"Durante o último fim de semana, o PSD do Seixal organizou uma conferência chamada Avante Sombra. Os participantes abordaram temas que, com certeza, julgam muito relevantes para as pessoas do concelho. Foram eles o fim do comunismo, a ameaça vermelha e a análise dos regimes venezuelano e norte-coreano. Fica assim evidente que os dirigentes do PSD pensam que os munícipes do Seixal vivem preocupados com a possibilidade de Nicolás Maduro e Kim Jong-un exportarem a sua revolução para estas bandas e nada com as suas condições de vida.
A vontade de brincar com tão alucinado
evento é irresistível. Mas não é avisado olhar
para isto como se fosse um fenómeno isolado.
Os acordos com o Chega nos Açores escancararam a porta da legitimação desse partido,
mas também foram um livre-trânsito para
alguns setores do PSD enveredarem por linhas
que tradicionalmente nada têm que ver com o
partido.
Não foram, porém, estes setores, digamos,
mais radicais que fizeram com que Suzana
Garcia se candidatasse pelo PSD, como também não foram eles que espalharam por Lisboa
cartazes a anunciar que o sistema ia tremer e a
insultar os outros partidos.
Aliás, o discurso anacrónico e que nada diz
aos eleitores da constante lembrança dos regimes comunistas, de que vivemos numa espécie
de socialismo e temos as nossas liberdades
coartadas é, mesmo assim, menos grave do
que a conversa de ser contra o sistema – mais
a mais porque aquele é tão disparatado que só
descredibiliza.
Se dúvidas houvesse de que Rio concorda com este discurso, ele veio esclarecer que,
disse-o na semana passada, sempre foi contra
o dito sistema.
Infelizmente, nunca ninguém pergunta a
estas pessoas, nomeadamente ao presidente do
PSD, o que é ser contra o sistema.
Está contra
a democracia liberal? Contra a separação de
poderes? Contra a Constituição? É que nisto a
extrema-direita não tem dúvidas: é contra.
Tenho nisto uma certeza e uma interrogação. A certeza é a de que jamais o PSD
regressará ao poder se enveredar por este caminho de nada ter para propor às pessoas e de
preferir fazer regressar fantasmas de ameaças
comunistas ou patetices do género. Mas pode
ser pior ainda, pode insistir no discurso de ser
antissistema. A interrogação é se isto se deve ao
desespero de não estar no poder – e não parecer estar próximo – ou se corresponde a uma
mudança estrutural do partido.
Duvido que corresponda a uma mudança
estrutural. A maioria dos militantes e habituais
votantes rejeita o discurso antissistema e, cedo
ou tarde, imporá às lideranças um discurso
diferente.
E importa referir que Rui Rio, por muito
que tenha anunciado um recentramento e um
regresso à matriz social-democrata, acabou
por promover pessoas como Suzana Garcia,
acordos com o Chega e repetiu (não é novo em
Rio) o discurso antissistema.
Por outro lado, o desencanto e o afastamento dos moderados podem conduzir à vitória
dos antissistema e aí a semelhança entre esse
PSD e o Chega será evidente. Claro está que
nesse momento a reconstituição do centro-
-direita já estaria em curso (já há sinais disso)
e o PSD da sua herança só teria o nome. Esse
processo, no entanto, é lento e estando apenas
presente no espaço partidário essa alternativa,
seria muito mais audível e conquistaria mais
espaço. Não o suficiente, queiram os deuses,
para sonhar com o poder, mas, mesmo assim,
forte.
Na semana passada, escrevia aqui que a
conversa de que somos governados pela extrema-esquerda e de que já não vivemos numa
democracia liberal perpetuará o PS no poder.
Mas pode ser pior, podemos estar a falar do
fim do PSD. E não, não apenas como partido de poder, mas como uma organização que
pode reivindicar a herança de Sá Carneiro, Pinto Balsemão, Cavaco Silva e mesmo de Durão
Barroso ou Passos Coelho.
Os partidos vivem e morrem, como qualquer organização humana, a questão é o vazio
que deixam e os efeitos que provocam. Para a
nossa democracia, o possível fim do PSD como
o conhecemos seria um problema muito grave
e com consequências pouco menos do que
catastróficas."
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