Paulo José Miranda foi o primeiro prémio Saramago. Depois desapareceu. Ao contrário dos tordos, dos peixotos, dos hugos-mães e de outros “accionistas da própria propaganda” - ícones de uma certa literatura de massas, “laite”, ou de supermercado- Paulo nunca teve promoção com turnê organizada, nem convite para escrever em jornais e revistas de referência (ele acha que sabe porquê – “tem a ver com a compreensão, muito correcta, do que é a minha escrita”). Foi-se embora. Mas, ao contrário de Camões, não voltou nem vive da tença. Está agora no Brasil, onde foi descoberto por João Paulo Cotrim, da editora Abysmo, que lhe está a editar a obra.
Graças ao Fernando Campos, a quem agradeço desde já, descobri este escritor no supermercado...
Fiquei a saber que de dois em dois anos, no outono, quando Pilar del Río anuncia o Prémio Saramago, há sempre alguém que pergunta «o que é feito de Paulo José Miranda?», e há sempre alguém que responde: «Foi para a Turquia, gastou todo o dinheiro em vinhos caros e ficou por lá.»
Como não há mais pormenores, a conversa morre aqui e a lenda compõe-se com os detalhes que a imaginação de cada um permite.
Porém, a realidade é outra, e se Paulo José Miranda está mais perto do que se supunha, a sua história é mais fascinante do que qualquer ficção que sobre ele se tenha inventado.
António Agostinho, o autor deste blogue, em Abril de 1974 tinha 20 anos. Em Portugal havia guerra nas colónias, fome, bairros de lata, analfabetismo, pessoas descalças nas ruas, censura prévia na imprensa, nos livros, no teatro, no cinema, na música, presos políticos, tribunais plenários, direito de voto limitado. Havia medo. O ambiente na Cova e a Gala era bisonho, cinzento, deprimido e triste. Quase todas as mulheres vestiam de preto. O preto era a cor das suas vidas. Ilustração: Pedro Cruz
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