QUE ESTAMOS A VIVER", publicada por A. Galopim de Carvalho no blogue Rerum Natura é um texto que, a meu ver, merece leitura atenta.
«Estamos a viver um tempo altamente preocupante, não só a nível internacional, como cá dentro deste “torrão” de iliteracia de quase tudo, mercê de um sistema educativo que deu e dá diplomas, mas não deu nem dá esse tudo que tanta falta nos faz.
O poder do feiticeiro reside da ignorância dos seus irmãos tribais. Quer isto dizer que, quanto mais inculto for o povo, mais facilmente é dominado e, até, desprezado pelo poder.
Tornámo-nos um país caído nas lutas entre aparelhos partidários, onde emergem políticos incompetentes e oportunistas, de que a nossa sociedade está cheia, onde, de há muito, impera a corrupção, o vírus do futebol profissional e a promiscuidade entre a política, o poder económico e a justiça.
Ao aproximar-se a data de comemorarmos os 50 anos de liberdade (apenas a de expressão, reunião, criação de partidos, associações e coisas assim) é com um sentimento de profunda decepção que me dou conta deste grande número de anos desaproveitados. É por demais evidente que não soubemos aproveitar a liberdade que nos foi oferecida, para erradicarmos muitos dos nossos atavismos civilizacionais e culturais. “O que é preciso é ter bons padrinhos”. “O gajo é que foi esperto, amanhou-se. Entrou de mãos a abanar e hoje anda de Mercedes”. “Estudar para quê? O que interessa é esperteza p’ró o negócio”. “São 230 euros, mas se for sem recibo, a gente fecha os olhos e só pagas 180”. “Quanto mais cedo vier a reforma, melhor”. Estas e outras frases e atitudes do desenrascanço, do enganar o Estado ou o patrão, ainda perduram em muitos dos nossos compatriotas.
Como já escrevi tantas vezes e volto a escrever a generalidade da classe política a quem os Capitães de Abril, há quase 50 anos, generosa, honradamente e de “mão beijada” entregaram os nossos destinos, mais interessada nas lutas partidárias, nos compadrios e nas vantagens do poder, esqueceu-se completamente de facultar aos cidadãos cultura civilizacional, científica e humanística. Esqueceu-se? Ou entendeu que havia outras prioridades?
É evidente que a revolução iniciada com o 25 de Abril de 1974 nos trouxe grandes progressos materiais e sociais, por demais apontados, mas muito aquém do que poderia ter sido se as competências e as vontades tivessem sido outras. Mas pouco ou nada mudámos nas mentalidades. Vimos um vislumbre de um real propósito de elevação do nível cultural e cívico dos portugueses no fugaz e efémero programa da 5.ª Divisão de Estado-Maior-General das Forças Armadas, chefiada pelo saudoso primeiro-tenente médico Ramiro Correia, mas não vimos nada que se lhe comparasse em nenhum dos governos constitucionais destes cinquenta anos de democracia. Fez-nos falta a honestidade, o pensamento e a vontade de servir de Melo Antunes, o “capitão de Abril” que nos deixou cedo demais.
À semelhança do sempre esquecido mundo rural, as nossas cidades têm, ainda, uma lamentável percentagem de analfabetos funcionais, a par de uma classe média a que a escola não deu a educação, a formação e a preparação essenciais a uma cidadania plena, antes. Uma escola que, desde há muito, por falta de visão política, atravessa uma crise, sem solução à vista, As conquistas na segurança social, nos cuidados de saúde, na ciência, no ensino e no apoio à cultura conseguidas na vivência em democracia que se seguiu à Revolução dos Cravos, estão a fugir da nossa vida colectiva como areia por entre os dedos. Só a justiça se mantém intacta no seu pedestal.
Perdemos uma parte significativa da independência nacional e assistimos à asfixia e destruição de muitas das nossas valências económicas. Estamos a viver tempos de miséria e, até, de fome para um número cada vez maior de famílias, de miserável abandono dos idosos, de corrupção descarada e impune e de aumento do número e da riqueza dos ricos. A chamada classe média está a afundar-se, o desemprego está a ressurgir e é mais um incentivo crescente à igualmente dramática emigração de uma juventude qualificada.
Tudo isto e mais alguma coisa foi sabiamente previsto por Natália Correia (1923-1993), grande portuguesa, que deixou nome na poesia e na política (deputada à Assembleia da República entre 1980 e 1991). Estou muito longe de ter lido a obra desta saudosa açoriana de São Miguel, mas o que li, em especial, poesia, sempre me mostrou, pela excelência do conteúdo e da forma, a mulher com quem tive o privilégio de conviver nos últimos anos da sua vida. Quando a procurei, em começos da década de 90 eu era um profissional, a tempo inteiro, com 30 anos de dedicação exclusiva a uma ciência demasiado terra-a-terra - a geologia - em busca de um outro caminho que tinha o dela e de muitos outros mestres da palavra, por modelo. Prenderam-me a esta lutadora a intransigência com que defendia a liberdade, a solidariedade, a justiça e a cultura, o desassombro, a elevação e a beleza, a força e a energia, que usou na palavra falada e escrita, características que sempre igualei às do também grande e saudoso Ary dos Santos.
Apraz-me aqui e agora transcrever, pelo que têm de impressionante realismo, algumas premonições desta grande Senhora, trazidas a público por Fernando Dacosta em “O Botequim da Liberdade” (Casa das Letras, 2013). "Portugal vai entrar num tempo de subcultura, de retrocesso cultural, como toda a Europa, todo o Ocidente". “O Serviço Nacional de Saúde, a maior conquista do 25 de Abril, e Estado Social e a independência nacional sofrerão gravíssimas rupturas. Abandonados, os idosos vão definhar, morrer, por falta de assistência e de comida”. "Os neoliberais vão tentar destruir os sistemas sociais existentes, sobretudo os dirigidos aos idosos.
Só me espanta que perante esta realidade ainda haja pessoas a pôr gente neste desgraçado mundo e votos neste reaccionário centrão". "As primeiras décadas do próximo milénio serão terríveis. Miséria, fome, corrupção, desemprego, violência, abater-se-ão aqui por muito tempo”. “Espoliada, a classe média declinará, só haverá muito ricos e muito pobres”.»
Está quase a fazer uma ano: num domingo, a 3 de Julho de 2022, "os festeiros" Santana Lopes e Jorge Aniceto não deixaram morrer a Festa em honra de São Pedro na Cova e Gala.