Tenho amigos em todos os quadrantes ideológicos.
Há pessoas, porém, que só têm amigos de direita ou de esquerda.
Confesso que esse tipo de gente, é a espécie que me assusta mais.
A ideia de que duas pessoas, para terem um bom relacionamento de amizade, têm de partilhar as mesmas opiniões políticas, a meu ver, é de uma perversidade cruel e desumana.
Ser do contra é algo que frequentemente aparece numa conversa para descrever alguém.
Pois bem, como hoje acordei bem disposto, admito: sou do contra.
Umas vezes de forma assertiva; outras vezes não.
Isso não dignifica a minha imagem?
Esse problema, para mim, não existe. Putativamente, poderia ser levantado se desse importância à minha imagem. O que não acontece.
Como já devem ter percebido, polticamente falando, sou um peixe fora de água.
Porém, não pensem que, alguma vez, tive a tentação de atirar-me lá para dentro.
Mais a sério.
Como é óbvio, não sou sempre do contra. Mas gosto de ser: sobretudo, quando isso me diverte.
É claro que isso tem efeitos. Confrontar quem nos rodeia, colocando questões concretas, apenas pelo prazer de o fazer, pode, se for bem feito, despertar alguma coisa. E, quando menos se espera, as surpresas acontecem e as pessoas revelam-se. A máscara, sem nínguem ter pedido, cai. E cai nas situações mais aberrantes.
Ontem, ao realizar um dos meus sempre agradáveis passeios ao longo do molhe sul do estuário do Mondego, vindo do nada, ouvi um peixe confidenciar-me: «isto aqui pelo Cabedelo não anda nada bom. Está uma boa merda...»
Lembrei-me do Padre António Vieira e respondi aos irmãos peixes: «resta fazer-vos uma advertência muito necessária, para os que viveis nestes mares. Como eles são tão esparcelados e cheios de baixios, bem sabeis que se perdem e dão à costa muitos navios, com que se enriquece o mar e a terra se empobrece. Importa, pois, que advirtais, que nesta mesma riqueza tendes um grande perigo, porque todos os que se aproveitam dos bens dos naufragantes, ficam excomungados e malditos.»
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