sábado, 8 de fevereiro de 2020

A mentira dourada


"O que o centrão não queria que soubéssemos sobre os Vistos Gold revela tudo o que eles próprios não querem saber: uma esquema de corrupção legal, tornado política de Estado.

João Paulo Batalha
Tudo o que sucessivos Governos lhe disseram sobre os Vistos Gold é mentira. De Paulo Portas, Miguel Macedo e Passos Coelho a António Costa, Augusto Santos Silva e Eduardo Cabrita, todos mentiram. Os Vistos Gold são o espelho da parte mais podre do regime democrático: uma mentira de Estado para proteger um esquema de corrupção institucionalizada e garantir longa vida à promiscuidade entre políticos vendidos e os lóbis que os compraram – e nos levaram à falência, continuando ainda hoje a traficar poderes e influências com triunfante impunidade em Portugal.

E de onde vem o dinheiro? Sabendo que a larga maioria dos beneficiários são cidadãos chineses, sujeitos a leis de controlo de capitais que os impedem de tirar mais de 50 mil dólares por ano da China, como é que chegam com 500 mil euros para comprar imóveis em Portugal? Ou, perguntando de outra maneira, que procedimentos segue o SEF para garantir a origem limpa dos capitais trazidos na bagagem dos novos cidadãos dourados? Nenhuns. A força de segurança encarregue de proteger as fronteiras de Portugal e da Europa abre os braços e fecha os olhos, respondendo à Transparência e Integridade que "não compete ao Serviço de Estrangeiros e Fronteiras esse controlo". Compete a quem? Às entidades obrigadas por lei, incluindo os banqueiros e advogados que falharam espetacularmente (por estarem em conluio evidente com os criminosos) no Luanda Leaks, ou aos agentes imobiliários que reconhecidamente não cumprem as suas obrigações de diligência devida. "Reconhecidamente"? Sim. É o próprio Governo que o diz, no relatório de avaliação dos riscos de branqueamento de capitais: "os riscos são altos nos setores imobiliário, de notários e conservadores e de comerciantes de bens de alto valor unitário. […] Uma outra vulnerabilidade importante […] é a que resulta da ausência de informação, nomeadamente, embora não só, no setor do imobiliário e na criação de entes coletivos". É preciso fazer um desenho? 
E o que ganhamos em troca desta porta escancarada para a corrupção e a lavagem de dinheiro, com riscos acrescidos para a própria segurança da União Europeia? Empregos diretos criados pelo esquema, através da atribuição de vistos pela criação de pelo menos dez empregos: 17 vistos no total, responsáveis pela criação de 213 empregos. 213 empregos em oito anos. Quer um termo de comparação? Há 230 deputados no Parlamento. Desde que o esquema foi criado, os eleitores já atribuíram esses 230 empregos duas vezes, em 2015 e 2019. Mas talvez haja aqui alguma simetria cósmica, porque seguramente vários dos empregos que os Vistos Gold ajudam a manter (e que não contam para a estatística) estão no próprio Parlamento!"

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