sábado, 26 de março de 2016

Uma fotografia que regista uma época

A memória  trazida até mim, por esta foto sacada daqui, trouxe um tempo da minha vida, nunca esquecido, sempre lembrado, não descansado, mas feliz.
Levou-me a lugares, a vozes, a rostos e almas e vivências da minha infância.
Levou-me a recuar a um olhar de passos idos, a uma viagem já longínqua, mas presente, qual força espiritual, um fado que existe em todos nós, um chamamento velado - no fundo o reencontro com o nosso passado e a nossa memória.
É uma fotografia admirável, que me fez recuar décadas e me levou até aos anos 60 do século passado, numa visita ao universo complexo e emaranhado da minha vida e da vida da minha família -  memória feliz e gratificante a nível familiar, mas ferida pelas cicatrizes da memória de tempos difíceis e da vida dura na Aldeia onde nasci e de que continuo apaixonado. 
Esta fotografia tem pessoas, figuras, rostos e olhares, onde paira a ternura e ressaltam fragmentos de beleza avassaladora e sorrisos francos e transparentes apesar das carências. O pormenor dos pés descalços, não é folclore, não é típico, não é turístico - mostra a realidade de não haver dinheiro para calçado.
É um registo impressionante de olhares de gente de  trabalho, mais do que duro, por vezes mesmo penoso, sem horário  - o dia começava às 5 da manhã - e mostra uma sensibilidade atenta ao pormenor de uma realidade e de uma época da história da minha Aldeia e do meu País.

2 comentários:

Anónimo disse...

A nossa gente... todas elas lindas.

Galeota

A Arte de Furtar disse...

Esta foto é um desarrumar da Memória…

Páscoa também é tempo de memória! Memória visual, auditiva, visual e gastronómica. Os excelentes resultados que saiam da cozinha, laboriosamente cozinhados pela minha mãe, avó e tias, eram um regalo!
Memória dos meus avós e pais que, arduamente e obstinadamente, educaram três netos e filhos. Todos ajudávamos no campo, nos trabalhos caseiros, no que fosse preciso… Aprendemos muito com a sabedoria do avô e a paciência da avó. Eu e os meus irmãos somos ricos de uma herança de valores e honradez!
Memórias de agricultores e pequeno comerciante que conseguiram dar educação e futuro a três filhos; memórias de amigos de escola e de tempos muito difíceis. Memórias dos meus irmãos, envolvidos na luta anti-regime, e das fintas para guardar os panfletos a distribuir (em Coimbra). Memórias dos meus primos que tiveram que emigrar para França e Alemanha e memórias dos nossos fraternos reencontros, cá e lá.
E fica “uma raiva crescer-te nos dentes”, como diz o Sérgio Godinho, quando ouvimos, lemos e vemos esta “gente” vir falar de lavoura, da “santa” Isabel Jonet ou do “ainda está para nascer alguém mais honrado do que eu”, etc etc…
O glorioso 25 continua a ter muitos inimigos e “inadaptados”. Cá estaremos seja com o voto, seja na rua ou com a tranca para o defender.
E esta foto serve mesmo para desarrumar a minha memória… E ainda ontem, fui ao aeroporto, buscar os meus dois filhos emigrados.
Memória e Identidade que lhes procurei transmitir, numa dialéctica que se conjuga, se alimenta mutuamente, se apoia uma na outra para produzir uma trajectória de vida, uma história e uma memória.

“Aceito perfeitamente o fim, sobretudo quando o fim nos deixa memórias muito boas e porque o fim é o fim. Não há mais nada a fazer. Por isso, sigo sempre em frente. O futuro é sempre em frente.” – Fernando Fernandes.