Exmo. Senhor:
Antes de tudo, os meus mais respeitosos cumprimentos a V. Exª.
1. Agora, que já está eleito o seu elevador, inscreva-se urgentemente no PS. Vá aparecendo na sede do partido, ma não fale muito nesta fase.
2. Depois de estar inscrito, não demonstre a sua opinião pessoal nas reuniões do partido. A melhor receita para ir longe é deixar que os outros se queimem com as suas opiniões...Vá andando e vendo. Aprenda com o seu vice-presidente...
3. Quando se iniciar a próxima campanha eleitoral, dado que a sua âncora é o candidato, continue a colar-se a ele que nem uma lapa.
4. Entretanto, o que não é difícil, vá continuando a aparecer, cá pela Figueira e no distrito, várias vezes na comunicação social.
Sobretudo, não esqueça as fotografias.
O seu status social irá aumentar. Não esqueça: quem não é visto, é esquecido!
5. Se assim fizer não se preocupe: agora que está eleito o seu candidato, V. Exa. será recompensado, pois ele gosta de cuidar dos que cuidam dele.
6. Assim que tenha poder dentro do partido tenha cuidado: fale, mas não saia do politicamente correcto dentro da organização.
7. Não esqueça de candidatar-se a um órgão partidário de fantochada.
Os partidos – todos os partidos - têm dezenas de órgãos de fantochada.
8. Agora, é fundamental que o novo chefe do partido e os que o rodeiam achem que V. Exa. é uma mais valia.
Se assim conseguir que aconteça, tem o caminho aberto para subir na hierarquia partidária.
9. Cada caso é um caso, mas não esqueça que o seu é caso especial.
Não precisa, portanto, de calcorrerar o percurso habitual: primeiro assessor, depois deputado – e por aí adiante até chegar a Ministro.
Se seguir este meu desinteressado conselho, V. Exa. será certamente recompensado pelo trabalho em prol do partido.
O seu ego poderá naturalmente subir e ser avistado lá por Lisboa.
Desde já, parabéns.
De V. Exa.
Muito atentamente
António Agostinho
António Agostinho, o autor deste blogue, em Abril de 1974 tinha 20 anos. Em Portugal havia guerra nas colónias, fome, bairros de lata, analfabetismo, pessoas descalças nas ruas, censura prévia na imprensa, nos livros, no teatro, no cinema, na música, presos políticos, tribunais plenários, direito de voto limitado. Havia medo. O ambiente na Cova e a Gala era bisonho, cinzento, deprimido e triste. Quase todas as mulheres vestiam de preto. O preto era a cor das suas vidas. Ilustração: Pedro Cruz
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