domingo, 4 de março de 2012

Lisboa

foto Pedro Cruz
o amor não somos nós que o temos
é-nos dado
muito antes de termos nascido
talvez verdadeiro  autêntico
como o encontro do mar e da luz
depois   muito depois
quando os teus braços   os teus seios
chegaram até mim
já estavam perdidos
já não existiam
o meu rosto deformado   atroz
já não te podia olhar
mas os meus olhos   esses sim
ainda te viam como antes
como tu eras quando não existias
só os meus olhos
só os meus olhos
as mãos   essas   sem dedos
esfoladas   esfaceladas
de tanto esperar
nunca te encontraram
e   na grande planície do medo
ficavas tu   que não existias
o meu corpo   belo   perdido
sem rosto   muito pálido
partiu então
entre a nuvem e a sombra47
maravilha de verdade
mas perdido na praia do sonho
embalado nas algas
com muitos animais marinhos no sexo
com um rasto de luas
que sempre   sempre
o acompanharão
apenas duas gotas de sangue
pequenas   rutilantes
os meus olhos   meus olhos
sempre os meus olhos

Mário Henrique Leiria

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