"Lembro-me de no
ensino secundário ter
tido um professor de
história que numa das suas
fascinantes e muito debatidas aulas nos disse, em tom
profético, que viria a altura
em que os pobres e despojados deste mundo bateriam
à porta da Europa. E que
não haveria maneira de os
parar; viriam em barcaças
improvisadas, invadiriam os
caminhos, atravessariam
cidades.
Passaram quase quarenta anos e assisto agora à
descrição exacta que o meu
professor fazia em forma
de aviso: “Milhares hão-de
morrer e a sua morte vai
pesar sobre as nossas consciências, dizia, mas nada os
deterá”. No seu livro Pátria
Apátrida, Sebald, o escritor
alemão falecido no início do
século, escrevia em 1990
que “a pátria é um conceito
que surgiu quando esta
deixou de ser o sítio onde se
está e indivíduos e grupos
sociais foram obrigados
a virar-lhe as costas e a
emigrar”.
Isto é assim, não só para os
países que são demandados
e que exaltam o conceito,
como para os que, fugindo
à fome e à guerra, passam a
ver a sua pátria como o lugar
onde querem estar. Para os
sírios que caminham agora
nas estradas da Hungria, a
sua pátria é a Alemanha. O
que me perturba é concluir
que os grandes estadistas
dos últimos quarenta anos
ou não tiveram bons professores ou não leram o que
deviam. Pior, é verificar que
ignoram as lições da história.
Se assim for, este êxodo
ainda vai dar muito que falar."
Em tempo.
Esta crónica do vereador António Tavares, hoje publicada no jornal AS BEIRAS, alerta para a verdadeira face da sociedade.
Ao longo da vida, o homem contraditório vai mostrando diversas máscaras - do homem revolucionário, ao homem reaccionário, amado e criticado, polémico e sentimental, obcecado pelo amor e pela morte.
Também a mim o que me perturba - e muito - "é concluir que os grandes estadistas dos últimos quarenta anos ou não tiveram bons professores ou não leram o que deviam. Pior, é verificar que ignoram as lições da história."
O que me leva a concluir que só no rosto hirto e solene da morte, fica o verdadeiro rosto do homem.
A maior dignidade da morte é física. Nunca o homem é tão belo e verdadeiro como quando está morto. Porque tem então assegurada a eternidade, é na morte que o homem tem o seu rosto verdadeiro. Na vida, usa máscaras sucessivas e contraditórias.
No fundo, só a morte acaba por revelar a verdadeira face do homem.
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