Da desgraça que todos os anos (este ano começou cedo...) se abate sobre as pessoas e as nossas florestas, pouco tenho para acrescentar.
Direi que a última noite foi terrível.
Senti-me completamente esmagado perante as tremendas imagens e o indizível desespero dos que não morreram, mas perderam em minutos os, tantas vezes, míseros proventos de uma arrastada e penosa vida de trabalho.
Pouco há para acrescentar, repito.
Cuntudo, há que reconhecer que, em dias de tal calor, é inevitável que aconteçam os incêndios.
Já sobre a intensidade, extensão e gravidade deste incêndio, começa a ser insuportável ouvir falar da falta de prevenção, cuidados na limpeza das florestas, etc., como todos os anos, invariavelmente, ouvimos falar, sem que entretanto alguma coisa tenha sido feita para minimizar a sempre anunciada tragédia.
A maioria dos incêndios e da destruição dá-se nas florestas.
Florestas, essas, de proprietários desconhecidos, portanto, tecnicamente, florestas abandonadas, ou em pequenas propriedades de pobres, ou mesmo de remediados que até cuidam dos seus pinhais ou eucaliptais, mas que, dada a vizinhança com as leiras dos pobres, vêem o que é seu ser igualmente destruído.
Já as florestas dos muito ricos, como as grandes empresas de pasta de papel, só por grande acidente são beliscadas, pois as grandes áreas das explorações permitem investir nos cuidados continuados de limpeza, abertura de caminhos, construção de corta-fogos, vigilância, meios privados de combate a focos de incêndio, etc.
No meio de toda a tragédia que ainda está a decorrer, uma coisa é indiscutível: a coragem interminável e a entrega admirável dos corpos de bombeiros, que quando não estão a lutar contra os incêndios, estão a lutar contra a falta de meios que lhes são proporcionados pelo Estado para combater esses mesmos incêndios.
Meios, isto é o tal material que está sempre quase a chegar, ou em períodos eleitorais, ou nos flashes de entrevistas a autoridades oficiais, durante os fogos e para as câmaras de televisão.
Entretanto, a catadupa de notícias sobre incêndio e perdas materiais e humanas entope os telejornais.
Foi o Secretário de Estado a ter de dar cara pelo maior desastre de que tenho memória.
Ontem ao chegar a casa, próximo da meia-noite, ao ouvi-lo, comovi-me: fiquei mesmo lavado em lágrimas.
Vi pessoas idosas, que vivem sozinhas a mostrar resistência, até ao último momento, para abandonar as suas casas.
Neste momento, estou a ouvir Rebelo de Sousa em directo na televisão: a hora é de dor, mas também de combate e resistência, de reconstrução.
Passadas horas continuo com um nó na garganta.
Confesso que ainda estou completamente quebrado, angustiado, revoltado.
Marcelo Rebelo de Sousa considera ser normal que se sinta “injustiça”, já que a tragédia atingiu um “país rural, isolado, com pessoas mais idosas, mais difíceis de contactar de proteger e de salvar”.
Esta tragédia atingiu os portugueses de quem menos se fala: os idosos, os esquecidos, os abandonados e isolados.
"A nossa dor não tem medida".
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