"Que nunca ninguém saiba os crimes deste dia
Que eu não quero viver em tanta porcaria
Por isso, ó morteiro te peço bem do fundo
Dispara um tiro só, leva-me do mundo
E o morteiro bojudo, o morteiro audaz
Expediu um pesado... e matou o rapaz"
"A Batalha de La Lys, travada no Sul da Flandres em 9 de Abril de 1918, constitui o momento mais traumático da acidentada participação portuguesa na Primeira Grande Guerra. O seu desenlace feriu profundamente a alma nacional, chegando a falar-se de um novo Alcácer-Quibir".
O meu avô esteve lá. Chamava-se Domingos Marçalo e participou neste grande conflito mundial como cozinheiro e combatente.
"O Relatório de combate de 9 a 12 de Abril de 1918 não se destina a acrescentar pormenores às circunstâncias do combate. Qual mergulho na poeira multiforme dos dramas individuais, o que nele releva é a perspectiva de um soldado, pequeno elo de uma engrenagem da qual lhe escapa o conjunto e o sentido. Trata-se de uma descrição na primeira pessoa, feita por alguém que viveu a batalha, minuto a minuto, ombro a ombro com os companheiros, tomando iniciativas, partilhando angústias, vendo cair os feridos e os mortos e que de tudo nos dá testemunho. Apesar de o tema ser perturbante, o relato é técnico, o tom é neutro, só aqui e ali deixa aflorar alguma emoção, e talvez por isso mais desembaraçado de cargas ideológicas. É uma espécie de fita do tempo, apresentando uma anotação precisa do momento em que ocorreram os diversos eventos em que o protagonista se viu envolvido.
O autor do relatório, Raul Pereira de Araújo, transmontano da vila de Mesão Frio é um jovem alferes que, ao escrever um caderno de "Lembranças" onde reteve fragmentos do vivido na guerra, nos quis deixar a sua própria imagem."