foto de Pedro Agostinho Cruz, que me convidou para o acompanhar na entrega, que fez no passado dia 9 a este velho e incansável lutador pelo progresso da nossa Figueira, de um exemplar do ALERTA COSTEIRO 14/15. |
Nos últimos dias, através dos jornais e outros órgãos de
informação, tomámos conhecimento de que, comemorando-se em 24.06.2015 o dia
anual do Município da Figueira da Foz (Portugal), para além dos habituais
festejos e folias de praia, localmente tradicionais — e também uma
"Procissão e tradicional Benção do Mar" [sic]... (que, de facto, não
tem nada de verdadeiro, pois é uma mentira que foi inventada, para ser
"tradicional", por volta do ano de 1998 [!], ao mesmo tempo da
preparação da Expo de Lisboa…) —, foi também agora celebrada, nesse mesmo dia
24.06.2015 (numa cerimónia solenizada à maneira local, numa instalação que
parece que se chama "Centro de Artes e Espectáculos Pedro Santana
Lopes"...), uma atribuição de distinções honoríficas, e homenagens, conferidas
a noventa e oito (98) entidades, instituições e pessoas individuais desta
cidade (segundo o jornal, tratou-se de "...98 entidades repartidas entre
funcionários do Município, entidades e personalidades figueirenses, PMEs",
etc.).
O Centro de Estudos do Mar e das Navegações Luís de
Albuquerque (CEMAR) — a pequena associação científica privada que, neste ano de
2015 (desde 27 de Janeiro), por acaso, está a celebrar os vinte (20) anos da
sua fundação (pois foi criada, por escritura pública assinada no salão nobre da
Câmara Municipal da Figueira da Foz, em 27.01.1995, e tendo como primeira sede
o Forte de Santa Catarina, na Foz do Mondego) —, congratula-se portanto com o
facto de que, ao que parece, nesta cidade, são consideradas como existentes e
como homenageáveis (e em números tão significativos) tantas entidades,
instituições e pessoas que tão publicamente se prestigiam localmente como
merecedoras de tais distinções e homenagens municipais. Mas não pode, nem deve,
deixar de lamentar que não tenha sido tida em conta a sugestão, que atempada e
discretamente havíamos formulado (perante quem havíamos julgado que dirigia e
representava a cidade), de que fosse homenageado, em vida, neste ano de 2015,
um homem como o nosso Exº. Amigo (e Associado Honorário do CEMAR) Senhor Manuel
Luís Pata, o homem a quem a Figueira da Foz deve um capítulo tão importante da
sua História Marítima como é a publicação dos três volumes sobre a Pesca do
Bacalhau pelos Navios Figueirenses (uma actividade que, no passado, foi tão central,
tão importante e tão emblemática para a economia, a sociedade e a identidade
local figueirense); e a quem a Figueira da Foz deve o esforço para a
organização do movimento cívico que, ingloriamente, tentou salvar da destruição
o último navio bacalhoeiro figueirense (o "José Cação", antigo
"Sotto Mayor", que acabou por ser entregue para a sucata); e a quem a
Figueira da Foz deve (em parceria com o seu conterrâneo Capitão João Pereira
Mano) o esclarecimento do equívoco e do erro científico (que, nas últimas
décadas do século XX, estava cada vez mais disseminado, avolumado, e
generalizado… por estar a ser doutoralmente repetido a partir dos
"milieus" da "comunidade científica"…) de se andar a chamar
"Xávega" [sic] e "Barco da Xávega" [sic] à "Arte"
e ao "Barco da Arte" ("Barco do Mar") da Beira Litoral;
etc..
Enfim, o Senhor Manuel Luís Pata, neto, bisneto e trineto de
pescadores, a quem a Figueira da Foz deve tudo isso, e muito mais do que isso,
pela sua voluntariosa e inglória tentativa de defesa do Património Local, ao
longo de muitas décadas.
A quem a Figueira da Foz deve e, infelizmente, vai continuar
a dever.
De facto, o nosso Exº. Amigo Senhor Manuel Luís Pata, um
homem corajoso, e de opiniões desassombradas — e que, por isso, na Figueira da
Foz, é alguém que sempre muito admirámos, e continuamos a admirar —, é o homem
que em 1997, 2000, 2002, 2003, havia coligido, publicado, e re-publicado (com a
nossa colaboração, do CEMAR, que nos orgulhamos de então ter prestado) os
livros, que vão ficar para sempre, sobre a Figueira da Foz e a Pesca do
Bacalhau. E é o homem que, em 1998-1999, tentou em vão salvar da destruição o
último navio figueirense (e com uma denúncia cívica que, em 07.09.1998, chegou
a ter que ser feita em conferência de imprensa realizada na rua, na via
pública, à porta do Museu e Auditório Municipal…! [em mesas, e cadeiras,
fornecidas, à última hora, pelo Centro de Estudos do Mar...], devido à
proibição de utilização desse Auditório Municipal...). E é o homem que, além
disso — para além dessa sua defesa do Património Cultural e Histórico —, teve
sempre também a coragem de se manifestar em defesa do Património Natural e
Ambiental… apontando a catástrofe da acumulação das areias represadas pelo
molhe norte do porto comercial da Figueira da Foz (as areias que, ao longo das
últimas décadas, cada vez mais, afastaram a cidade do mar, destruíram o turismo
urbano, e fizeram falta, dramaticamente, nas outras praias, escavadas e
ameaçadas, do sul da Foz do Mondego).
E é o homem que, já antes disso, em 17.10.1997, se havia
prontificado a testemunhar, corajosamente, a destruição dos seis (6) exemplares
antigos de arquitectura naval — barcos tradicionais, seleccionados, obtidos, e
estudados, para fins museológicos, pelo próprio Arq. Octávio Lixa Filgueiras (a
maior autoridade científica, em Portugal, sobre arquitectura naval tradicional
em madeira…) —… os seis (6) exemplares únicos e insubstituíveis (incluindo um
"Meio Batel-do-Sal", verdadeiro… e um "Barco-da-Arte",
grande, da Leirosa…) que foram destruídos no pátio interior do Museu Municipal
da Figueira da Foz.
Não somente pela publicação dos seus três volumes, mas
também por todas estas outras razões, acima citadas — pela denúncia da
destruição do património de Arquitectura Naval local, e pela denúncia da
destruição do património ambiental marítimo (aquilo que, nas suas próprias
palavras, veio a ser, em frente à Figueira da Foz, "a Praia da
Calamidade"… —, Manuel Luís Pata, descendente de uma das primeiras (se não
a primeira) família de patriarcas pescadores ilhavenses que no século XVIII
criaram as povoações a sul da Foz do Mondego (Cova, Gala, etc.), é credor de um
reconhecimento, na sua cidade, que ainda não lhe foi prestado.
Pela nossa parte — pela parte do Centro de Estudos do Mar -
CEMAR (em que, desde há muitos anos, já nos orgulhávamos de o ter como
associado) —, fizemos o que nos competia: neste mesmo ano de 2015, em
29.03.2015 (por ocasião do vigésimo [20º] aniversário do próprio Centro de
Estudos do Mar, que, neste mesmo ano de 2015, estamos a celebrar), atribuímos
ao Senhor Manuel Luís Pata o título de "Associado Honorário" do
CEMAR, pelo seu Mérito Cultural e Histórico (mérito, acrescido, de alguém que é
um autodidacta).
Não é demais repetir que, para além dessas matérias
culturais, também nas outras matérias, as do Património Natural e Ambiental
(dinâmica sedimentar das areias, porto comercial errado, erosão costeira), foi
Manuel Luís Pata quem chamou as coisas pelos seus nomes — chamou bois aos
bois... —, pronunciando-se sobre o maior e o mais grave de todos os problemas
da Figueira da Foz, o problema que levou à decadência e ao desaparecimento, no
todo nacional, desta região e desta Cidade de Mar.
O problema que, ainda hoje (e, agora, mais do que nunca),
continua a ser decisivo, momentoso, e grave, para o Presente e o Futuro da
Figueira da Foz e da sua praia… Mas perante o qual, em vez de se procurarem e
se encontrarem quaisquer soluções verdadeiras e efectivas, só se têm aumentado,
acrescentado, e avolumado, os maiores erros vindos do Passado… Assim se
agudizando as contradições, eternizando os impasses, e se originando as
situações insustentáveis, absolutamente previsíveis, e de extraordinária gravidade
(que nenhuma hipocrisia pseudo-"ambientalista" vai poder disfarçar),
que cada vez mais se aproximam, nos desenlaces do futuro próximo dessa
"Praia da Calamidade" que é, infelizmente, a da Figueira da Foz.
Em suma, para além da dramática gravidade da catástrofe
cultural que é o estado de destruição, abandono, e desprezo, do Património
Cultural e Histórico Marítimo da Figueira da Foz (uma área em que este homem,
só, absolutamente autodidacta, e descendente de Pescadores, fez o que pôde, e
fez muito, somente com os seus próprios meios, enfrentando todas as
contrariedades que lhe foram movidas nos círculos que eram supostos defender e
preservar esse Património Cultural), também acerca da calamidade ambiental
irresolúvel em que a Figueira da Foz desde há décadas se encontra sepultada
(com toda a gente a fingir que não vê, quando a areia, tanta, está à frente dos
olhos…) foi Manuel Luís Pata quem tomou sempre posição pública,
voluntariosamente, corajosamente, à sua maneira.
Foi ele quem disse o essencial: "a Figueira da Foz
virou costas ao Mar…!".
É essa coragem que distingue a verdadeira intervenção e
serviço de utilidade pública (e da parte de quem nem sequer recebe, para fazer
tal intervenção cultural ou ambiental, quaisquer remunerações, reformas, etc., pagas
com dinheiro público…!). É a coragem de quem tenta voluntariosamente ser útil à
sua terra, metendo ombros a tarefas e a obras que são trabalhosas e meritórias
(em vez de viver simplesmente em agrados e ambições de carreirismo pessoal, em
intrigas políticas fáceis, nos bastidores, acotovelando à esquerda e à direita,
à sombra do poder do momento). É a coragem de quem é capaz de se pronunciar,
não menos voluntariosamente, sobre tudo o que é verdadeiramente importante, não
receando, para isso, tocar nas feridas dos assuntos verdadeiramente graves e
polémicos (em vez de mostrar a cara em artigos de jornal para escrever sobre
insignificâncias pessoais e diletantismos, "culturais",
pseudo-"progressistas").
É a coragem — típica de Pescador…? (mesmo quando um pouco
brusca…?) — de quem é capaz de tentar mesmo fazer alguma coisa, a sério (mesmo
que não consiga…)… e, para isso, é capaz de tentar enfrentar, de frente,
qualquer vaga, seja de que tipo for. Em vez de viver no (e do) manhoso
tacticismo, no (e do) elogio mútuo, no (e do) tráfico de influências, nos
bastidores do poder que anseia e rodeia, e ao qual espera chegar rodeando.
Enquanto todos os verdadeiros problemas, os do Presente e do
Futuro, culturais ou ambientais, ficam por resolver (e, por isso, se agravam)…
e todos os verdadeiros patrimónios, os do Passado, culturais ou ambientais, se
vão perdendo com o tempo ("como neve diante do sol")... Enquanto as
nuvens negras das catástrofes, quer culturais e sociais, quer ambientais e
ecológicas, se avolumam, em dias de sol, no horizonte próximo.
A Cultura e a Natureza estão, talvez, estranha e
paradoxalmente ligadas de uma forma muito íntima, de maneira muito simbólica:
quem sabe se, um dia, na luxuosa pobreza extrema, e na merecida desgraça
última, quando se enfrentar as vagas assassinas de um tsunami que venha a
devastar uma área de ocupação humana ao nível do mar — mas… será possível que
haja alguém que, em pleno século XXI, esteja a querer legitimar
("ecologicamente"…!!!), e a, assim, adensar e avolumar (!) uma
ocupação humana (dita "turística", e "cultural"… e, até,
"ambiental"…! [e, na verdade, pré-imobiliária…?!]) ao nível do mar…?!
—, irá ser lembrada, e recordada, com saudade, a geometria fina e a silhueta
esguia, cortante, dos antigos "Barcos-da-Arte" ("Barcos-do-Mar"),
em "meia-lua"… Que, nesse dia, já não existirão… nem existirá ninguém
que os saiba construir...! (embora, provavelmente, vá continuar a existir gente
funcionária e política, paga com dinheiro público, que estará pronta para
tentar continuar a viver à custa dessas tais matérias, "culturais", e
"ambientais", dos barcos antigos, e das praias ecológicas…).
Com o nosso Exº. Amigo Senhor Manuel Luís Pata, aprendemos,
há muito tempo, o lema que ele sempre proclama (e que nós sempre repetimos):
"O Mar não gosta de cobardes… não gosta de quem lhe vira as costas…".
Centro de Estudos do Mar e das Navegações Luís de Albuquerque (CEMAR)
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