sábado, 5 de outubro de 2024

Tragédias não são espetáculos virais

"O triplo homicídio ocorrido, esta quarta-feira, em Lisboa prova a cegueira dos algoritmos e não deixa dúvidas sobre a irresponsabilidade dos gigantes das redes sociais e a complacência dos poderes executivos.

Poucos momentos depois do ataque à queima-roupa que matou Carlos Pina, Bruno Neto e Fernanda Júlia, no Bairro do Vale, na Penha de França, já circulavam imagens do crime. Fotografias e vídeos das vítimas expostas sem qualquer pudor, um corpo a lutar pela vida ainda a mexer-se, pormenores da execução, áudios com sons de vingança e com teorias sem qualquer confirmação. À minha conta de WhatsApp chegaram três versões do caso num espaço de minutos.

A negligência das plataformas das redes sociais fica mais uma vez patente neste caso. É apenas mais um, antes do próximo. Governos e legisladores continuam sem qualquer intervenção séria que acabe com esta crueldade. Resta saber se têm interesse em fazê-lo. Não parece.

É dever de um qualquer Estado democrático, mas também das sociedades livres, combater esta violência digital. Caso contrário, continuaremos a conviver com uma falha coletiva, que inclui empresas privadas e organismos públicos.

Violar a dignidade e a privacidade das pessoas de forma tão brutal tornou-se banal. As redes sociais continuam a desumanizar vítimas e a transformar tragédias em espetáculos virais, face à ausência de uma regulamentação e fiscalização séria.

Todos já percebemos que os alegados sistemas de identificação de conteúdos impróprios, que os responsáveis das tecnológicas apregoam exaustivamente, não são suficientes nem eficazes.

O triplo homicídio em Lisboa não é apenas um crime. Demonstra o falhanço humano e tecnológico."

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