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segunda-feira, 22 de abril de 2024

O que é “Ficheiros Secretos”, um espectáculo de Luís Osório?

Sábado à noite, entre curioso e intrigado (um amigo meu, que muito prezo, tinha-me confidenciado que nem morto lá ía...), fui ao CAE ver esta perfomance de Luís Osório.

A coisa prometia. Tinha como convidados Santana Lopes, Conceição Monteiro, Luísa Amaro e Cândido Costa.

“Ficheiros Secretos”, com o sub-título de "Histórias Nunca Contadas da Política e da Sociedade Portuguesas", é um livro  publicado pelo jornalista em 2021, que foi adaptado para os palcos, num espectáculo difícil de definir, mas que tem esgotado as salas por onde passa.

Ao que li, "é uma performance inédita de um jornalista e escritor reconhecido que arrisca agora o que nunca foi feito. Luís Osório assume o papel de narrador da história recente de Portugal, convocando para o palco memórias de personagens marcantes como Álvaro Cunhal, Mário Soares, José Saramago, Amália Rodrigues, Francisco Sá Carneiro, Jorge Sampaio, entre muitos outros. 

O autor conduz a audiência numa viagem pelo último século português e pela vida de alguns dos protagonistas que marcaram o nosso tempo. 

Uma viagem partilhada com o público e com convidados absolutamente surpreendentes."

Tudo isso se concretizou. No sábado passado, Luís Osório esteve completamente exposto e sem rede. Até teve uma "branca", breve (na Figueira é assim: é tudo "breve"), que ultrapassou com toda a naturalidade, quando se queria referir a um episódio que envolvia Carmona Rodrigues, antigo presidente da Câmara de Lisboa e o nome não saía.

Frente ao público, foi ele, só, mais as histórias dos seus fantasmas - bons e maus. 

Mas, afinal, o que é “Ficheiros Secretos”?

Um espectáculo de segredos, confissões, medo e esperança?

Confesso que não sei explicar. 

Para mim, foi algo inaudito.

Algo que nunca tinha visto ou ouvido. Um desafio absolutamente incrível e espantoso, que Luís Osório coloca a si mesmo e que já foi presenciado por mais de 20 mil pessoas deste País.

Eu, fui uma delas. E saí do CAE a pensar sobre o que tinha presenciado e não consigo ainda explicar por palavras ao que tinha assistido.

Continua presente a entrada de Luís Osório na sala, trazendo uma mala vermelha, carregada de memórias de familiares, daqueles que o tratavam por Miguel.

Durante a exposição perante o público, desnudou-se e aos seus fantasmas - sobretudo o da mãe, que deixou de cantar no dia em que ele nasceu. Continuam presentes os pequenos episódios das figuras públicas trazidas à colação. Focou relações familiares, lutas interiores ou episódios engraçados.

Nestas pequenas histórias, Luís Osório mostrou algo importante: um contributo para a definição e a compreensão do País que somos, nas suas grandezas, misérias e imperfeições. 

Como ele, também acredito que “podemos saber os grandes factos históricos de trás para a frente, mas estes não têm a dimensão humana”.

Continuo a vê-lo desaparecer pela porta lateral do CAE, por onde tinha entrado, e continuo sem encontrar as palavras para explicar o que vi sábado passado, à noite, no CAE.

quinta-feira, 18 de abril de 2024

Mais arroz?..

Será que o Montenegro vai bater a perfomance do Costa?

«De acordo com o Correio da Manhã, a ex-jornalista da RTP, Patrícia Cerdeira, demitiu-se depois de ter sido confrontada pelo diário sobre as publicações que fez há alguns meses nas redes sociais, nas quais criticava o Ministério Público e a PJ e apoiava António Costa, ex-primeiro-ministro.    

Ex-assessora do ministro da Economia no último Executivo de Costa, Patrícia Cerdeira, segundo o jornal, referiu que as vítimas são quase sempre os governantes. "Esqueci-me de dizer uma coisa. Que nunca tenhamos o azar de cair nas mãos do Ministério Público", escreveu em dezembro do ano passado, no dia em que Marcelo dissolveu o Parlamento.»

sexta-feira, 12 de abril de 2024

IRS e SMN

"Montenegro fez o anúncio que marcou o primeiro dia de debate do programa de Governo, a descida do IRS já em 2024, mas decisões como as tabelas de retenção ficam para o próximo Conselho de Ministros."

O que falta saber? A anunciada descida de IRS era uma promessa eleitoral, mas depois da tomada de posse, o ministro de Estado e das Finanças alertou para os riscos orçamentais e somaram-se outros avisos para os riscos de desequilíbrio das contas públicas. O primeiro-ministro desfez as dúvidas: a descida de IRS avança mesmo este ano, mas não esclareceu uma primeira dúvida: à descida das taxas, haverá também alterações aos escalões de IRS?

Neste momento, nas televisões por cabo os debates são só sobre o IRS. E o salário mínimo?

O "governo compromete-se a aumentar salário mínimo nacional em linha com inflação e produtividade".

Dizer isto,  é desconhecer, do ponto de vista técnico, qual é a definição de “Salário Mínimo” e de para que é que este é fixado em algumas sociedades mais evoluídas do ponto de vista social.

O “Salário Mínimo” serve, TECNICAMENTE, para garantir que “alguém com um trabalho a tempo inteiro NÃO vive na miséria”. Se assim é, então o salário mínimo deve ser INDEXADO à INFLAÇÃO (aumento ou decremento do custo de vida) e NUNCA a quaisquer medidas de produtividade.

Lembram-se qual foi o governo "que baixou em Portugal o salário mínimo"?

Pois foi o governo de Passos Coelho e Paulo Portas que, em Setembro de 2012, baixou  salário mínimo, pela primeira vez, desde que foi criado. Esta foi uma consequência directa do aumento da taxa social única (TSU) em sete pontos percentuais, que se aplica a todos os trabalhadores de forma indiferenciada. 

Esta medida afectou cerca de 10% das pessoas que trabalham por conta de outrem. Na altura, o salário líquido bruto era de 485 euros. Líquido, deduzido da taxa social única de 11%, ficava em 431,65 euros. Passando esta taxa para os 18%, o salário mínimo líquido passou para 397,7 euros.

Tudo foi tratado por igual pelo governo PSD/CDS em Setembro de 2012: um trabalhador que ganhava cinco mil euros por mês, foi tratado da mesma maneira que um desgraçado que ganhava o ordenado mínimo. Brilhante

Como escreve Carmo Afonso hoje no Público, "vão aumentar o salário mínimo nacional porque o futuro será extraordinário...

É fundamental atentar no que diz o programa do governo sobre o aumento do SMN. Dizer que o objectivo do governo é aumentar o SMN é como dizer que o objectivo dos trabalhadores é que o SMN aumente. Não vincula ninguém a coisa alguma."

Ontem ouvimos Miranda Sarmento falar da relação entre o aumento do SMN e crescimento económico.

Isto é muito preocupante. "Os 900 mil trabalhadores que ganham o SMN, podem ir buscar um banquinho para esperarem sentados."

Miranda Sarmento, agora ministro das Finanças, desde Outubro de 2021 certamente que não mudou. Lembram-se dele? O presidente do Conselho Estratégico Nacional do PSD, Joaquim Miranda Sarmento, considerava que o  aumento do salário mínimo devia ser "substancialmente inferior" ao que tem sido admitido, que colocaria a fasquia nos 705 euros no próximo ano, isto é, em 2022.

"Dizer que o objectivo do Governo é aumentar o SMN é como dizer que o objetivo dos trabalhadores é que o SMN aumente. Não vincula ninguém a coisa alguma."

quarta-feira, 10 de abril de 2024

Abençoado Passos Coelho por continuares tão teimoso...

A primeira Aliança Democrática (AD) existiu entre 1979 e 1983. Foi fundada por Francisco Sá Carneiro, Diogo Freitas do Amaral e Gonçalo Ribeiro Telles. 

O sonho de Sá Carneiro quando fez a AD, era ter “uma maioria, um Governo e um Presidente”. Tal, porém, só haveria de concretizar-se décadas mais tarde, com Passos Coelho em São Bento e Cavaco em Belém. 

Em 2024, a Aliança Democrática (AD) é uma coligação política de centro-direita, formada pelo Partido Social Democrata (PPD/PSD), pelo CDS – Partido Popular (CDS–PP) e pelo Partido Popular Monárquico (PPM).

Os protagonistas, Luís Montenegro, Nuno Melo e Gonçalo da Câmara Pereira, para pior, são muito diferentes. 

Montenegro terá o mesmo sonho de Sá Carneiro - ter “uma maioria, um Governo e um Presidente”.  Neste momento, porém, existe um Governo e um Presidente. Falta-lhe a maioria.

Tem um Governo frágil, entalado entre o PS e o Chega, obrigado a falar com ambos. Não basta prometer diálogo com “todos, todos, todos”. É preciso dar os passos certos para concretizar esse diálogo, com muito trabalho de bastidores e capacidade de abertura e flexibilidade. Pedro Nuno Santos, se o quisesse, podia explicar a Montenegro como isso se faz.

É neste cenário, que vindo de um silêncio prolongado, em cerca de um mês, Pedro Passos Coelho  surge duas vezes perante as luzes da ribalta das televisões.

Num País onde pouco se lê jornais, para causar impacto o segredo é aparecer na televisão.

Não me lembro de ver o lançamento de um livro com tanto tempo de antena oferecido. De repente, o assunto do momento passou a ser Passos Coelho. A entrevista dada por Pedro Nuno Santos à CNN (pode ser vista clicando aqui) foi completamente silenciada pelos comentadores políticos.

Ontem o assunto foi Passos Coelho. Os problemas que interessam verdadeiramente ao País - por exemplo, o orçamento retificativo, o aeroporto, Costa na Europa, enfim tudo em que pouco mais de uma hora Pedro Nuno Santos falou sobre o futuro, incluindo as críticas à direita, ficou silenciado.

Mas falemos então de Passos Coelho.

Não sei se lembram, pois já longe vão os tempos. Em Janeiro de 2015, com a chegada de Marcelo a Belém, a «pressão sobre Passos crescia. Aos que pediam consensos para realinhar ao centro, o Passos Coelho respondia: "social-democracia sempre"

Lia-se no Observador: «Críticos vão ao próximo congresso dizer tudo o que pensam. “A liderança de Pedro Passos Coelho está bem e recomenda-se“. A garantia era dada por Teresa Leal Coelho, então deputada social-democrata, ao jornal. 

A vitória de Marcelo Rebelo de Sousa nas presidenciais veio pressionar o líder do PSD a reposicionar-se e a rever (ou não) a forma como lidará com o PS. Marcelo avisou que, se falhar o bom entendimento entre o PS e os partidos de esquerda, vai tentar convencer Passos a sentar-se à mesa com António Costa. Em teoria, tal colocaria o líder social-democrata numa posição delicada em relação ao partido – sobretudo em vésperas de congresso. A linha dura do PSD reconhece as boas intenções de Marcelo, mas deixa dois avisos: Passos está bem onde está e o PSD também.»

Olhando para os dados que estavam em cima da mesa, as expectativas de entendimento não eram as melhores, «sublinhava António Leitão Amaro, deputado social-democrata. “Não digo que os eventuais esforços do professor Marcelo” no sentido de aproximar os dois blocos, “estejam condenados ao fracasso”. Mas “não me parece” que o PS consiga fazer esse caminho, atira o ex-secretário de Estrado da Administração Local. E não é o único a pensar assim.»

O PSD considerava que "o PS tinha tinha assumido um plano e teria de o levar até ao fim. Têm de assumir as responsabilidades. Agora, de uma coisa estou certo: o Governo só vai durar até quando o PCP quiser”, dizia Sérgio Azevedo, também ele deputado do PSD, em declarações ao Observador.

O social-democrata reconhecia como legítima a vontade de Marcelo Rebelo de Sousa de pôr um travão à crispação que tomou o Parlamento. Mas o PSD não pode, simplesmente, dar a mão ao PS e caminharem, juntos, para o abismo.”Este Governo está a conduzir o país ao desastre. É certo que era urgente repor rendimentos – e era isso a que se propunha Pedro Passos Coelho. Mas não a este ritmo e, sobretudo, sem medidas compensatórias. Não há medidas compensatórias. Além disso, este Governo está a reverter tudo o que anterior [Executivo] tinha posto em prática. O PSD não pode simplesmente alinhar nisso“, atira Sérgio Azevedo, antes de acrescentar: “Não diria que o esforço de Marcelo Rebelo de Sousa esteja condenado ao fracasso, mas é difícil esperar que o PSD dê mais passos do que já tem dado“.

Durante a campanha presidencial, em entrevista à SIC, Marcelo Rebelo de Sousa chegou mesmo a dizer que faria “tudo por tudo” para que o Orçamento do Estado de 2016 (OE2016) passasse na Assembleia da República. E se à esquerda falhasse, tudo seria “tratado com a oposição”, leia-se PSD. No mesmo dia, no entanto, Marcelo acabaria por corrigir: se entre os partidos que apoiam o Governo socialista “não for possível” aprovar o OE2016, o então candidato presidencial esperava que houvesse “uma predisposição da oposição no todo ou em parte”.

Entre sociais-democratas, no entanto, essa possibilidade era longínqua. Aliás, Pedro Passos Coelho deixou-o claro, no dia em que o Governo PSD/CDS caiu no Parlamento. “Quando precisarem [PS] da nossa ajuda, demitam-se”. E, sendo Passos como é, não era provável que acrescentasse uma vírgula ao que disse. 

“Passos é muito teimoso”, lembrava na altura ao Observador, em off, fonte social-democrata.


Neste momento, citando o Diário de Notícias de hoje, "Passos Coelho agita PSD e Chega de olhos postos na corrida ao Palácio de Belém. Seis anos após renunciar ao seu mandato de deputado, sem nunca mais ser eleito para qualquer cargo, o antigo primeiro-ministro Pedro Passos Coelho agitou a direita com declarações vistas como um apelo ao seu partido para se entender com o Chega. E alimentaram especulações sobre a sua entrada na corrida às presidenciais de 2026."

Montenegro, neste momento tem “uma minoria, um Governo e um Presidente”

Com a deriva de Passos Coelho para a direita, em 9 de março de 2026, se Passos Coelho for o candidato presidencial apoiado pelo PSD, Montenegro, se anda for primeiro-ministro, arrisca-se a ficar apenas com “uma minoria e um Governo”...

terça-feira, 9 de abril de 2024

A Justiça nas mãos dos ricos


Ana Moreno

"À justa, lá conseguiu a direita subir ao poder para revigorar as furadas receitas neoliberais que, por via dos serviçais mídia e de um dedo indicador apontado para o INTA (There is no Alternative), continua a propagar o afamado “trickle-down effect” – o mesmo que, comprovadamente, vem aumentando a concentração da riqueza e a desigualdade no mundo inteiro.

Aquilo que o PS (que finge ser de esquerda) já vinha praticando há 8 anos, que levou a aumentos de PIB e a maior pobreza, será agora aplicado a fundo e descaradamente. Lucros privados, custos públicos, privatizações, Portugal vendido ao desbarato, o mercado em roda livre.

Logicamente, a escolha dos membros do governo faz jus ao que aí vem. Mas mesmo assim, custa a encaixar esta ministra da Justiça, uma advogada especialista em imobiliário no mega escritório fundado pelo seu pai, onde trabalhou 25 anos.

Na pasta da Justiça- a tal que é sonegada aos portugueses, já por via da morosidade – temos pois Rita Alarcão Júdice, filha e colaboradora de José Miguel Júdice, advogado e árbitro, inclusive em casos ISDS – ou seja, de arbitragem internacional. Para quem não saiba, o mecanismo ISDS é a alavanca a que só as multinacionais têm direito e que só por elas pode ser usado para processar Estados. Para quem não saiba, o ISDS providencia aos investidores estrangeiros uma “justiça” de tapete vermelho, para seu exclusivo uso. Para quem não saiba, essa “justiça” está acima das nacionais e refere-se unicamente a direitos especiais dos investidores (como “as suas legítimas expectativas de negócio”), consagrados em tratados internacionais de investimento e comércio; para quem não saiba, o ISDS restringe o direito dos governos a regulamentarem em nome do interesse público. Para quem não saiba, esta “justiça” não tem lugar perante tribunais institucionais; todo o processo está nas mãos de três advogados, um de acusação, outro de defesa e um terceiro que faz de ”juiz” e é escolhido pelos outros dois. Para quem não saiba, estas 3 pessoas podem rodar de função nos diferentes casos ISDS, abrindo a porta a conflitos de interesse; para quem não saiba, as indemnizações resultantes destes casos – e a serem pagas pelos contribuintes do país contra o qual o processo é intentado – são milionárias, e os próprios processos podem custar muitos milhares; para quem não saiba, está a decorrer um processo ISDS contra Portugal devido ao caso BES – ao abrigo de um acordo bilateral que Portugal assinou com as Maurícias em 1997, apesar de os queixantes serem dois fundos americanos; para quem não saiba, segundo o jornal Dinheiro Vivo, a acusação está nas mãos das firmas de advogados Fietta e PLMJ (da qual Júdice é fundador e os ex-governantes Pedro Siza Vieira (PS), e Nuno Morais Sarmento (PSD) são sócios.

O que todos nós, simples mortais, não sabemos, é o montante exigido a Portugal pelos fundos de investimento: estes casos são, muitas vezes, secretos. Mas uma coisa sabemos, já estamos todos a pagar os altos custos da “defesa de Portugal”.

A nova ministra até pode ser altamente qualificada e até pode vir a fazer um bom trabalho nesse bicho de sete cabeças que é a Justiça em Portugal. Dê-se-lhe o benefício da dúvida. Mas uma coisa é certa: é conivente com uma “justiça” toda especial para os ricos e poderosos, os tribunais VIP , e fez carreira a ajudar os ricaços a fazerem negócios imobiliários. A arraia miúda que continue na bicha para ter acesso à Justiça e para viver numa sociedade mais justa. Imagino que muitos considerem isto muito normal, mas é esta normalidade que está a estoirar a humanidade. Os efeitos estão à vista."

quinta-feira, 4 de abril de 2024

Para pensar...

"Emigrantes e imigrantes são uma e a mesma coisa. Apenas muda a perspectiva. Quem emigra, também imigra (ou vice-versa), no mesmo momento.

Para mim, será sempre um mistério como emigrantes/imigrantes votam em massa num partido hostil a imigrantes/emigrantes.

Talvez seja a confirmação de que, para muita gente, igualdade, direitos humanos, etc., são válidos apenas quando se trata de si próprio."

Cristina Torrão, via Delito de Opinião

Nota de rodapé.

sábado, 30 de março de 2024

Lugares-comuns, duplicidades, agendas escondidas no contínuo político-mediático

 José Pacheco Pereira no jornal Público

«Duplicidade – A duplicidade é o mais perverso processo em curso. Até à queda do Governo do PS, o silêncio era falta de transparência, agora é recato. Se este Governo fosse do PS, havia um clamor sobre um “governo de partido”, que “não se abriria à sociedade”, feito a partir do aparelho partidário, em que a tão elogiada “experiência política” seria vista como uma coisa negativa, etc., etc.»

Para ler o artigo na íntegra clicar aqui.

sexta-feira, 29 de março de 2024

Acarinhá-los? Não: enfrentá-los e derrotá-los

Miguel Sousa Tavares, in Expresso

«Despachado como pára-quedista para chefiar a lista da AD no Algarve, o vice-presidente do PSD, Miguel Pinto Luz, teve uma derrota tão previsível quanto humilhante, atrás do PS e do Chega. Talvez a pensar já na desforra a curto prazo, não perdeu tempo a namorar os eleitores do Chega, afirmando que eles têm de ser “acarinhados”. Mas, verdade seja dita, o instinto de compreensão e tolerância para com o milhão e cem mil eleitores do partido de André Ventura contagiou todos ou quase todos os que foram chamados a enfrentá-lo nas eleições de 10 de Março, começando logo por Pedro Nuno Santos. Era preciso, explicaram-nos, entender as razões da sua “revolta”, do seu justo desencanto com a política e o estado do país, de igual forma que a mesma compreensão, e até rendição, era necessária para com a revolta do braço armado do Chega — os polícias de camisas negras, a cantar o hino como patriotas de excepção e a ameaçar um motim público, todavia juntando à solidariedade óbvia de Ventura também a do Bloco de Esquerda ou de comentadores como Daniel Oliveira. Até parece que não perceberam o que têm pela frente: não se trata só de combater ideias “racistas e xenófobas”, como repetem preguiçosamente (e, como se viu, sem sucesso), mas de tentar deter uma onda galopante de demagogia desenfreada e populismo de taberna que tornará o país ingovernável e, por arrasto, a democracia indefesa.

Quando oiço os dirigentes políticos da democracia falarem do Chega, percebo até que ponto é restrita a liberdade de pensamento de quem faz da política a sua profissão e da necessidade de ganhar votos a sua sobrevivência. De quem, como Pinto Luz, precisa de namorar todos os eleitores, incluindo aqueles que os desprezam. Eles não podem dizer, nem sequer murmurando, aquilo que salta à vista, que é o inimigo a enfrentar: não André Ventura, que lançou a semente à terra e a rega e aduba inteligentemente, mas sim os que o seguem como a um Messias. Quem já viu desfilar na TV brasileira os inúmeros canais das Igrejas Evangélicas (que já têm também representantes na bancada parlamentar do Chega) não ignora as semelhanças: o problema não são os “sacerdotes” e “bispos” daquelas confrarias de bandidos da fé, mas sim o “rebanho” de descamisados sem causa, de alienados à mercê de aldrabões de feira.

O problema, meus caros senhores, não é André Ventura, o único verdadeiro dirigente da confraria: o problema é mesmo o povo, o povo do Chega.

Divido esse povo em duas categorias: os mal informados e os mal formados. Os mal formados são os tais racistas por doença mental, xenófobos por nacionalismo pacóvio e saudosistas do Estado Novo por conforto pessoal — são a minoria, os “intelectuais” do partido. Os mal informados, a grande maioria, são uma amálgama entre aqueles que, ignorando tudo sobre o estado do mundo, que confundem com as “verdades” que lhes debita o algoritmo das redes sociais a eles destinado, acham que Portugal só não é um país triunfante entre todos porque “eles”, os que nos governam, são corruptos e inimigos do povo; e, por outro lado, aqueles que sempre existiram e que representam o Portugal no seu pior: os maledicentes profissionais de café, os intriguistas, os invejosos, os frustrados, os falhados, os que nunca reconhecem o mérito alheio nem aceitam o mérito como critério na sua actividade — a grande coligação dos medíocres. Esses confundem democracia com prosperidade e preferem sempre o seu bem-estar pessoal à liberdade colectiva e individual. Esses — não todos, mas a maior parte — precisam que apareça alguém a dizer-lhes que o seu mal-estar nunca é culpa própria, mas “deles”, e que lhes explique que a frase de Kennedy deve ser lida ao contrário: “Pergunta o que o teu país pode fazer por ti.” Porque não se informam, ignoram tudo sobre a conjuntura internacional e pensam que só por mau governo e má vontade é que Portugal não é um oásis de prosperidade. Porque não pagam impostos nem se preocupam com a despesa ou a dívida do Estado, acreditam nos milagres económicos, tão evidentes e tão simples, que Ventura lhes propõe como alternativa. Porque não são livres, não se importam de viver na dependência e, porque não são sérios na sua forma de estar, não gostam de ver os imigrantes estrangeiros na “sua” terra, mesmo a fazer os trabalhos que eles não querem fazer e que o tal “sistema” que tanto odeiam os subsidia para não terem de fazer — ao contrário do que os seus pais e avós fizeram outrora, sem desfalecimento, durante a “prosperidade” do salazarismo, naquelas comunidades de emigrantes cujos descendentes agora, vá-se lá saber porquê, também deliram com o Chega, porque estão “revoltados”.

Revoltados? Revolta é uma coisa séria, isto não o é. Sim, há sobejas razões de revolta: uma globalização que ajudou os miseráveis mas desprotegeu os simplesmente fracos ou pobres; um capitalismo que desregulou o mercado, capitulando perante os grandes interesses e corporações; uma cultura woke levada ao extremo da idiotice que agride e afasta multidões de gente simples; uma geração de líderes sem rasgo nem coragem, com medo de dizer as verdades e de fazer opções claras — aliás, muito aterrorizados por um populismo que não sabem ou não querem enfrentar em campo aberto. Mas essa revolta, para ser séria, não pode alimentar-se da ignorância, da demagogia e do triunfo da mediocridade.

Não, eu não tenho a menor vontade de acarinhar os votantes do Chega, sejam eles quantos forem. Quem deve ser acarinhado são os outros: os que votam na democracia, os que acreditam na liberdade como primeiro valor da vida colectiva, os que não querem depender nem esperar por milagres ou embustes prometidos mas abrir caminho por si, pelo seu esforço, o seu trabalho, a sua criatividade, a sua contribuição para a sociedade. Os 80% que não votaram no Chega. Esses é que têm de ser acarinhados, apoiados, empurrados para cima, para que não fiquem apea­dos por falta de oportunidades, enquanto se gastam atenções e recursos com os inúteis sentados nos cafés a dizer mal do “sistema”, só porque desta vez descobriram as virtudes do sufrágio universal e lá se dignaram levantar o cu da cadeira e ir votar na alternativa do Dr. Ventura.

Não é um combate fácil, mas, sobretudo, tem de ser travado e tem de ser ganho — não dando tréguas na luta das ideias, no desmascaramento das mentiras e na exposição do embuste. E governando bem, governando a pensar no país e não no partido, privilegiando não quem mais exige mas quem mais retribui, não quem mais grita e tem mais palco mas quem mais produz, mais inova e mais arrisca. Acordando no que é essen­cial em cada momento e discordando no que é diferente, mas, acima de tudo, não tendo medo de contrapor sempre a verdade e os factos contra a demagogia e o facilitismo de dizer ao povo o que o povo quer ouvir e não o que o povo precisa de ouvir.

Cito e subscrevo aquilo que Francisco Mendes da Silva escreveu no “Público” há 15 dias: “O tal povo ‘esquecido’ que vota em Ventura é muito mais ouvido do que se pensa. Determina muito mais do que se julga as prioridades mediáticas do país.” Isto é um facto, e a imprensa também tem muitas responsabilidades no assunto. Esta nossa doentia tendência para dar sempre mais voz e mais importância a quem mais berra ou desfila pelas ruas a cantar o hino tem como contrapartida o esquecimento de todos os outros. E os outros são os 80% que não votaram no Chega ou os 50% que pagam IRS. Só num país desnorteado é que a prioridade são aqueles e não estes. Olhemos para cima e para a frente, não para trás ou para baixo. Deixem que o diga com todas as letras: aquela senhora que eu vi na televisão a dizer que ela, a filha e a neta desta vez tinham decidido ir votar e todas tinham votado no Chega, para “ver se as coisas melhoram”, não me inspira compreensão alguma — apenas desprezo. Vai fazer 50 anos que a senhora só podia votar em eleições de fantochada e aposto que não estava melhor na vida.»

quinta-feira, 28 de março de 2024

A vitória quase invisível do Chega

Aguiar Branco é da mesma famíla política: a direita...

"Ao apresentar Francisco Assis como candidato à Presidência da Assembleia da República, depois de um acordo furado entre o PSD e o Chega, o PS tinha conseguido que a pressão ficasse onde tinha de estar: nos dois partidos que assumiram ter uma maioria e depois se desentenderam.

Mas, apesar da pressão estar sobre o Chega, foi o PS que não a aguentou. Chamado a resolver os problemas a Montenegro quando Ventura lhe falha, era evidente que assumiria o papel de “adulto na sala”, como o discurso político pueril gosta de dizer, amarrando-se ao papel que já se percebeu que terá. Se tem agora, quando não está em causa nada de fundamental para os cidadãos, imaginem quando for a sério. O que eu não esperava é que juntasse à mera desistência da sua candidatura, que ficou em primeiro duas vezes, um acordo absurdo. Se o impasse continuasse o PS acabaria por eleger José Pedro Aguiar-Branco. Não iria criar um impasse institucional. Mas teria de fazê-lo sem negociações ou moedas de troca para além, talvez, da recusa do nome de Pacheco Amorim para vice-presidente da AR. Como o PSD só fez asneira, tudo estava a favor do PS, que podia determinar os seus tempos, sem se envolver em acordos. Tinha o candidato mais votado e os argumentos que PSD e Chega lhe ofereceram de borla. Mas não se limitou a retirar a pressão sobre o Chega ao fim de 24 horas. Foi muito mais longe, achando que estava a conquistar alguma coisa: firmou, do ponto de vista simbólico, um acordo de bloco central para uma legislatura. Isto depois do PSD o ter ignorado, ter preferido falar com o Chega e ainda ter acusado o PS de convergir com Ventura.

Sem mérito do PS, o PSD deu-lhe uma oportunidade rara e o PS não aguentou 24 horas de pressão. Este era um momento pouco importante para a vida das pessoas, mas vai a determinando o padrão do que vai acontecer. E o que vai acontecer é isto: quando o Chega saltar fora (e é o que fará sempre que sentir que o PS pode estar a ganhar a liderança da oposição), o PSD chama o PS, como plano B, e amarra-o. Este foi o teste. Nos outros vai ser pior, porque estarão em causa a continuação do governo e questões relevantes para a vida das pessoas. O que quer dizer que, se o padrão de ontem se repetir, o PS nunca conseguirá fazer oposição.

Porque é que este acordo é pior do que seria a simples cedência, com abandono da candidatura? Porque é uma fraude prática e uma tragédia simbólica.

Na prática, o PS fica com a presidência da Assembleia da República na segunda parte do mandato que só os muito otimistas acreditam virá a acontecer. Ou o PS acredita que esta legislatura dura até ao fim, ou está satisfeito porque partilhou um queijo suíço e ficou com os buracos.

Do ponto de vista simbólico, a imagem dos dois partidos do “sistema” a chegarem a um acordo para partilharem uma cadeira é, nas águas onde o Chega pesca, perfeita. É acompanharem a campanha digital desenvolvida pelas suas figuras mais populares nas redes – que os media desconhecem – para perceber como a bolha vive uma realidade paralela à dos seus potenciais apoiantes. Não há acordo que dê menor dignidade institucional ao “bloco central” do que este. A presidência rotativa (que não nasce de qualquer tradição europeia, mas como solução de emergência) é o melhor que o Chega poderia ambicionar desta novela. Como bónus, a traição não lhe valeu o voto do PSD no seu vice-presidente, o que prova que o objetivo preferencial de Montenegro, depois do desastre, era prender o PS, não era entalar o Chega.

Teria sido francamente melhor o PS limitar-se a deixar passar o nome, sem exigências vazias e simbolicamente prejudiciais. Na prática daria no mesmo e não passaria a pior imagem. E o PS nem sequer exigiu o afastamento de Pacheco Amorim da vice-presidência, aceitando que o PSD mantenha o apoio ao vice do Chega no preciso momento em que vai bater à sua porta para o salvar de uma traição do Chega.

O PSD percebeu que o PS não aguenta 24 horas de pressão, mesmo quando o jogo é a feijões. Sabe que só tem de o prender à “responsabilidade” de o suportar e de entregar a oposição ao Chega, preparando o caminho para o voto útil pela democracia na AD. Apesar do enorme dano na sua imagem, o PSD teve uma vitória que parece uma derrota – tem o PS mais amarrado. O PS tem uma derrota que parece uma vitória – perdeu autonomia, em vez de a ganhar. E o Chega tem os dois tão junto como os queria.

No fim, temos uma situação caricata: BE, PCP e Livre apoiaram o PS na sua candidatura à Presidência da Assembleia da República, sem falharem com um voto; o PS saltou disso para um acordo com o PSD depois do PSD ter feito um acordo com Chega que correu mal; e, apesar disto, o PSD manteve o voto no vice-presidente proposto pelo Chega depois deste lhe roer a corda. É como se existisse um respeito institucional gradativo que vai indo da esquerda para a direita. Não se pode criticar quem mais ganha com ele.

Resta esperar que Aguiar-Branco, que teria sido eleito à primeira se a liderança do PSD não se tivesse revelado tão incompetente, seja bom presidente numa AR que promete ser a mais difícil de sempre."

Daniel Oliveira

terça-feira, 12 de março de 2024

A leitura pode ser um murro no estômago para muitos à esquerda, mas vale a pena...

O texto é longo. Muitos, inclusive "das esquerdas", podem não gostar nem concordar com tudo. Mas está aqui muita reflexão. Muito incómodo. E muita verdade.
Por Miguel Carvalho: 10 IDEIAS SOBRE AS LEGISLATIVAS

«1 - Quem me conhece sabe que ando, no mínimo há dois anos, a dizer a frase que Pedro Nuno Santos proferiu esta noite, (exceptuando a percentagem, claro, pois não seria bruxo para adivinhar): não há tantos racistas e xenófobos em Portugal como se pretende fazer crer. Mas o que fez a esquerda para perceber a potencial base eleitoral do Chega e o seu crescimento? Zero. O Chega cresce à custa das mentiras, enganos e sonhos por cumprir que só responsabilizam PS, PSD e, em parte, o CDS. Mas também cresce porque há uma esquerda que julga que lhe basta ter uma agenda e imensas certezas sobre um povo que, como se nota, não conhece de todo. Nem escuta de verdade. 

Pedro Nuno Santos e Rui Tavares parecem ter sido os únicos a perceber, ainda que tarde, que há um trabalho que a esquerda tem de fazer (além de renovar-se, claro): falar com os eleitores, ouvi-los, mostrar que as ideias, mesmo quando são muito boas, também se explicam e podem demorar a convenver quem acumula muitos desencantos, de muitos anos, por esse País fora. Há um quotidiano devastador, no País rural e suburbano, que precisa de ser vivido e percebido, e para os quais não chega uma resposta "pronto-a-vestir". Uma esquerda que só tem agenda e acha que não deve discuti-la terra a terra serve para pouco ou nada.

2 - Para aqueles que achavam que antigos eleitores de esquerda nunca votariam no Chega, eis a resposta, contundente. Ou acham que aqueles 18 por cento vieram de Marte? Pois, é outra tese que ando a pregar há mais de dois anos, quase sempre em minoria. E nem um certo jornalismo que vive numa bolha consegue ouvir ou perceber. Sim, há muitos eleitores ex-PCP, ex-BE, ex-PS que votaram Chega. Ontem como hoje, por fé, sem terem lido Marx nem Mussolini. Mais do que estigmatizá-los, talvez fosse melhor ouvi-los e perguntar-lhes porque escolheram Ventura. Mas isso dá muito trabalho, não é?

3 - Insisto: uma boa parte dos eleitores do Chega é resgatável para o "lado bom" da democracia. Estão lá, foram lá parar pelas mais variadas razões. E é preciso entendê-las, dar uma solução a muitos problemas que se eternizam. Mas o que temos assistido, sobretudo à esquerda, é a um discurso de trincheira que varre tudo a estigmas. Não, não são todos saudosistas, racistas, xenófobos. Há muitos, mas não são todos. Bem sei que a mentira, a desonestidade, o discurso do ódio, anda de Ferrari. Mas o jornalismo e a política que se dão ao respeito não podem responder a estes fenómenos com o discurso de trincheira, estigmatizante, mesmo que a verdade ande, inevitavelmente, de trotinete nos tempos que correm. O escrutínio é necessário e urgente. Mas também deve ser metódico e inclusivo. Quem analisa o Chega não deve confundir quem manda com quem vota. Parece óbvio, mas a verdade é que não foi. O resultado está à vista.

4 - A esquerda tem de ser reponsabilizada pelo que ofereceu de bandeja hoje: a incapacidade de se entender após a "Geringonça"; uma maioria absoluta gerida com amadorismo e sem integridade em muitos setores da governação; posições controversas sobre a guerra na Ucrânia; uma agenda exposta de forma arrogante, como se bastassem as certezas quanto ao seu brilhantismo para que todo um povo as aplaudisse como avanços civilizacionais que são. Parte da esquerda não percebeu o povo português nos anos seguintes ao 25 de Abril. Não, a revolução não estava madura. Como nunca esteve. Passaram 50 anos e a culpa é apenas do povo que não percebe o bem que a esquerda lhe faz?

5 - Uma nota sobre o PCP: podem dar as voltas que quiserem, cultivar a vitimização do costume, repetirem o "olhe que não, olhe que não", mas a posição sobre a Guerra na Ucrânia é algo que eleitores de esquerda de sempre (fora os outros) jamais esquecerão. Na mentalidade de muitos, ainda habituados a pensar entre quatro paredes, a Rússia ainda é um bocadinho a União Soviética. E todos sabemos como Putin também adora ir buscar essas referências históricas enquanto financia a extrema-direita europeia. Mais: um partido que remete um João Ferreira para a humilhação de um 10º lugar em Lisboa merece parte do que lhe aconteceu. O PCP podia, em devido tempo, ter reunido o melhor do que hoje é o BE ou o Livre (e parte do PS até). Escolheu o seu caminho, sempre cheio de certezas sobre o que o povo quer e acabará por reconhecer à CDU. Agora o lema é resistir. Até quando? É assim que se defendem os trabalhadores? É assim que se oferece uma vida melhor? É assim que se representa quem não tem, nas suas vidas, outra representação que não seja dada pelo PCP? É assim que se defende Abril? "Mais 15 dias e isto piava de outra maneira". A sério, Paulo Raimundo? Já agora: na Festa do Avante dos 50 anos do 25 de Abril ainda teremos as barraquinhas da Coreia do Norte e do MPLA? É só para saber...

6 - Chamem-me doido, mas não estou a ver bem o que Ventura vai fazer com tanta euforia, além de berrar mais alto. Aqueles deputados todos vão servir para quê, exatamente, se Montenegro mantiver a palavra dada? Para já, só há um nome para isto: ejaculação precoce. Vejamos: para o governo não vai, acordo parlamentar não vejo como. Festeja o quê? Ah, sim,  tem uma bancada gigante, tem. E quadros? E políticas que não andem ao sabor da espuma dos dias e do ressentimento? Ao Chega resta-lhe sonhar que a legislatura dure muito pouco e possa culpar os outros do que não fizeram pela maioria estável de direita. Aí sim, pode ser que lhe saia a sorte grande.

7 - Montenegro fez uma boa campanha, apesar do CDS, do PPM e do cheiro das tintas. Mas o cordão sanitário ao Chega não é convicção. É tática. Montenegro deve ter percebido a tempo que os custos de um qualquer acordo com o Chega seriam devastadores. Temo mesmo que muita gente com peso abandonasse de vez o partido. E com estrondo. Que PSD sobraria para a História depois de um acordo que faria Sá Carneiro dar voltas no túmulo? No momento de avaliar o que pesava mais, escolheu o que pensava ser menos destrutivo para o partido. E vendeu-o como convicção. Fez bem.

8 - O crescimento do Chega deve também muito ao jornalismo "pingue-pongue", de pouco escrutínio de fundo e muito ruído, de declaração e contra-declaração, de casos e casinhos, sem distinção de envergadura e gravidade. Há um jornalismo que também esteve em jogo nestas eleições e perdeu. Prefere a preguiça do Portugal sentado, do comentário e do parlatório, e menos o País real, que há muito anseia por se fazer ouvir no centro das decisões, mas não é escutado. Despovoado, esquecido, negligenciado, deserdado, votou para se fazer ouvir. Não gostaram? É o que lhes resta. Se lhes chamarem "fachos" só vai piorar, acreditem...

9 - Excelente discurso de Pedro Nuno Santos. Goste-se ou não do estilo, foi claro, frontal. Percebe-se que não está ali para "engonhar" e a política precisa dessa transparência, para o bem ou para o mal. Mas o PS tem muito, muito para fazer para recuperar a imagem de um partido confiável, que não trai nem se prostitui de pantufas, quando lhe dá jeito. É o trabalho de uma geração, talvez possa ser esta. “Não há 18% votantes racistas ou xenófobos em Portugal, mas há muitos portugueses zangados que sentem que não tem tido representação, queremos reconquistar a confiança destes portugueses". Estas palavras são todo um programa. Começar agora é um pouco tarde, mas ainda não é o fim do mundo.

10 - O Livre fala para uma esquerda que se cansou do mofo da esquerda. Para poder ser esquerda de novo. Uma esquerda que aprende com os erros é coisa rara. Talvez haja caminho por aqui. Sem Joacines nem outros erros de casting ou de avaliação pode ser que este seja, para muitos, o início de uma bela amizade. (O Livre foi terceiro no Centro Histórico do Porto. O que é que está a acontecer nos subterrâneos da política que ainda não detetamos?).

P.S. Perdoem, mas não estou pessimista em relação à liberdade e à democracia. Pelo contrário. Acho que, para muitos, este é o princípio do fim, embora não pareça. E entretanto, pode ser que o tempo faça cinza da brasa e outra maré cheia venha da maré vaza...

P.S. II Para um artigo que escrevi há umas semanas e será publicado em breve na Divergente, escrevi: "Nos próximos atos eleitorais, a começar pelas Legislativas de março, o eventual aumento da participação eleitoral pode acabar no colo de uma reforçada direita radical ciberpopulista, que afronta a mediação informativa profissional e reduz o escrutínio jornalístico a terra queimada". E mais não digo, leiam o resto depois.»

segunda-feira, 11 de março de 2024

Como é que se lida com o Chega? A pergunta é agora remetida para o Presidente da República...

«Num belo dia de novembro, o Ministério Público decidiu brincar aos polícias e ladrões e fazer tombar um primeiro-ministro ainda não sabemos porquê. Quatro meses depois, temos um governo precário, um parlamento partido e a extrema-direita com quase 50 deputados. Obrigadinho, Lucília Gago. Luís Montenegro acabou a noite eleitoral de ontem como um vencedor derrotado e Pedro Nuno Santos falou como um derrotado vencedor. Pudera: o secretário-geral do PS livrou-se de ficar na posição impensada e quase impensável da AD. 
Montenegro propõe-se ficar com um governo sub-30%, diminuído e diminuto, governando com despachos, portarias e decretos-lei, cercado por uma oposição fortíssima, entre um PS que vai criticar cada palavra e um Chega que vai odiar cada vírgula. Dirá Marcelo que sim? E para quanto tempo? E para que resultado?
Não sabemos se Pedro Nuno Santos daria um bom primeiro-ministro, mas intuímos que dará um temível – e duplo - opositor: à AD e ao Chega. Vamos ter um Parlamento tonitruante e canibal, desordeiro e arruaceiro. Só que o problema não começa por ser esse: não será o mesmo Chega em versão XL. Porque o XL constrói um novo Chega.
É nisto que o Parlamento torce o rabo. Porque um milhão e cem mil portugueses podem até estar errados mas não podem ser ignorados. O Chega tem agora uma outra legitimidade para fazer exigências políticas e até para confrontar as três figuras cimeiras de Estado. Desprezar quase cinco dezenas de deputados eleitos é ignorar a sua própria derrota. Como é que se lida com o Chega? A pergunta é agora remetida para o Presidente da República.
A campanha serviu para rodar 360 graus e acabar como começou: com o receio que outra coisa não nasceria disto que não fosse o crescimento a galope da extrema-direita. Ei-la. Esse crescimento deve-se aos falhanços sucessivos de PS e PSD na governação, mas quem fez esta ocasião não foi o ladrão, foi o polícia. E nisso António Costa tem toda a razão: com umas eleições causadas por um Ministério Público que arrostou suspeitas mal fundamentadas sobre um primeiro-ministro, e um louco inimputável que decidiu guardar 75 800 euros em livros no Palácio de São Bento, vimos o desastre antes de ele acontecer. A campanha criou a ilusão de que talvez não viesse a ser tão mal. Foi pior.
Critiquei muitas vezes a governação de António Costa, que pouco fez além de subir o salário mínimo, descer os passes sociais e controlar as contas públicas, atirando dinheiro para cima do SNS sem o resolver e deixando a habitação e a educação paradas à chuva da degradação. Mas mesmo dois anos de maioria absoluta relapsa e decadente não se derrubam por linhas tortas – nem por processos judiciais sem fortes indícios. Só razões políticas teriam consequências políticas.»

quarta-feira, 6 de março de 2024

O voto útil na AD será útil a Ventura

 Carmo Afonso via Jornal Público

«Numa entrevista ao jornalista Hugo Gilberto, na RTP, André Ventura revelou finalmente quais "as forças vivas" do PSD que lhe tinham garantido que haveria acordo com o Chega, depois das eleições, se houver uma maioria à direita.

Nomeou Passos Coelho, Ângelo Correia, Rui Gomes da Silva e Miguel Relvas. Há aqui uma novidade. Na reta final da campanha Ventura decide indicar os nomes  de quem tem vindo a falar sem concretizar. Porquê?

Certamente porque a última semana não lhe correu de feição. Os números das sondagens começaram a descer. O líder do Chega precisa de dizer aos eleitores que o voto no partido vai servir para formar governo e não será um voto perdido.

Reparem que, a partir do momento em que indica nomes, seria muito mais fácil que qualquer um deles o defendesse. Mas todos têm vindo a defender um entendimento com o Chega e Passos Coelho chegou a afirmar que Luís Montenegro fará o que for preciso para formar governo. Não há desmentidos na calha.

A AD prepara assim o melhor de dois mundos.

Por um lado, tem Luís Montenegro na liderança a garantir que não fará acordos com a extrema-direita e que só será primeiro-ministro se ganhar as eleições. Com esta garantia de Montenegro a AD consegue captar os votos daqueles que não querem Ventura no governo. Isto significa que, neste momento, há pessoas que tencionam votar na AD com esse propósito. Há alguma habilidade dos responsáveis de campanha da AD nesta situação, deve ser reconhecido. Aquilo que o PS conseguiu nas últimas eleições, e refiro-me a canalizar os votos d quem não aceita o Chega no arco da governação, pode agora ser conseguido pela AD.

Ma o que acontecerá se Luís Montenegro não ganhar as eleições? Bom, nesse caso tudo é possível e refiro-me à própria saída de cena de Luís Montenegro. Pasos Coelho disse acreditar que, nesse cenário, "Luís" não deixará de formar governo. Mas parece mais provável que seja o próprio Passo Coelho a assumir as rédeas e a fazer as honras da casa.

O que é que isto significa?

Que - quer com uma vitória de Luís Montenegro, quer com a sua derrota - a AD pretende formar governo. Significa também que está a fazer tudo para ganhar as eleições e neste "tudo" incluo a captação dos votos de quem não quer o Chega. Mas esses votos servirão precisamente para fazer acordo com o partido, se os resultados das eleições assim o determinarem. Nessa altura Ventura dirá que nunca escondeu nada e o mesmo dirão todas as vozes  do PSD que já manifestaram abertura para o acordo.

O "Não é não" de Luís Montenegro pode transformar-se num sim. Os eleitores que votam AD não sabem para que servirá o seu voto e têm boas razões para admitir que servirá para fazer uma coligação com o Chega. isto é algo nunca visto. Conquistar o voto dos eleitores garantindo que tem a utilidade de de afastar a extrema-direita da governação e, ao emsmo tempo, ter tudo a postos para se coligarem com a extrema-direita, caso da primeira estratégia não resulte a vitória.

Depois das últimas eleições escrevi sobre o voto útil e os danos que provoca no sistema democrático. Aquela maioria absoluta resultou em grande parte do medo que os portugueses tinham de que Rui Rio se entendesse com o Chega. O PS soube tirar partido da indefinição de Rui Rio. Muitos eleitores que votaram PS não o teriam feito, se tivessem antevisto que estava em causa a obtenção de uma maioria absoluta. Desta vez pode estar em causa uma verdadeira traiçaõ. O voto útil na AD poderá vir a ser útil ao próprio Ventura.

Os barões do PSD e pesos pesados da AD estão muito à vontade. Se a coisa não for lá de uma maneira, acreditam que irá de outra. Fazem declarações inconvenientes e até bizarras.  É o país que é inseguro por causa da imigração, é o amor ao brasão das armas que serve para aferir quem são os verdadeiros portugueses e é o aborto que pode voltar a ser tema. Montenegro relativiza, por um lado e, por outro, diz que não tem importância. Chegou mesmo a afirmar que quem decide as propostas da AD é ele. A verdade é que não tem mão em nada disto. Porque haveria de ter a seguir à eleições?

Sobre propostas não se fala muito. Para mais, os resultados da governação socialista têm-se feito notar: Portugal bem posicionado nas agências de rating, escedente orçamental e crescimento económico acima da média europeia. Estes resulatdos drenam a argumentação habitual ad direita. Sobra é fé no desejo de mudança. E vai valer mesmo tudo para chegar a poder.»

Ventura teve mesmo "um amigalhaço" na Câmara da Figueira...

Em comentário deixado numa publicação da minha página do facebook, em que escrevi que "Ventura descaiu-se e deu o nome de alguns históricos do PSD que querem Governo com Chega se PS vencer eleições", Pedro Biscaia deixou este comentario: "Acho que tem outro amigalhaço ali para os lados da foz do Mondego..."

Como sabemos, nesta eleições de Março de 2024, o PSD está a ter o desafio à direita que o PS teve durante os primeiros 25 anos de democracia à sua esquerda...
Parte da explicação para a maioria absoluta que o PS teve em 2022, tem a ver com “o descontentamento com o eleitorado que «deu cabo da geringonça» e com a ameaça do Chega, que assustou o eleitorado de centro”. 
Em 2024, “o PS utilizou esse tema para estigmatizar PSD, exigindo demarcações sucessivas”
O eleitorado português é pouco ancorado politicamente e o PS conseguiu ganhar votos à esquerda e ao centro. Colocar o PSD mais à direita, foi, e é do interesse do PS, tal como já aconteceu ao contrário.
Em Março de 2024, o debate político à direita está sobretudo marcado pelo desafio de dois partidos à hegemonia do PSD. Agora a disputa está à direita, com o Chega e Iniciativa Liberal a morderam os calcacanhares à AD. 
Portanto, constatar que a situação interressava ao PS tem algum fundo de verdade.
Contudo, quem ganhou, pelos vistos, foi o Chega.

Imagem via Diário as Beiras
Mas, voltando à Figueita, recuemos a 15 de Maio de 2020 para lembrar o negócio de conveniência que foi a passagem de André Ventura pela câmara da Figueira, era presidente da autarquia Carlos Monteiro. O que terá levado André Ventura, a vir à Figueira encontrar-se com um obscuro e nada mediático autarca do Partido Socialista?
Como escrevemos na altura, "Carlos Monteiro e André Ventura têm uma coisa em comum: ambos, são populistas. 
O populismo ignorante da narrativa do Chega tem um desiderato: captar o voto de leigos, instrumentalizando questões de forte carga emocional – como o tema «ciganos», por exemplo –, enquanto o seu verdadeiro programa ia sendo semeado: ir preparando a privatização dos sectores que mais falta fazem, no dia a dia, ao cidadão português
Por sua vez, Carlos Monteiro queria manter-se como presidente de câmara, depois de lá ter chegado por sucessão."

Possivelmente, nenhum destes factos foi relevante para o eleitor inveterado e clubístico do André Ventura ou de Carlos Monteiro. Contudo, ficou o alerta para os outros: podemos não gostar do estado do país ou do concelho em que vivemos, mas acreditem, tanto o país como o concelho, podem ficar bem pior.
Em Maio de 2020, a audiência de Carlos Monteiro a André Ventura, a meu ver, do ponto de vista político, serviu a ambos. A André Ventura deu jeito e credibilidade ser recebido por um autarca do Partido Socialista. A direita do PS figueirense, deu um contributo para a divisão dos votos à direita da direita do PS... O que não era desfavorável à direita do PS local... E o que também não era muito difícil: a direita da direita do PS, na Figueira, não estava dividida, estava esfrangalhada e pulverizada...
O que, politcamente, pensava Monteiro, lhe daria um enorme jeito para as suas aspirações políticas...
Foi o que se viu em Setembro de 2021.

No tempo em que a nível oficial ninguém lhe passava cartuxo, Ventura teve mesmo "um amigalhaço" na Câmara da Figueira...
Quanto ao crescimento eleitoral de André Ventura: "muito fez pelo Chega o atraso no julgamento de José Sócrates"...

terça-feira, 5 de março de 2024

PCP, o partido do Trabant ou das formigas?

Uma crónica de Adriano Miranda, no jornal Público.

«Na terra de José Saramago, na Azinhaga, a noite era de frio. À luz dos candeeiros e sem holofotes mediáticos, na rua de casario térreo e modesto, João Oliveira e Bernardino Soares olhavam os imigrantes nos olhos. Parecia a velha praça da jorna cheia de explorados, ou os romances de luta de Manuel Tiago e Soeiro Pereira Gomes. Bernardino Soares falava em inglês e a plateia sentada em velhas cadeiras de sala ouvia atentamente. As palmas romperam efusivamente quando Bernardino disse a coisa mais simples deste mundo – “todos têm direito a uma vida melhor.” E é nesta simplicidade que o PCP conta. 
 O PCP é em quase tudo um partido diferente de todos os outros. Por isso, é quase sempre tão difícil de compreender. Cada vez mais. Numa época da “política de plástico”, os comunistas portugueses não se conseguem encaixar. São teimosos em afirmar a política pela nobreza da política. Uma arte e uma ciência ao serviço das pessoas. Cortam a direito. Não ficam em cima do muro. Ficam muitas vezes mal na fotografia. São incorruptíveis. Cumprem a palavra dada. Comunicam como se todos os portugueses tivessem lido o Capital de Karl Marx. Fica sempre a sensação de que estão fora de tempo. Não nos interrogamos – não há tempo para isso – se é este realmente o tempo que nós queremos e merecemos enquanto sociedade colectiva. Quem terá razão? Os teimosos comunistas portugueses ou os vendedores de ilusões?»

sexta-feira, 1 de março de 2024

Tudo isso era para ficar bem na fotografia, mas existe um problema: ainda existe quem tenha memória!..

Carlos Moedas acusou PS de ter tirado "dignidade" aos imigrantes.

Com que então, «dizem que Carlos Moedas é grande estadista por ter posto os pontos nos is e dizer preto no branco que a imigração faz falta, não podemos é "tolerar atentados contra a dignidade humana", e que a "imigração tem que ter regras, que garantam que quem entra no país tem contrato de trabalho e condições para viver com dignidade". E foi prontamente aplaudido, por unanimidade e aclamação, pelos compagnons de route que, desde pelo menos 2006, ano em que saíram dos buracos para os blogues, onde foi congeminada a direita ilusionista liberal, fã do 'amaricano' Tea Party e com fotos da Margaret Hilda na parede do quarto, sempre defendeu a virtude da iniciativa privada que criou os Uber, Uber Eats, Glovos desta vida, precisamente alimentados pelos imigrantes sem contrato de trabalho, sindicatos vade retro Satanás, coisa de comunistas, e sem sítio para dormir, que durmam empilhados uns nos outros que sempre se aquecem no Inverno. E nesta enxurrada orgásmica de aplausos temos alegados jornalistas, que não têm memória nenhuma do que era a direita liberal quando Passos começou a rabear com Manuela Ferreira Leite, moravam em Marte, taditos, mesmo aqueles que marcaram presença no congresso que havia de entronizar o barítono em Mafra.» 

sexta-feira, 23 de fevereiro de 2024

É um trabalho chato, mas tem de ser feito

«A mim, enquanto português, não me é indiferente saber se José Sócrates é culpado ou inocente. E quando digo saber, é mesmo isso: não me basta ter uma ideia, uma percepção, uma presunção, uma preferência. Eu quero saber qual das duas coisas é verdade: se tivemos um primeiro-ministro que, como sustenta a acusação pública, foi corrupto até à medula ou se, pelo contrário, foi e continua a ser alvo de um procedimento judicial fundado justamente em presunções e não em factos. A menos que estivesse disposto a aceitar, desde já, a conclusão tirada pelo director do “Público”, David Pontes, quando escreveu que “a presunção de inocência continua a valer, mesmo que as fracas justificações de José Sócrates há muito tenham levado a maioria dos portugueses a tirar as devidas conclusões sobre a sua conduta”. Há muito e as devidas conclusões? Desde quando e com base em quê? Acaso a “maioria dos portugueses” e o próprio David Pontes se deram ao trabalho de ler com atenção e espírito isento as 4083 páginas da acusação do Ministério Público (MP), as 6728 páginas da decisão instrutória do juiz Ivo Rosa e agora as 683 páginas do acórdão da Relação sobre o recurso do MP dessa decisão? É um trabalho muito chato, eu sei, mas acham que é possível tirar “as devidas conclusões” sem o fazer? Se sim, então para que será necessário também um julgamento? Bom, eu dei-me a esse trabalho (saltando os longos e repetidos copy paste), porque, como disse, a conclusão não me é indiferente enquanto cidadão e só será séria se informada. De tudo o que li e ouvi ao longo destes 10 anos tirei algumas conclusões que me parecem pacíficas:

— Durante três anos, de 2011 a 2014, José Sócrates (J.S.) viveu, e largamente, à conta de um amigo, Carlos Santos Silva (C.S.S.), que lhe pagou todas as despesas pessoais, incluindo aquelas de outras quatro ou cinco pessoas a quem ele, por sua vez, ajudava a sustentar;

— Mas se viver por conta, especialmente um ex-PM, não será propriamente glorioso, também não é crime. E tanto J.S. como C.S.S. admitiram que o primeiro vivia dos empréstimos do segundo, que, pelas contas deles, terão somado entre meio milhão e 1,1 milhões de euros — ou 4.733.691,30 euros, segundo a acusação;

— Porém, diz o MP, isto só foi possível porque o dinheiro, que provinha de contas de C.S.S. na Suíça, não era dele, mas sim de J.S., e adquirido devido a corrupção;

— Disto — de uma e outra coisa — não existe qualquer prova directa no processo, sustentando o MP, e agora também o Tribunal da Relação de Lisboa (TRL), que tal não é necessário, bastando a prova por deduções, suposições ou presunções, pois que, como foi escrito a certa altura, “quem cabritos vende e cabras não tem, de algum lado lhe vem”. Salvo melhor opinião, tal não me parece nem suficiente nem recomendável como prática de incriminação criminal: se eu for apanhado a comer caviar no Gambrinus, isso não significa que tenha acabado de assaltar um banco. Sócrates começou a ser investigado muito antes de ser preso; esteve detido preventivamente 10 meses; o inquérito demorou cinco anos e foram interrogadas dezenas de pessoas, feitas inúmeras buscas, centenas de apreensões, horas incontáveis de escutas telefónicas e inumeráveis outras diligências envolvendo uma quantidade imensa de procuradores e inspectores: é difícil convencer um tribunal sem pré-juízos de que, face à magnitude de meios da investigação envolvidos e à gravidade da acusação — Sócrates corrompido pelo Grupo Lena, por Vale do Lobo e pelo GES —, não haja para apresentar como prova do que se imputa um só testemunho, uma escuta, um e-mail, um documento, um papel, uma fotografia, uma transferência bancária, o relato de um encontro, uma conversa. Nada.»

Miguel Sousa Tavares

quinta-feira, 22 de fevereiro de 2024

PSP diz que tiros denunciados por Chega em Famalicão eram rateres de mota!..

"O presidente do Chega denunciou esta quarta-feira que a caravana do partido foi recebida por tiros em Vila Nova de Famalicão (Braga), mas a PSP esclareceu que os sons eram 'rateres' produzidos por um motociclo" integrado na comitiva"
!..
Pelos vistos, o Chega é uma comédia... 
Qual seráo screech que se segue?
A vitimização do Ventura já começa a ser pueril e ridículca: por tudo e por mais alguma coisa, são os ciganos,
são os imigrantes, são os jornalistas, é vitimai de ameaças e até o interrompem nos debates em que participa...

Quando é que se começa a prever aquilo que era previsívil há muito?

Falta de lampreia obriga Câmara de Penacova a cancelar festival


A Câmara de Penacova decidiu cancelar o Festival da Lampreiaevento que normalmente decorria em fevereiro, face à escassez daquele peixe. O presidente do município, disse que vai organizar um colóquio para debater o declínio da espécie em Portugal. 
O Festival da Lampreia, que normalmente decorria no final do mês, foi cancelado devido à falta de lampreia, disse aos jornais Álvaro Coimbra, referindo que o período para a lampreia vai até abril, mas não se prevê que haja uma grande alteração face ao cenário atual. 
Em 2022, o município foi obrigado a suspender o festival também face à escassez daquela espécie que se reproduz no rio Mondego, tendo depois realizado o certame em abril. “Um evento gastronómico pressupõe abundância e, neste momento, a lampreia é pouca e muito cara”, aclarou o autarca. 
Por aquele concelho ser conhecido como uma referência na confeção da lampreia, Álvaro Coimbra decidiu avançar com um colóquio para abordar o declínio da espécie no território português, num evento que terá também como intenção exigir medidas para que o atual cenário seja revertido. Organizado pela Câmara de Penacova e pela Confraria da Lampreia de Penacova, em colaboração com o Centro de Ciências do Mar e do Ambiente, o colóquio irá decorrer no sábado, no auditório municipal. “Tendo em conta que somos conhecidos como a capital da lampreia, tínhamos de fazer alguma coisa e convidar a comunidade científica para debater esta questão”, referiu Álvaro Coimbra. Segundo o presidente da Câmara de Penacova, serão também convidadas “uma série de entidades públicas ligadas ao setor”, a quem serão apresentadas propostas de medidas para assegurar a preservação da espécie nos rios portugueses. 
Álvaro Coimbra admitiu a possibilidade de se proibir a pesca da lampreia, salientando que, para o município, “em primeiro lugar, está a preservação da espécie”O director do Centro de Ciências do Mar e do Ambiente (Mare) defende a proibição da pesca da lampreia, para garantir a recuperação de uma espécie que escasseia cada vez mais nos rios portugueses.